É
impressionante como pessoas inteligentes preferem disseminar fatos distorcidos,
ao invés do verdadeiro, como nesse caso da decisão do Supremo Tribunal Federal,
com afirmação absurda e sem fundamento de que foram tirados os poderes do presidente
da República para combater a pandemia do coronavírus, transferindo-os para os
governadores e prefeitos.
Esse
fato deplorável caracteriza umas das maiores vergonhas desse governo, que foi extremamente
omisso sob essa falsa premissa, uma vez que ela somente se sustenta na mente do
presidente do país e de seus apoiadores, que jamais se atreveriam em fazer acusações
injustos e descabidas, caso tivessem interesse em conhecer a decisão em questão,
porque não há nela qualquer proibição nesse sentido, conforme se pode ver no
texto abaixo.
É
lamentável que isso venha acontecendo, em razão de envolver diretamente o
interesse da população, quando, por falta da devida interpretação da decisão do
Supremo, o governo deixou se agir efetivamente, como ele mesmo confirmou, praticamente
dizendo que, em face desse decisum, o presidente lavou as mãos e se afastou
da incumbência do combate à pandemia, que competia aos governos federal,
estadual e municipal, em ação conjunta, exatamente na forma do entendimento do
Supremo.
Certamente
que, se tivesse havido boa vontade, tanto da parte do presidente do país como
de seus apoiadores, as causas da população, no que diz ao combate à pandemia, teriam
sido mais bem cuidadas e, por certo, muitas mortes teriam sido evitadas.
Diante
de tanto o presidente do país alegar que teria sido impedido de agir, por força
dessa decisão, o Supremo chegou a divulgar nota, para informar e esclarecer que
a Corte nunca proibiu o governo federal de estabelecer medidas de combate ao
coronavírus.
O
Supremo esclareceu, na ocasião, que "não é verdadeira a afirmação que
circula em redes sociais", tendo afirmado que o Supremo não proibiu
atuação federal nos estados contra pandemia, como diz o presidente do país.
O
Supremo afirmou, em nota, que, "Na verdade, o Plenário decidiu, no
início da pandemia, em 2020, que União, estados, Distrito Federal e municípios
têm competência concorrente na área da saúde pública para realizar ações de
mitigação dos impactos do novo coronavírus. Esse entendimento foi reafirmado
pelos ministros do STF em diversas ocasiões. Ou seja, conforme as decisões, é
responsabilidade de todos os entes da federação adotarem medidas em benefício
da população brasileira no que se refere à pandemia".
Para
quem se interessar em conhecer a verdade e julgar os fatos com a devida
justiça, parece conveniente ler e interpretar o conteúdo da questionada decisão
do Supremo, conforme texto a seguir.
“DETERMINAR
a efetiva observância dos artigos 23, II e IX; 24, XII; 30, II e 198, todos da
Constituição Federal na aplicação da Lei 13.979/20 e dispositivos conexos,
RECONHENDO E ASSEGURANDO O EXERCÍCIO DA COMPETÊNCIA CONCORRENTE DOS GOVERNOS
ESTADUAIS E DISTRITAL E SUPLEMENTAR DOS GOVERNOS MUNICIPAIS, cada qual no
exercício de suas atribuições e no âmbito de seus respectivos territórios, para
a adoção ou manutenção de medidas restritivas legalmente permitidas durante a
pandemia, tais como, a imposição de distanciamento/isolamento social,
quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de comércio,
atividades culturais e à circulação de pessoas, entre outras; INDEPENDENTEMENTE
DE SUPERVENIENCIA DE ATO FEDERAL EM SENTIDO CONTRÁRIO, sem prejuízo da
COMPETÊNCIA GERAL DA UNIÃO para estabelecer medidas restritivas em todo o
território nacional, caso entenda necessário. Obviamente, a validade formal e
material de cada ato normativo específico estadual, distrital ou municipal
poderá ser analisada individualmente. Intimem-se e publique-se. Brasília, 8 de
abril de 2020.”.
Já
li e reli o aludido texto, mas não consegui enxergar algo proibitivo ao
presidente do país para deixar de cumprir a sua incumbência constitucional de
adotar as necessárias medidas de combate à Covid-19.
Salvo
melhor juízo, a referida decisão fala em competência “concorrente” dos governadores
e “suplementar” dos prefeitos, sem falar em restrição à competência privativa
do presidente da República.
A
competência estendida àquelas autoridades estariam relacionadas com “a adoção
ou manutenção de medidas restritivas legalmente permitidas durante a pandemia,
tais como, a imposição de distanciamento/isolamento social, quarentena,
suspensão de atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais
e à circulação de pessoas, entre outras; (...) INDEPENDENTEMENTE DE
SUPERVENIENCIA DE ATO FEDERAL EM SENTIDO CONTRÁRIO, sem prejuízo da COMPETÊNCIA
GERAL DA UNIÃO para estabelecer medidas restritivas em todo o território
nacional, caso entenda necessário. (...)”.
Em
síntese, o Supremo decidiu que a responsabilidade de combate à Covid-19 é dos três
níveis da federação e isso não quer estabelecer hierarquia, porque, em se tratando
de crise da saúde pública, o que menos importa é a hierarquia, quando é preciso,
nesse caso, que seja possível o estabelecimento de condições necessárias de
combate ao coronavírus, de acordo com as orientações e prescrições dos
sanitaristas, dos cientistas e dos médicos, cabendo às autoridades
governamentais, em conjunto, adotarem as medidas pertinentes, mas o governo
federal preferiu alegar motivo inexistente.
Não
obstante, a verdade é que, mesmo com a má interpretação sobre a falsa proibição,
o governo federal não deixou de se esforçar quanto ao repasse dos auxílios
financeiros às causas de combate à pandemia do coronavírus, embora se tivesse
havido combate em conjunto dos entes da federação, certamente que o resultado das
medidas adotadas teria sido muito mais proveitoso para os brasileiros.
Na
verdade, inexiste a menor razão para o presidente do país se eximir da sua importante
responsabilidade, mas foi assim que ele entendeu, inclusive não tendo o menor
escrúpulo para assim declarar que poderia fazer algo contra a Covid-19, se não
tivesse sido proibido, o que não é verdade.
A
compreensão que deflui da decisão do Supremo é a de que a atuação dos governos federal,
estadual e municipal deveria ter sido no sentido de convergência no mesmo
sentido e na mesa direção, observado o modelo de cooperativa, com vistas à efetivação
de políticas públicas de promoção da melhor saúde pública possível, evidentemente
em respeito aos limites de atuação.
De
qualquer modo, a participação do governo federal era mais do que necessária,
uma vez que a saúde pública é um direito fundamental da população brasileira, que
constitui dever imprescindível do qual nenhuma autoridade do país poderia ter desistido
de ter participado, em momento tão grave da vida humana.
O
que se percebe é que o Supremo determinou que as medidas diretas de combate à Covid-19
fossem também de responsabilidade de estados e municípios, mesmo porque os
doentes ficam nesses entes da federação e os governadores e prefeitos são as
autoridades diretamente ligadas com o fluxo dos doentes, tendo melhor condição de
avaliar a conveniência de medidas de isolamento e outras pertinentes e necessárias.
Vejam
a que ponto chegou o presidente do país, em afirmar, verbis: "Se
o Supremo não tivesse me proibido, eu teria um plano diferente do que foi
feito, e o Brasil estaria em situação completamente diferente", fato
esse que não tem amparo legal.
A
decidida omissão do presidente do país é da maior gravidade, chegando a ser monstruosa,
por ele declarar que tinha “plano diferente do que foi feito”, certamente
capaz de salvar vidas, mas a sua insensibilidade foi superior à importância da
vida humana, porque, quando há medida de salvamento de vida, ele precisa ser
implementado mesmo que houvesse proibição, apenas no plano legal.
É
pena que o presidente do país tenha sido tão desumano de confessar tamanha
maldade, em clara demonstração de tentativa de incriminar o Supremo, jogando o
povo contra ele, nesse caso, quando não nunca existiu proibição alguma, o que
contribui para aumentar a culpa dele de ter declarado que tinha mais e melhores
condições de combater a Covid-19 com mais recursos, mas não o fez por pura má
vontade.
Sim,
má vontade, porque se ele tivesse a verdadeira compreensão sobre a importância
da vida humana, teria colocado em ação seu “plano diferente”, mesmo com proibição
e tudo em contrário, assumindo as consequências legais, ou, ainda, na outra
alternativa também importante, ele poderia ter impetrado recurso, mas não o
fez, contra a decisão que foi interpretada por ele como proibitiva.
Nesse
recurso, o presidente do país deveria ter alegado que a competência de cuidar
da saúde pública é da competência privativa da União e ele, como o mandatário,
precisaria cumprir a missão constitucional de cuidar dos brasileiros, sob pena de
se tornar omisso, como realmente foi, por não ter feito nenhuma coisa nem outra,
infelizmente, conforme mostram os fatos.
A
afirmação presidencial foi clara tentativa de imputar ao Supremo Tribunal
Federal a omissão da qual seu governo foi recorrentemente acusado no combate à
doença, fato este que ainda agora vem sendo disseminado por ele e seus
seguidores, que preferem corroborar com tremendo equívoco de interpretação, que
somente é desmentido à luz da própria decisão, que tem conteúdo cristalino, de
modo a não restar dúvida alguma sobre quem prefere omitir a verdade, nesse caso.
Enfim,
convém que os brasileiros possam julgar os fatos exatamente como eles aconteceram
ou são, apenas levando em conta o que existe de real sobre eles, independentemente
de ideologia partidária ou interpretação equivocada, uma vez que a sua versão mentirosa
pode ter pernas curtas e ser perfeitamente alcançada pela luz da verdade.
Brasília, em 7 de abril de 2022
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