domingo, 11 de janeiro de 2015

O reconhecimento do desperdício

O governo federal anunciou uma série de medidas tornando bastante rigoroso o acesso da população a vários benefícios previdenciários, em especial o seguro-desemprego e pensão por morte. Na prática, o governo promoveu verdadeira minirreforma previdenciária, que tem vigência imediatamente, sob a justificativa da imperiosa necessidade de se “corrigir excessos e evitar distorções” e economizar a quantia da ordem de R$ 18 bilhões por ano, a partir de 2015.
As mudanças aprovadas incluem a triplicação do período de trabalho exigido para que o trabalhador passe a fazer jus ao primeiro pedido do seguro-desemprego e a elevação de seis para 18 meses o período seguido de trabalho para que os recursos sejam liberados ao contribuinte que acaba de ficar desempregado.
Uma fonte do governo disse que “Verificamos que 74% do seguro-desemprego está sendo pago para quem está entrando no mercado de trabalho. Agora, o trabalhador terá que trabalhar um ano e meio para ter esse direito”.
A partir de agora, a obtenção da pensão por morte do trabalhador também ficou mais rigorosa e o valor por pensionista será reduzido. Haverá exigência do prazo de “carência” de 24 meses de contribuição do segurado para que o/a dependente se habilite à pensão, em contraposição à regra anterior, que não exigia tempo mínimo de contribuição para o usufruto do direito ao benefício.
Será exigido o prazo mínimo de 2 anos de casamento ou união estável para que o cônjuge obtenha o benefício: “Esse prazo é necessário e serve até para evitar casamentos oportunistas”.
Também foi anunciado novo cálculo que reduzirá o valor da pensão: “Teremos uma nova regra de cálculo do benefício, reduzindo do patamar de 100% do salário de benefício para 50% mais 10% por dependente até o limite de 100% e com o fim da reversão da cota individual de 10%”.
Outra mudança importante foi a extinção da pensão vitalícia para cônjuges “jovens”, cuja concessão passa a se enquadrar em nova regra até a idade de 44 anos, ou seja, a pensão será paga sob a dependência da expectativa de sobrevida, i.e., o/a pensionista que tiver entre 39 e 43 anos receberá pensão por 15 anos; entre 33 e 38 anos obterá o valor por 12 anos; entre 28 a 32 anos terá pensão por 9 anos; entre 22 e 27 anos receberá por 6 anos; e com 21 anos ou menos receberá pensão por apenas 3 anos.
A minirreforma em apreço também foi bastante rigorosa com o seguro-defeso, o abono salarial e o auxílio-doença, aumentando a carência para a sua obtenção, no caso destes dois últimos, e tornando mais rígido o controle sobre a concessão dos benefícios pertinentes.
Os ajustes anunciados pelo governo representam a tentativa de ser minorado o crônico déficit da Previdência, que tem parâmetro de rombo anual sempre em torno de R$ 40 bilhões, porém essas medidas não constavam do programa da candidata petista, na última eleição presidencial, por não acenar para a possibilidade da retirada de direitos trabalhistas, como o fez nas medidas em exame, tanto que elas podem gerar expressiva economia de R$ 18 bilhões.  
Os ajustes em causa servem não somente como presentes de final de ano para os tolos de muitos dos eleitores petistas, que não conseguem, devido ao fanatismo ideológico, enxergar a realidade das maldades da administração do país, notadamente com desastrosa condução das políticas econômicas e o precário e deficiente combate às corrupções endêmicas e sistêmicas que assolam a administração pública, com destaque para os desvios de dinheiros da Petrobras, liderados por partidos do governo e da sua base de sustentação, conforme depoimentos do ex-diretor de Abastecimento da estatal.
No caso das medidas embrulhadas e jogadas no colo dos bestas dos brasileiros na passagem de ano, fica muito clara que se trata de verdadeiro presente de grego, com o rótulo bem nítido de calote eleitoral, tendo em vista que a petista sempre acenava, na campanha eleitoral, que era a única candidata que jamais mexeria nas conquistas trabalhistas, diferentemente dos demais candidatos que, se eleitos, diziam que iriam mexer na situação dos trabalhadores, como forma de corrigir graves distorções.
A situação em apreço se caracteriza como fato surpreendente, por terem sido implementados os ajustes em questões trabalhistas exatamente em surdina e no calado da noite, sem discussão com seu partido, seus aliados e muito menos os sindicatos, que foram seus fiéis apoiadores na campanha da reeleição, os quais também se sentem traídos pela inesperada atitude isolada do governo.
Não há a menor dúvida de que os brasileiros devem se preparar para o pior, porque certamente muitas medidas com gosto amargo hão de surgir para contraporem ao caos que assola a administração do país, que não foi percebido por ocasião da campanha eleitoral, por parcela da maioria dos brasileiros, possivelmente em razão do forte fanatismo que tem o condão de cegar as pessoas, que se tornam impedidas de enxergar o óbvio, por força do doentio idealismo político-partidário, que tem sido muito mais importante para ela do que os interesses nacionais.
É de se lamentar que somente agora o governo reconheça a origem de graves desperdícios de recursos públicos e tenha a percepção que o rombo da Previdência se localiza em causas antigas, identificadas de longa data, mas nada fez no sentido de saneá-las, possivelmente por conveniência política, por natural medo de perder a confiança do eleitorado, que poderia ter deixado de votar em quem foi capaz de mexer nos seus direitos, embora os benefícios pertinentes viessem causando enormes danos às contas públicas.
A sociedade, para o bem do Brasil, precisa se despertar, com o máximo de urgência, dessa crônica e perversa letargia que tem contribuído para empurrar a nação cada vez mais para o perverso subdesenvolvimento social, político, econômico e democrático, à vista da má administração do país, que se definha diante da incompetência e da precariedade na execução das políticas públicas, não que as medidas em comento sejam prescindíveis, mas, sobretudo, por elas terem sido saneadas tardiamente, depois da impune contabilização de desperdício de expressivos recursos públicos, que foram jogados anos a fio pelos ralos da incompetência político-administrativa. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 10 de janeiro de 2015

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