“O Senhor e Pai da humanidade infundi nos nossos corações um espírito de irmão. Inspira-nos um sonho de novo encontro de diálogo, justiça e paz.”. papa Francisco
A
encíclica é a categoria máxima das cartas que o papa escreve e a expressão “Fratelli
tutti” (todos irmãos) volta-se para as mensagens escritas por São Francisco de
Assis, o religioso italiano que serviu de inspiração para o atual pontificado, na
escolha do nome desse famoso santo para o titular do trono de São Pedro.
A terceira encíclica do papa, com o título Fratelli
tutti (Todos irmãos), publicada no dia de São Francisco – 4 de outubro -, faz
denúncia sobre as desigualdades sociais e o “vírus do individualismo”, além
de pedir o fim “do dogma neoliberal” e defender a fraternidade “com
atos e não apenas com palavras”.
O pontífice enfatiza os importantes temas sociais mencionados
ao longo do seu pontificado e aproveita para refletir acerca do mundo que se
transformou por força da pandemia do novo coronavírus.
O
papa condena o “dogma neoliberal”, por considerar que ele é “pensamento pobre, repetitivo, que propõe sempre
as mesmas receitas diante de qualquer desafio que se apresente”.
O
papa repete tudo o que tem dito nas suas viagens ao redor do mundo, em especial
que “A especulação financeira com o lucro fácil, como objetivo fundamental,
continua provocando estragos” e adverte que “o vírus do individualismo
radical é o vírus mais difícil de derrotar. É possível aceitar o desafio de
sonhar e pensar em outra humanidade. É possível desejar um planeta que assegure
terra, teto e trabalho para todos”.
O
papa reivindica o direito do ser humano de puder viver “com dignidade e
desenvolver-se plenamente e recorda que a pandemia evidenciou a incapacidade
dos dirigentes de atuar em conjunto em um mundo falsamente globalizado.”.
Ele
disse que “A fragilidade dos sistemas mundiais diante das pandemias
evidenciou que nem tudo se resolve com a liberdade de mercado”.
O
papa lamenta que as pessoas mais velhas tenham sido sacrificadas, ao afirmar
que “Vimos o que aconteceu com as pessoas mais velhas em alguns lugares do
mundo por causa do coronavírus. Não tinham que morrer assim (…) cruelmente
descartados”.
Na
avaliação papal, “Às vezes deixa-me triste o fato de, apesar de estar dotada
de tais motivações, a Igreja ter demorado tanto tempo a condenar energicamente a
escravatura e várias formas de violência. Hoje, com o desenvolvimento da
espiritualidade e da teologia, não temos desculpas”.
Com
relação à pena de morte, o papa disse que “Hoje, afirmamos com clareza que ‘a
pena de morte é inadmissível’ e a Igreja compromete-se decididamente a propor
que seja abolida em todo o mundo. Todos os cristãos e homens de boa
vontade estão chamados hoje a lutar não só pela abolição da pena de morte,
legal ou ilegal, em todas as suas formas, mas também para melhorar as condições
carcerárias, no respeito pela dignidade humana das pessoas privadas da
liberdade. E relaciono isto com a prisão perpétua”.
Ele
disse que “Também não devemos esquecer as perseguições, o comércio dos escravos
e os massacres étnicos que se verificaram e verificam em vários países, e
tantos outros factos históricos que nos fazem envergonhar de sermos humanos”.
O
papa realça que os cristãos precisam amar a todos, inclusive os seus inimigos,
mas deixou claro que “amar um opressor não significa consentir que continue
a ser tal nem o levar a pensar que é aceitável o que faz.”.
Nesse
documento com característica eminentemente social, o papa pede atenção para nova
ética nas relações internacionais e espera e confia que “Uma sociedade
fraternal será aquela que conseguir promover a educação para o diálogo com o
objetivo de derrotar o ‘vírus do individualismo radical’ e permitir que todos
deem o melhor de si mesmos”.
No
texto da encíclica, o papa, ao discorrer sobre a convivência de diferentes
culturas, mencionou o compositor, poeta e diplomata brasileiro Vinicius de
Moraes, ao citar trecho da letra da música Samba da Bênção, que diz que “A
vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro na vida”, na tentativa
de estimular a cultura do estreitamento das relações sociais, como forma de
mostrar que todos podem contribuir, de alguma forma, com uma parcela importante
para o desenvolvimento da humanidade.
O
papa parafraseia São Francisco de Assis, no título da sua carta ao mundo – Fratelli
Tutti –, na tentativa de recuperar a fraternidade como sentimento principal
nas relações entre os seres humanos e mostrar o testemunho do mundo castigado e
ferido e acena para caminhos a serem enfrentados, à vista dos dilemas contemporâneos
apontados por ele, que imagina que seja preciso atenção especial para o amor e
o cuidado com as pessoas vulneráveis.
Causa
espécie que o santo para, em encíclica tão importante, em termos sociais, não
tenha se dedicado à condenação do regime genocida do socialismo/comunista, onde
a disparidade social é simplesmente abissal, os direitos humanos são
inexistentes, a democracia nem se fale e o ser humano é tratado como lixo da sua
espécie, a exemplo do que acontece normalmente nos países como Cuba, China,
Venezuela, Korea do Norte e outras nações que adotam o regime socialista/comunista.
Em
se tratando de documento intitulado “Todos irmãos” ou, se quiserem, Fratelli tutti, seria muito importante que o
santo pontífice discorresse também sobre a situação de penúria desses pobres
povos irmãos, fato este que dá a entender que estes seres humanos deixaram de
ser irmãos, há bastante tempo, talvez porque eles são tratados sob a égide estranha
aos princípios cristãos, embora os venezuelanos, os chineses, os cubanos, os
coreanos, enfim, todos os homens sejam filhos do mesmo Deus, mesmo que eles não
confessem a religião católica, e, diante disso, eles merecem o mesmo tratamento,
inclusive na concepção dos conceitos anunciados nessa importante encíclica, que
tem como alvo central “todos os irmãos”.
Não se sabe se é da competência, sob os dogmas da
Igreja Romana, de o papa somente se achar no direito de criticar à mancheia, em
documento oficial, os outros sistemas diferentes do regime socialista, que até
teria bastantes motivos para serem denunciados, à luz dos princípios defendidos
pela igreja de Jesus Cristo, em termos de defesa dos direitos humanos e dos princípios
de liberdade de expressão.
Nessa
minha linha de pensamento, alguns especialistas afirmaram que, ao se trazer a
visão do papa “para um mundo pós-pandemia, só faltou a encíclica pedir
socialismo já.”, diante da sua veemente defesa dos princípios fundamentais
das condições de igualdade social, sem atentar-se para as tragédias sociais que
acontecem normalmente na execução das políticas truculentas pelos brutamontes
ditadores que comandam as nações sob o famigerado regime socialista/comunista.
Percebe-se que, a par de tantas críticas e acusações
debulhadas sobre as mazelas do chamado mundo chamado “imperialista”, o papa apresentou
sugestões genéricas como forma de resolver as fragilidades do mundo globalizado
e considerado, por ele, prejudicial ao desenvolvimento da humanidade.
Cabe
importante crítica à encíclica Fratelli tutti, que pode ter sido
bastante feliz em apontar as distorções que imperam na humanidade, em especial,
no que se refere às desigualdades sociais, mas o papa poderia ter oferecido,
como especial e relevante cardápio pontifício, as sugestões necessárias e
adequadas ao saneamento das graves questões elencadas por ele ou até mesmo à minimização
de seus efeitos, à vista da importância do peso da autoridade que acena para o
caminho do entendimento e da solução.
Nessa
encíclica, o papa propõe a criação de fundo mundial contra a fome, que seria financiado
“Com o dinheiro usado em armas e noutras despesas militares, constituamos um
Fundo Mundial, para acabar de vez com a forme e para o desenvolvimento dos
países mais pobres”.
Nessa questão, aproveitando a referida sugestão papal,
que é da maior importância mundial, convém, ao meu sentir, que as nações resolvam
criar o Fundo Internacional da Solidariedade, a ser administrado e gerenciado
pela Organização das Nações Unidas, tendo por finalidade amparar as situações consideradas
de calamidade pública e que se encontrariam dificuldades para o seu provimento
em casos emergenciais de socorros humanitários.
Enfim,
o pontífice se esforça na identificação do mundo cheio de conflitos sociais e
econômicos, com destaque para o individualismo e a especulação financeira e o
lucro fácil, fatos estes que, a bem da verdade, são próprios da evolução da
humanidade e que se caracterizam como algo estranho ao mundo da Igreja Católica,
em especial no que se refere à sua ala conservadora, que continua apegada aos
seus dogmas imutáveis e prejudiciais à instituição, que têm dificuldade no acompanhamento
da modernidade e do desenvolvimento da humanidade.
É
bem verdade que os princípios da dignidade humana estão sendo prejudicados por
essa nova filosofia, onde prevalece o desejo da individualidade, ficando à
margem a justiça para todos e isso foge aos princípios defendidos pela Igreja
Católica, na pessoa do papa, que busca a contemplação da solidariedade e da confraternização
entre as pessoas.
À
toda evidência, é muito louvável que o papa tenha se manifestado em momento de difícil
transitoriedade mundial, em razão da pandemia do novo coronavírus, mostrando as
desvantagens dos desequilíbrios e das desigualdades sociais, sob o império da
ganância do capitalismo e do lucro fácil, o que é verdade, mas não se pode
ignorar que isso se insere na própria evolução do ser humano, que tem sido ignorado
pela Igreja Católica, que resiste ao tempo, em não pensar também na sua modernização.
De
um modo geral e especial o documento papal tem afeição própria de verdadeiro
vale de lágrimas combinado com a contemplação ao muro das lamentações, em que
ele enfatiza o individualismo, a especulação financeira, o lucro fácil e outras
atividades que foram enquadradas como o “dogma do neoliberalismo”, ao pedir o
seu fim.
Brasília,
em 18 de outubro de 2020
Nenhum comentário:
Postar um comentário