Com absoluta certeza, somente os melhores videntes,
com poderes mágicos, como aqueles que têm a famosa esfera de cristal, podem
prevê o porvir.
Refiro-me aqui ao caso espetacular do então juiz
responsável pela competente e eficiente Operação Lava-Jato, quando ele tinha a
reputação do principal e mais bem-sucedido magistrado do Brasil, que ficou
famoso justamente por suas decisões na esteira do mais implacável combatente aos
esquemas endêmicos e sistêmicos de corrupção instituídos por governos aproveitadores
do dinheiro público.
Nesse contexto, se ele tivesse o poder ver pela
bola de cristal, para se avaliar o que o futura lhe reservaria, certamente que
ele jamais teria renunciado ao relevante cargo de juiz, que foi alcançado por
meio de muito esforço em concurso público de provas e provas de títulos, deixando
à margem gloriosa e firme carreira de sucesso, com mais de vinte anos de efetividade
de trabalho, inclusive o que foi realizado à frente da Operação Lava-Jato,
montada e estruturada à sua feição, para combater a criminalidade de colarinho
branco, que jamais havia sido incomodada no Brasil.
Na verdade, a sua ambição parecia ser bem maior do
que o belo trabalho que ele vinha realizando na Lava-Jato, quando preferiu se juntar
ao projeto político do candidato eleito à Presidência da República, acreditando
nos fajutos e mentirosos compromissos de plenos poderes para ele estabelecer e
consolidar projetos capazes de assegurar condições de assepsia definitiva da
corrupção no Brasil.
O ex-juiz da Lava-Jato, talvez por imaturidade e ingenuidade
políticas, não tivesse a mínima ideia de que estivesse dando gigantesco passo
em arreia movediça, exatamente por desconhecer as artimanhas e os arcabouços existentes
no túnel escuro e estreito da desmoralizada vida política brasileira.
Caso ele tivesse, ao menos, alguma noção do perigo
do campo minado que precisaria ultrapassar para tentar fazer o trabalho que
imaginava, de aprovar medidas visando ao combate à corrupção e à impunidade,
certamente que ele teria resolvido se acomodar, bem quietinho, no lugar que
vinha lhe rendendo muitos louros e dividendos na vida de juiz absolutamente bem
sucedido na carreira do magistério.
Na operação Lava-Jato, ele tinha poder para decidir
soberanamente, julgar e condenar na forma da lei penal, poderosas autoridades e
figuras importantes da República e do mundo empresaria, em razão da roubalheira
protagonizada junto aos cofres públicos, em condições de colocar na prisão quem
sempre se beneficiava da impunidade, inclusive aproveitadores que usufruíam de
regalias como as do foro privilegiado que funcionava como forma de blindá-los.
O certo é que o ex-juiz, na qualidade de ministro da
Justiça e Segurança Pública teve atuação discreta, sem luz, tendo atravessado
seu curto mandato como estrela de primeira grandeza, antes de entrar nele,
completamente apagada, por não ter realizado nada em forma de combate à
criminalidade, salvo alguns inexpressivos atos próprios de perfumaria, ficando
bem distante da expectativa de alçar voo às alturas, em termos de combate à
criminalidade, em especial no que diz respeito à sua área de especialização contra
a corrupção e a impunidade,
Com isso, é fácil se perceber que o juiz da Lava-Jato
não passou de verdadeiro ingênuo, um inocente, que teria sido seduzido pelo canto
da sereia, entoado pela esperteza política que muito entende de marketing publicitário,
que teria sido, possivelmente eleito prometendo ser severo e duro contra a corrupção
que destroçou a saúde econômica da Petrobras.
Na verdade, o presidente do país investiu pesado e
de maneira esperta em pessoas conhecidas da sociedade, com a credibilidade do
então juiz da Lava-Jato, que gozava do maior conceito das pessoas honradas, na
certeza de que elas funcionariam como poderoso apoio na impressionante campanha
do novo paladino que salvaria o Brasil da destruição moral, ou seja, o seu
governo seria capaz de “consertar” as sujeiras do país, mas o resultado dos
investimentos que pareciam pesados se resume em monstruosa tentativa de
encerramento das atividades da Lava-Jato, que seria certamente de grande valia
para governo que não moveu uma pena sequer em apoio à sobrevivência do único órgão
da Justiça que se esforça em atuar contra a criminalidade.
Enquanto ministro da Justiça, o ex-juiz da
Lava-Jato se sentiu todo tempo desprestigiado, por ter se metido em tenebrosa desventura
que não se achava sequer arremedo do era antes, exatamente por não ter autonomia
para decidir sem o aval do presidente, que também se transformou completamente
em desinteressado do seu importante projeto contra a corrupção que ele tanto
demonstrava odiar, tanto que ela foi uma das suas maiores metas, ao lado do
armamento, na campanha eleitoral.
O ex-juiz se mostrava, no governo, cada vez mais comprimido
entre velhas raposas políticas, habilidosas no exercício do seu costumeiro jogo
da manutenção dos antigos privilégios e prerrogativas próprios do poder, no
caso, os parlamentares, sob a vigilância Judiciário que não os julga, à vista
das investigações remanescentes da Operação Lava-Jato, que quase ninguém foi
julgado, em que pese já terem decorridos mais de cinco anos que elas surgiram, em
declarada e assombrosa proteção aos criminosos de colarinho branco.
Todo esse horroroso quadro de desinteresse e de afastamento
das maravilhosas metas de sufocamento dos sistemas de corrupção ficou muito
claro que a participação do ex-juiz da Operação Lava-Jato no governo não
passaria de algo sem sentido, diante da inutilidade e do desprezo do bonito idealismo
centrado no inarredável combate à corrupção e à impunidade, sob o sentimento de
que o poder político da elite é muito mais resistente e indestrutível, a ponto
de ser possível se resumir em nada importantes projetos arquitetados com aquela
linda finalidade.
Por fim, a morte prematura e criminosa do ideal de moralização
da administração pública não se deu com o afastamento definitivo do ex-juiz da
Operação Lava-Jato do governo, porque ele já não atuava nesse sentido, diante
da falta de autonomia político-administrativa, mas sim com a aproximação do
presidente da República ao famigerado Centrão, cujo grupo tem como fundamento ideológico
o espúrio fisiologismo, à base do toma lá dá cá, com a troca de cargos públicos
e emendas parlamentares por apoio aos projetos do governo no Congresso Nacional,
algo apenas comparável às práticas políticas adotadas nas piores republiquetas,
onde ainda prevalece a pouca-vergonha no seio dos homens públicos.
Ante o exposto, pode-se concluir que a falta da aprovação
de medidas referentes ao efetivo combate à corrupção e à impunidade, como forma
de proporcionar a indispensável moralização da administração do Brasil precisa
ser atribuída exclusivamente ao presidente da República, que pode até se
vangloriar de não haver casos de irregularidades no seu governo, mas de efetividade
nada conseguiu fazer para instrumentá-lo para a eliminação desse câncer que
tanto prejudica os orçamentos públicos e a população, diante do desvio de
recursos que não poderiam se destinar a projetos ou atividades de interesse
público.
Brasília, em 17 de setembro de 2020
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