quarta-feira, 7 de outubro de 2020

À justiça de Deus?

  

Vem circulando nas redes sociais, a notícia de que o Tribunal de Justiça de Goiás  houve por bem  arquivar o processo que versa sobre as investigações promovidas pelo Ministério Público contra o padre responsável pela arrecadação e aplicação do dinheiro doado por fiéis, para a construção de templo religioso do Divino Pai Eterno, em Trindade, Goiás.

O pároco foi investigado no processo de que trata a Operação Vendilhões, por supostos desvios de recursos de doações de fiéis católicos.

A Primeira Turma daquele Tribunal entendeu, por unanimidade, que não há indícios suficientes de ilícitos para o prosseguimento da ação penal.

O Ministério Público de Goiás informou que vai aguardar a notificação sobre a decisão em apreço, para decidir acerca das medidas cabíveis a serem tomadas.

O advogado do padre disse que a decisão judicial reconhece que “não houve qualquer ato ilícito praticado pelo pároco.”.

Ainda conforme o mencionado advogado, “o religioso sempre se dispôs a esclarecer toda e qualquer dúvida sobre a sua atuação na Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe) ou em qualquer outro âmbito de evangelização.”.

Causa espécie a decisão judicial afirmar que não há indícios suficientes para a caracterização de atos ilícitos, quando o Ministério Público apontou uma série de fatos delituosos envolvendo a administração dos recursos em causa, conforme as situações indicadas a seguir.

Os promotores afirmaram que o dinheiro não foi usado somente na citada construção, porque “As contas bancárias da Afipe foram usadas para comprar fazendas, residências em condomínio fechado, apartamentos em São Paulo, em Goiânia, fazendas em todo Brasil, mineração. A Afipe, hoje, é uma grande empresa. Ela tem o argumento religioso, mas ela se converteu em uma grande empresa do estado de Goiás, que explora inúmeras atividades, agropecuária, mineração. Ela compra inúmeros imóveis e vende inúmeros imóveis”.

Entre os bens sob sub suspeitas foram elencados pelo Ministério Público uma fazenda, no valor de R$ 6 milhões, em Abadiânia, Goiás, e uma luxuosa casa de praia na Bahia, no valor de R$ 2 milhões.

Os promotores citam, a título de exemplo de negócios suspeitos a operação envolvendo um imóvel que a Afipe deu como forma de pagamento à KD, avaliado pelo valor de R$ 1,35 milhão, mas, para fins fiscais, o valor dele foi de R$ 2 milhões e, depois de dois meses desse negócio, o mesmo bem foi hipotecado pelo valor de R$ 7,35 milhões.

Em outra negociação, conforme esclarecem os promotores, a Afipe comprou uma fazenda pelo valor de R$ 6,8 milhões e, três anos depois, ela foi vendida pelo mesmo valor, para uma empresa do grupo suspeito de participar dos esquemas de desvio de dinheiro da igreja.

Segundo o Ministério Público de Goiás, uma irmã  do padre mora em um imóvel de luxo que pertence à Afipe e ela aparece nas apurações como participante de 24 operações imobiliárias.

Ainda de acordo com as investigações, embora a irmã do padre não tenha condições financeiras suficientes para participar de compras e vendas desses imóveis, ela aparece como uma das partes nessas transações, fato que levanta suspeita.

Nas investigações, o MP-GO encontrou evidências de centenas de compras e vendas de imóveis em nome da Afipe, em que a Associação pode ter sido prejudicada, em termos financeiros.

Também há, nos relatos da investigação, a indicação de várias empresas cujos sócios eram quase sempre os mesmos, que usavam o mesmo contador, as quis negociavam imóveis e faziam outras transações financeiras entre essas companhias e a Afipe, em triangulação de muita suspeição.

Os repasses às empresas de comunicação somam R$ 456 milhões, cujos recursos também são objeto de investigação, segundo os promotores, por não terem afinidade com o objetivo final da Afipe, que é proporcionar somente auxílio na vivência da fé e na propagação da devoção ao Divino Pai Eterno.

Além da irmã do padre, uma mulher da confiança dele e que trabalhou por anos na Afipe, também é apontada como “laranja” e aparece nos autos da investigação como dona de pelo menos três emissoras de rádio, ex-proprietária de avião e de casa luxuosa na praia, além de já ter recebido R$ 4 milhões da Associação.

Em situação absolutamente tranquila e normal, parece que não haver a mínima dúvida de que os fatos relatados acima, com muitas clareza e precisão, são mais do que suficientes para se mostrar a robusteza dos indícios dos atos ilícitos praticados pelo gerente dos recursos recebidos por doações do fiéis, tendo por exclusiva finalidade a construção de catedral, ou seja o templo de Deus.

Não obstante, os fatos mostram que os recursos também foram empregados em transações financeiras, em negócios próprios de grande empresa que explora os ramos imobiliários, agropecuários, mineração, comunicações e tantos outros, quando a finalidade do empreendimento é, repita-se, exclusivamente religiosa, cujos recursos jamais deveriam ter sido desviados desse objetivo originário, propiciando, ao que foi levantado, enriquecimento ilícito de muitas pessoas, em forma mais do que ilícita, à luz dos fatos investigados.

Ao que se pode concluir, de tudo isso, é que fica muito feio para o Ministério Público de Goiás, se as suas informações não mereceram credibilidade pela Justiça daquele Estado, por considerar que elas não respaldam o devido credenciamento pelos magistrados, que as descartaram, embora os fatos investigados, se verdadeiros, deveriam ter muito peso, porque eles caracterizam severos desvios de moralidade, quanto mais em se tratando do envolvimento de religioso, que tem por princípios a correção nos seus atos.

Enfim, não deixa de ser bastante deplorável que uma das Igrejas Católicas concentrem tanta fortuna sob a sua administração, na cifra de bilhões de reais, quando a sua finalidade institucional tem como princípios a pobreza, a simplicidade e a humildade, em termos de recursos, o que vale se afirma que a igreja, por mais especial que seja, não pode ter nenhuma forma de ostentação demonstrada como grande empresa de mineração, imóveis, agropecuária, comunicações etc., porque isso significa cristalino desvirtuamento do Evangelho de Jesus Cristo, que prega a pobreza como regra e o religioso tem o dever intrínseco de conhecer importante dogma nesse sentido.

Não se iludam os seguidores do padre, ao imaginarem que ele tenha se tornado inocente desse imbróglio, porque, segundo os ensinamentos do citado Evangelho, é princípio sagrada de que não é permitido se  acumular tesouro na Terra, enquanto ao redor da igreja houver tanta pobreza, mas o religiosa não se cansava de acumulá-lo e de pedir cada vez mais ajuda para a construção da catedral, quando a dinheirama amealhada nem se contentava aos propósitos alegados por ele e decidiram tomar outros caminhos absolutamente condenáveis, segundo os olhos de Deus.

          Brasília, em 7 de outubro de 2020  

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