sexta-feira, 22 de abril de 2022

O indulto

 

O presidente da República concedeu indulto ao deputado que foi condenado, anteontem, pelo Supremo Tribunal Federal, que é considerada medida inédita, uma vez que isso normalmente acontece por questão humanitária.

É evidente que esse ato por ter intrincadas implicação e repercussão jurídicas, mas a impressão que fica é que há questão política muito forte no caso do parlamentar, que teria defendido, outras medidas, o fechamento do Supremo, que tem a conotação de sentimento antidemocrático, por constituir afronta aos poderes da República, de sede constitucional.

Não há a menor dúvida de que o presidente do país foi além do limite em relação ao acatamento à respeitável decisão do excelso Judiciário brasileiro.

É possível que essa medida pretenda estabelecer o balizamento no comportamento do bolsonarismo nas eleições de 2022, no sentido de que o presidente deseja mandar claro recado ao Supremo, para dizer que não vai mais aceitar limites para expor a sua autoridade de mandatário do Brasil, na forma como ele tentou por várias vezes, mas somente agora ele conseguiu, não se sabe ainda se certo ou não.

Induvidosamente, o parlamentar fez ameaças concretas e fortes a ministros e ao próprio Suprema, caso em que não se trata de mera questão de liberdade de expressão, eis que ele, como deputado federal eleito para defender a Constituição, ameaçou a democracia, pediu a volta do AI-5 e defendeu o fechamento da corte, entre estrondosas agressões desrespeitosas aos ministros, chegando a diminuí-los ao menor nível de insignificância, em termos de nenhuma autoridade do Judiciário.

Na verdade, se trata de algo bastante complexo, com real implicação da maior gravidade, pela forma muito agressiva, que vai muito além de mera manifestação crítica, sem a menor repercussão, que pudesse ser aceita para suscitar debate de opinião ou até mesmo colocá-la como modelo de liberdade de expressão.

Os insultos do parlamentar não estão dentro dessa lógica de debater questões do país, porque eles ultrapassaram todos os limites do bom senso, da racionalidade e da civilidade, indo muito além da liberdade de expressão como muitos querem assim entender, como pensa assim até mesmo o próprio presidente do país.

À toda evidência, a condenação do deputado parece que foi forma de reação do Supremo relacionada com as fake news, as ameaças à democracia e a ameaça dos bolsonaristas de não aceitarem os resultados das urnas nas eleições.

Tão logo aconteceu o anúncio do presidente do país, acerca da concessão do perdão da pena ao deputado, vários parlamentares de começaram a se manifestar em redes sociais, alguns apoiando o aludido ato e outros descendo o malho no mandatário, criticando a medida absolutamente inadmissível, segundo alguns entendidos de política.

Em síntese, o deputado foi condenado com a pena de oito anos e nove meses de prisão, em regime fechado, além da perda do mandato parlamentar e dos direitos políticos, sendo obrigado a pagar a multa de cerca de R$ 200 mil, sob a acusação de ter estímulo a prática de atos antidemocráticos e ataques a ministros do Supremo e instituições.

Na verdade, o presidente da República quis respaldar as agressões protagonizadas por deputado completamente fora de si, que disse, em forma de menosprezo à autoridade de ministros do Supremo, que até podem merecer todos os nefastos adjetivos proclamados por ele, mas a sua autoridade de parlamentar não lhe confere competência para se chegar ao ápice das agressões formuladas por ele, que condizem em nada com o direito consagrado da liberdade de expressão.

          À vista dos excertos a seguir, se pode vislumbrar que o artigo 53 da Constituição jamais respaldaria as duras palavras do deputado como sendo liberdade de expressão, como assim foi fundamentado o decreto presidencial, pelo menos na visão das pessoas sensatas e civilizadas, que entendem que expressões com essa conotação têm o sentimento de respeito, educação e apreço aos direitos humanos, que é algo que ficou muito à margem dos vocábulos usados pelo deputado, o que vale dizer que o presidente não foi muito feliz em defender o direito de o parlamentar puder ser extremamente incivilizado em nome de princípio que tem o verdadeiro sentido de tolerância, compreensão e respeito.

          Com a finalidade de mostrar a verdadeira índole do deputado protegido do presidente da República, que se torna cúmplice com os sentimentos nefastos e mesquinhos dele, uma vez que o perdão induz exatamente à essa conclusão, convém que se registre algumas palavras ofensivas do parlamentar aos ministros do Supremo e à própria corte, conforme a seguir.  

“... Fachin, seu moleque, seu menino mimado, mau caráter, marginal da lei, esse menininho aí, militante da esquerda, lecionava em uma faculdade, sempre militando pelo PT, pelos partidos narcotraficantes, nações narcoditadoras. Mas foi aí levado ao cargo de ministro porque um presidente socialista resolveu colocá-lo na Suprema Corte pra que ele proteja o arcabouço do crime do Brasil, que é a Suprema Corte, a nossa Suprema que de suprema nada tem.

Fachin, sabe… às vezes fico olhando as tuas babaquices. As tuas bobeiras que você vai à mídia para chorar,... Está previsto lá no artigo 101 da Constituição os requisitos pra que vocês se tornem ministros, totalmente esvaziados, totalmente inócuos. Totalmente oligofrénicos, ignóbeis. É o que vocês são. Principalmente você, Fachin. Você integra, tipo assim, a nata da b.... do STF, certo?

...Agora, que você tem que tomar vergonha na sua cara, olhar, quando você for tomar banho, olhar o b............ que você tem e falar: ‘Pô, eu acho que sou um homenzinho. Eu vou parar com as minhas bobeirinhas’. Ah, o quê? Eu estou sendo duro demais? Tô sendo o quê, ogro? ...

...Militante idiotizado, lobotomizado, que atacava militares junto com a Dilma, aquela ladra, vagabunda. Com o multicriminoso Luiz Inácio Lula da Silva, de 9 dedos, vagabundo, cretino, canalha. O que acontece, Fachin, é que todo mundo já está cansado dessa sua cara de filho da p... que tu tem. Essa cara de vagabundo, né... Por várias e várias vezes já te imaginei tomando uma surra. Ô… quantas vezes eu imaginei você e todos os integrantes dessa Corte. Quantas vezes eu imaginei você, na rua, levando uma surra. O que você vai falar? Que eu tô fomentando a violência? Não. Eu só imaginei. Ainda que eu premeditasse, ainda sim não seria crime...

Então, qualquer cidadão que conjecturar uma surra bem dada nessa sua cara com um gato morto até ele miar, de preferência, após cada refeição, não é crime... Dessa b.... de gangue que tu integra. Não. Aqui você não vai encontrar nada... Será que você permitiria a Polícia Federal investigar você e outros 10 aí da supreminha? Você não ia permitir. Vocês não têm caráter, nem escrúpulo, nem moral para poder estar na Suprema Corte. Eu concordo, né, completamente com Abraham Weintraub quando ele falou: ‘Eu, por mim, colocava esses vagabundos todos na cadeia’, aponta para trás, ‘começando pelo STF’. Ele estava certo.

... Você e os seus 10 amiguinhos aí, amiguinhos, não guardam a Constituição. Vocês defecam sobre a mesma Constituição, que é uma porcaria. Ela foi feita para colocar canalhas sempre na hegemonia do poder. E, claro, pessoas da sua estirpe evidentemente devem ser perpetuadas pra que protejam o arcabouço dos crimes do Brasil. E se encontram aí, na Suprema Corte.

... E eu tô literalmente c........ e andando para o que vocês pensam, né. É claro que vocês vão me perseguir o resto da minha vida política. Mas eu também vou perseguir vocês. Eu não tenho medo de vagabundo, não tenho medo de traficante, não tenho medo de assassino… vou ter medo de 11? Que não servem pra p.... nenhuma nesse país? ...

... Mas f...-se, né? F...-se, né, porque vocês merecem ouvir...

... Fachin, covarde. E Gilmar Mendes… é isso que tu gosta, né, Gilmarzão?...

... Suprema Corte é o cacete. Na minha opinião, vocês já deveriam ter sido destituídos do posto de vocês e uma nova nomeação convocada e feita de 11 novos ministros. Vocês nunca mereceram estar aí. E vários que já passaram também não mereciam. Vocês são intragáveis, tá certo? Inaceitável. Intolerável, Fachin? Num é nenhum tipo de pressão sobre o Judiciário não. Porque o Judiciário tem feito uma sucessão de m.... no Brasil. Uma sucessão de m.... E quando chega em cima, na Suprema Corte, vocês terminam de c....... a p... toda. É isso que vocês fazem. Vocês endossam a m.....

Então, como já dizia lá Ruy Barbosa, a pior ditadura é a do Judiciário, pois contra ela não há a quem recorrer. E, infelizmente, infelizmente, é verdade. Vide MP [Ministério Público]. Uma sucessão de m.... Um bando de militante totalmente lobotomizado fazendo um monte de m..... eu estou falando com base na liberdade de expressão que o cretino do Alexandre de Moraes, lá atrás, quando ele foi passar pela sabatina do Senado, falou mais de 17 vezes em menos de 1 minuto de vídeo, ‘liberdade de expressão, liberdade de expressão’ o tempo todo, tá, que está no artigo 5º, que é cláusula pétrea... Eu acho que vocês não mereciam estar aí.

... Tudo que eu quero. Um ministro cassado. Para os outros 10 idiotas pensarem ‘pô, não sou mais intocável. É melhor eu fazer o que eu tenho que fazer’. Julgar aquilo que é constitucional, de competência da Corte.

Fachin, intolerável, inaceitável, é termos você no STF. No mais, Brasil acima de tudo, Deus acima de todos. Força e honra”.

É inacreditável como o presidente da República possa entender e considerar esses termos rasteiros e desrespeitosos como sendo enquadrável no lindo e vicejador do mundo permitido da liberdade de expressão, quando o deputado se expressou, ao se referir aos ministros do Supremo e à própria corte, como o mais vil dos homens, mostrando do seu sentimento de inutilidade humana, sem o merecimento da menor consideração ao ser humano, mesmo que os destinatários de seus impropérios sejam reles, segundo o seu entendimento, mas a sua autoridade de representante do povo não se harmoniza com comportamento animalesco e selvagem demonstrado por ele, à vista da evolução do Homo Sapiens.  

Diante da medida presidencial, juristas, advogados, professores e especialistas em direito afirmaram que a medida presidencial é passível de questionamento a ser analisado pelo Supremo, uma vez que ela favorece o deputado aliado, fato este que não qualquer liame com o interesse público.

          A maioria desses especialistas em direito sinaliza para a "inconstitucionalidade" ou "ilegalidade" do ato presidencial, ante os motivos por eles indicados, conforme a seguir.  

Um professor de Direito Penal da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro disse que o decreto "aparentemente" cumpre a exigência constitucional, ou seja, ele não tem certeza de que o presidente agiu certo.

E disse ainda que "Não vou dizer que é inédito, mas é algo muito raro no Brasil. Ele equivale ao instituto da clemência, que existem em alguns outros países, sendo atribuição ao chefe de estado, e esse questionamento pode haver perante o Supremo Tribunal Federal principalmente em relação ao eventual desvio de função”.

Um professor de direito constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo disse que a chamada "graça individual" costuma ser concedida para fins humanitários, em uma situação específica que justifique, "Não havendo fundamentação adequada, ele pode sim ser questionado. Então, eu acho que esse induto individual, na medida em que se pretende a inovação de uma decisão do Supremo Tribunal Federal, ele pode sim ser entendido como um ato administrativo executado com desvio de finalidade e, com isso, eventualmente, se expor eventualmente no próprio Supremo Tribunal Federal".

Segundo um advogado criminalista e doutor em direito penal pela Universidade de São Paulo, a medida tomada pelo presidente da República é "flagrantemente inconstitucional. Trata-se de grave afronta ao Supremo Tribunal Federal, que, com absoluto acerto técnico, condenou Daniel Silveira pela prática de crimes graves. Ainda que o presidente da República tenha a prerrogativa de conceder graça, não pode fazê-lo de forma abusiva, deturpando a lógica que justificou a criação desse instituto. E, no caso concreto, o que se nota é Jair Bolsonaro, mais uma vez, atacando as instituições, atacando a democracia e tomando uma decisão manifestamente incompatível com o Estado de Direito".

Além disso, segundo ele, não houve o chamado trânsito em julgado, que é etapa do processo em que não há mais possibilidade de recurso e a sentença se torna definitiva, que é condição para a concessão da graça.

Em conclusão, ele disse que "Essa é, na minha visão, uma ilegalidade do decreto. A graça só pode ser concedida para pessoas condenadas em processos com trânsito em julgado. No caso específico, o acórdão sequer foi publicado e ainda cabe recurso por parte da defesa. Por isso, entendo que, também em razão dessa questão formal, a graça não poderia ter sido concedida e, por isso, o decreto é ilegal".

Outro professor de direito processual penal da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo classificou o decreto como "uma verdadeira excrescência no direito brasileiro", porque "A concessão desse indulto individual pelo presidente da República me parece ter incorrido em evidente vício de origem e desvio de finalidade. No caso específico, autoria, materialidade e culpabilidade foram amplamente debatidos no STF, com estrita observância do devido processo legal (justo processo). A pena foi fixada dentro de parâmetros adequados e razoáveis. A concessão da graça (ou indulto individual), nesse contexto, traduz uma verdadeira afronta à própria independência e autonomia do Poder Judiciário".

Além disso, ele disse que a motivação do decreto de graça vincula sua concessão, tendo ressaltado "Como a fundamentação está viciada na origem, já que não se evidenciou no caso concreto — segundo me parece — violação ao direito de crítica ou opinião ou a alegada comoção social, penso que esse decreto é nulo e ineficaz para os fins a que se destina, ou seja, a extinção da execução da pena imposta".

Um professor de direito constitucional da Universidade Federal Fluminense afirmou que o comportamento de Bolsonaro ao editar o decreto é "estritamente político. Não é um comportamento jurídico. Isso pode render problemas porque, como ato do presidente, se corporifica através de um decreto. Muito provavelmente, esse decreto vai ser levado à apreciação plenária do Supremo Tribunal Federal no crivo do controle de constitucionalidade, e o presidente vai ter mais um argumento para dizer que o Supremo Tribunal Federal 'está me desautorizando em todos os meus atos' — o que não será verdade, mas será uma ferramenta importante na sua retórica política no ano de eleição, em que o chefe de estado pretende ser reeleito presidente da República".

Um advogado e professor da Universidade Federal Fluminense afirmou que certamente o decreto será submetido à apreciação do Supremo Tribunal Federal, porque "Não se trata de um indulto coletivo. Trata-se de um indulto individual, também chamado de graça, mas não vejo razão para que o Supremo Tribunal Federal se distancie desse parâmetro estabelecido na sua jurisprudência".

Segundo ele, o deputado tem demonstrado atuação de maneira reiterada contra a democracia e a autonomia das instituições e "Isso é fortemente reprovado pela Constituição Federal de 1988, que é a constituição da democracia. Portanto, eu entendo que neste caso é bem possível que o Supremo Tribunal Federal reveja o decreto de indulto e considere incompatível com a Constituição Federal, como uma forma de atuar no sentido da preservação da democracia brasileira, dissuadindo outros parlamentares, outros políticos, de atacarem as nossas instituições".

Um advogado e professor de direito constitucional do Instituto de Direito Público vislumbra "constitucionalismo abusivo" na decisão do presidente do país, porque "O que se quer expressar com essa ideia? É que os mecanismos, os instrumentos da Constituição eles podem acabar sendo utilizados ou mobilizados para finalidades que são inconstitucionais ou antidemocráticas".

Ele entende que o decreto usado para beneficiar o deputado pode ser usado para "neutralizar os mecanismos de autodefesa da democracia. Essa graça é contrária à Constituição porque neutraliza ou impede que o Poder Judiciário se defenda e, com isso, defenda a própria existência da democracia, que depende de um Poder Judiciário independente para existir.”.

Um professor de direito da execução penal e processo penal da PUC/RJ declarou que o Supremo já tem entendimento consolidado de que é possível controlar a legalidade do decreto que concede indulto coletivo ou indulto individual, como a graça, ou seja, “O indulto, seja o indulto coletivo, seja o indulto individual, é um ato político, previsto na lei, e que está, em princípio, sujeito à discricionariedade do presidente da República. Ele tem liberdade para conceder. Só que, como todo ato administrativo, tem que submeter a determinados requisitos — impessoalidade, moralidade, conveniência, oportunidade. São esses requisitos que podem estar sendo feridos por esse decreto, principalmente, quando a gente analisa os 'considerandos' do decreto".

Um doutor em direito penal pela Universidade de São Paulo e advogado especialista em direito eleitoral afirmou que o presidente da República agiu ilegalmente ao conceder a "graça" ao deputado, tendo afirmado que "Ainda que o mérito da concessão de indulto ou graça não seja passível de controle judicial, sua motivação, como a de qualquer ato administrativo, vincula sua validade. E Bolsonaro não sustentou a graça na liberalidade presidencial de beneficiar um aliado, mas afirmou que a interpretação dada à Constituição pelo STF está errada. Disse, expressamente, que, em sua visão, a imunidade parlamentar abrange os fatos dos quais Daniel Silveira foi acusado. E a motivação torna ilegal o decreto, pois a Presidência da República não é instância revisora da interpretação constitucional do STF que, como se sabe, dá a última palavra".

Por último, uma advogada constitucionalista, com mestrado em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas, de São Paulo, declarou que o decreto presidencial está previsto no artigo 84 da Constituição Federal, inciso XII, e dá "competência privativa" ao presidente para conceder o indulto.

Ela concluiu no sentido de que a questão envolve "forte polarização político-ideológica entre a direita e a esquerda" porque o presidente do país considera que é alvo de perseguição política do Supremo e que o julgamento teria sido parcial, "mas, realmente, essa questão do desvio de finalidade é difícil de responder, pois nós teríamos realmente que ter uma comprovação disso tudo. É, claro, que, em uma primeira análise, diante do que eu acabei de colocar, é sim, possível que a intenção tenha sido essa”.

Como se pode intuir, o presidente da República pode ter se metido de mares bravios, uma vez que ele realmente tem competência para conceder perdão, ex-vi do disposto no art. 84, inciso XII, da Constituição, em termos de indulto de penas, mas há requisitos que precisam ser respeitados, conforme assim entendem alguns especialistas na área penal.

Fica muito claro que a graça é ato nobre do presidente do país, que precisa se harmonizar perfeitamente, em forma de inquestionável balizamento, com os salutares princípios constitucionais da impessoalidade, da moralidade, da conveniência e da oportunidade, que, possivelmente eles não tenham sido observados precisamente no ato presidencial.

Há de se notar, nesse caso, que o beneficiado é pessoa ligada em amizade com o autor do decreto, dando a entender que a impessoalidade não foi observada, enquanto a moralidade passou muito longe de ser atendida, porque o deputado foi punido por esculhambar e agredir com palavras fortes e contundentes, como visto acima, o Supremo e seus ministros, a conveniência passou bastante longe do exigido, porque não se trata de assunto de interesse da sociedade, quando o fato envolve um deputado e o Supremo, sem nenhuma conotação pública, e a oportunidade diz com a necessidade da medida, que poderia ser tomada, se fosse o caso, segundo os analistas, somente depois do trânsito em julgado da decisão judicial, que sequer foi publicada e ainda cabe o devido recurso ao Supremo.  

Ou seja, a medida presidencial pode ser considerada nula, precisamente por ferir, em especial, o princípio constitucional da impessoalidade, em que o beneficiado é amigo do presidente e este, na qualidade de magistrado, não tem competência para agir em defesa do deputado e muito menos se julgar como sendo revisor final da decisão soberana do Supremo, que até pode conter vícios, mas ela precisa ser respeitada, em atenção à independência dos poderes da República.  

          Na verdade, como o presidente saiu em defesa de seu amigo, o seu ato representa o fechamento do Supremo do Supremo, por tornar nula a decisão pertinente, de modo a mandar recado direto que ele gostaria de ter feito logo depois das violentas agressões de 7 de setembro de 2021, mas ele foi tolhido preventivamente, antes de ele promover o anarquismo constitucional, com medidas golpistas para atingir aquela corte, quando assim ficou muito claro nos seus discursos às multidões enlouquecidas, demonstrando total apoio às possíveis loucuras como essa que agora acaba de se concretizar, à vista da visível precipitação.

É preciso se notar que o presidente se baseou em justificativa falsa para a concessão do perdão, ao empregar argumentos jurídicos como defesa da liberdade de expressão, além de noções subjetivas de que a sociedade se encontra em legítima comoção, o que também não é verdade, quando, na realidade, o objetivo da medida é visivelmente político.

Não é verdade que a medida do perdão, nesse caso, seja a de materializar a preservação do senso de justiça aos direitos humanos, mas sim de deixar muito claro para satisfazer o desejo de apoiadores do presidente do país, com a colocação da questão de exclusivo interesse do deputado no campo eminentemente político-eleitoral, tendo como o pior cenário a controvérsia que acaba de ganhar cristalina disputa entre os poderes Executivo e Judiciário.

Ou seja, o indulto em questão contraria o entendimento de dez ministros do Supremo e empurra, de vez, o poder Judiciário ao terreno do bolsonarismo cego e apaixonado, que tanto esperou por medida corajosa como essa, embora as suas consequências ainda sejam imprevisíveis, a depender dos ânimos dos ministros do Supremo.

          O presidente do país coloca a política na mira da Justiça, exatamente no ano eleitoral, em que qualquer passo em falso pode ser desastroso para ele, conquanto o desgaste para os ministros do Supremo poderá ser incontornável e bastante prejudicial às relações entre os dois poderes envolvidos.

          O certo é que o Supremo saberá minimizar o insensato ímpeto presidencial, dando a devida resposta ao decreto em apreço, mas certamente não terá condições de evitar a enorme tensão institucional implodida pelo presidente do país, cujo ato poderá respingar na política e na economia, diante da dificuldade de se justificar a adoção de medida tão polêmica, quando o réu de beneficia por meio de ato extraordinário, depois de ter sido condenado por incitação à prática de atos antidemocráticos e fortes ataques aos ministros da Excelsa Corte de Justiça.

É importante que se ressalte que o disposto no artigo 53 da Constituição, que estabelece que o parlamentar é livre para falar quaisquer palavras no mandato, diz com os atos inerentes às atividades parlamentares, em defesa das medidas que estejam circunscritas ao exercício do mandato parlamentar.

Ou seja, esse privilégio não pode exceder aos limites previstos na Carta Magna, em relação especificamente ao exercício do mandato, a exemplo de esculhambar e agredir a honra dos ministros do Supremo e da própria corte, como assim fez o deputado condenado, mesmo que eles não tenham nenhuma dignidade, no entendimento dele, uma vez que há norma que prescreve isso como crime.

A liberdade de expressão é direito consagrado para a construção de opiniões salutares, voltadas para o engrandecimento do ser humano e jamais para opiniões agressivas, jocosas nem para manifestações criminosas, como assim a lei penal define, como no caso de discurso de ódio, em claro atentado contra o estado de direito e da democracia.

Quando a pessoa age com dolo, tendo por propósito e consciência se atingir objetivos claros, como o de denegrir a reputação do poder Judiciário, em especial, e isso o parlamentar não deixou a menor dúvida, conquanto, mesmo que o Supremo não represente nada, na opinião dele, falece competência legal a ele para assim se manifestar com tanta contundência e desprezo a integrantes de poder da República.  

É evidente que o processo se mostra verdadeira aberração jurídica, com claro ferimento aos salutares princípios da imparcialidade e da legalidade, em que o seu relator jamais poderia ser vítima, acusador e, o mais grave, julgador, o que demonstra algo surreal, em termos de procedimento judicial.

Agora, à vista dos fotos deploráveis, não se pode dizer que o deputado é inocente e assim praticamente ser considerado pelo presidente da República, porque ele extrapolou sim os limites do seu mandato e feriu claramente o decoro parlamentar, ao agredir a indignidade do poder Judiciário.

É preciso que tudo isso fique muito claro e o presidente do país não tem o menor direito de pôr panos quentes em questão que é absolutamente estranha ao interesse público, quando o deputado condenado quis, de forma deliberada e isso ele deixou muito claro, topar os ministros do Supremo e pôr fogo no que ele chamou de circo.

Urge que os poderes Executivo e Judiciário, inclusive com a salutar interveniência do Legislativo, em gesto de grandeza, essencialmente em benefício dos interesses do Brasil, se dignem a dialogar como autoridades inteligentes, educadas e civilizadas, como assim fazem as autoridades dos países sérios e evoluídos, em termos políticos e democráticos, com vistas aos melhores entendimento e solução para essa monstruosa questão que jamais deveria ter chegado ao ápice da truculência e da incivilidade, mostrando péssimo exemplo para o mundo civilizado.

Brasília, em 22 de abril de 2022

Nenhum comentário:

Postar um comentário