sexta-feira, 23 de outubro de 2020

O dom divino da felicidade!

  

O papa reconheceu, em documentário apresentado no Festival de Cinema de Roma, que as pessoas homossexuais devem ser protegidas por leis civis para os casais do mesmo sexo.

O papa disse exatamente que "As pessoas homossexuais têm o direito de estar em uma família, são filhos de Deus, possuem direito a uma família. Não se pode expulsar ninguém de uma família, nem tornar sua vida impossível por isso. O que temos que fazer é uma lei de convivência civil, eles têm direito a estarem legalmente protegidos. Eu defendi isso".

As declarações do papa, abordando novamente tema bastante polêmico, tem o condão de abalar e dividir a estrutura da Igreja Católica, embora ele já tivesse se referido ao mesmo tema por várias ocasiões, um pouco diferente deste posicionamento mais liberal e evoluído, sem a mesma contundência como o fez agora.

Um vaticanista explicou que o papa já teria dito que "Desde o início do pontificado, o papa fala de respeito aos homossexuais e que é contra sua discriminação. A novidade hoje é que defende como papa uma lei para as uniões civis". 

Desde que foi eleito, em 2013, o papa vem adotando tom de mais tolerância com relação aos homossexuais, a vista da sua famosa frase: "Quem sou eu para julgar?" e do recebimento de casais homossexuais em várias ocasiões, nos aposentos do Vaticano.

Certa feita, o papa fez ligação para um casal homossexual, pais de três filhos pequenos, em resposta à carta que recebeu deles, com relato de que eles sentiam vergonha quando levavam seus filhos à paróquia.

Na ocasião, o papa aconselhou que aqueles pais continuassem a comparecer à igreja, independentemente dos julgamentos das pessoas. 

Em outra situação, um cidadão vítima e ativista contra os abusos sexuais disse que "Quando conheci o papa Francisco, ele me disse que sentia muito pelo ocorrido. Juan, foi Deus quem te fez gay e em todo caso te ama. Deus te ama e o papa também te ama".

As opiniões de vaticanistas e analistas são no sentido de que os comentários do papa são os mais explícitos que ele já fez sobre relacionamentos homossexuais, não deixando mais dúvidas sobre o seu posicionamento com relação ao tema.

Segundo o biólogo do papa, "Esta era sua posição como arcebispo de Buenos Aires. Ele se opunha ao casamento homossexual, mas ele acreditava que a Igreja deveria defender uma lei de união civil para casais homossexuais, dando-lhes proteção legal.".

Ressalte-se, a propósito, que a vigente doutrina católica, no que tange às relações homossexuais, se posiciona no sentido de considerar "comportamento desviante", o que vale dizer que o papa confronta a doutrina da própria Igreja Católica, presidida por ele.

Tempos distantes, em 2003, o corpo doutrinário do Vaticano, representado pela Congregação para a Doutrina da Fé, afirmou, com a aprovação do papa de então, que "o respeito pelas pessoas homossexuais não pode levar de forma alguma à aprovação do comportamento homossexual ou ao reconhecimento legal das uniões homossexuais".

Em 2013, no livro Sobre o Céu e a Terra, o papa disse que equiparar legalmente casamentos homossexuais a heterossexuais seria "uma regressão antropológica".

O papa também declarou que, se casais do mesmo sexo pudessem adotar, "as crianças poderiam ser afetadas... cada pessoa precisa de um pai homem e uma mãe mulher que possam ajudá-los a moldar sua identidade".

Ainda em 2013, o papa reafirmou a posição da Igreja Católica de que atos homossexuais eram pecados, mas que a homossexualidade por si só não, tendo concluído que "Se uma pessoa é gay, busca a Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgar?".

Em 2018, o papa afirmou que estava "preocupado" com a homossexualidade no clero, e que este era "um assunto sério".

É importante se ressaltar a evidência de a Igreja Católica não ter interesse algum em mudança doutrinária significativa com relação à união homossexual, por se tratar de assunto de muita seriedade para os costumes dessa instituição, que normalmente tem o cuidado de tratar dos estudos pertinentes de maneira mais formal, mediante debates internos e reservados, só dando conhecimento ao mundo quando houver alguma forma de resolução.

Esse fato ajuda a se intuir que agora passam a existir dois posicionamentos, o formal da igreja e o informal, que é parece ser mais pessoal do papa, que ele não pode falar, nesse caso em nome dela, ante a existência de doutrina firmada, que, a princípio, precisa ser revista para se amoldar à posição dele.

Não existe sinal algum de que o corpo doutrinário do Vaticano esteja com interesse em mudança da orientação vigente, ante a prevalência do pensamento dos cardeais conservadores, que preferem manter o status quo de tudo que diz respeito às doutrinas da Igreja Católica, embora pelo gosto do papa, com tendência mais avançada, muitas doutrinas da igreja seriam aperfeiçoadas e modernizadas, para se amoldarem às conquistas da humanidade.

Tem-se que as declarações do papa podem até representar alguma forma de avanço nesse específico campo social, mas apenas para marcar posição pessoal, ficando assente que se trata de evidente abertura de confronto dele com a doutrina da instituição que estranhamente ele preside e jamais faria sentido que fizesse declaração em contrariedade à doutrina da igreja, porque isso representa clara divergência, que há de criar fortes discussões dentro da igreja,  e não pode ser visto com normalidade, mas sim com muita preocupação, sob a ótica da unicidade de pensamentos interna corporis, que precisa ser rigorosamente respeitada igualmente por todos.

Nas circunstâncias e no interesse doutrinário da instituição, parece que teria sido de melhor alvitre que o papa tivesse procurado previamente debater o assunto tão polêmico pelos mecanismos apropriados da igreja, junto ao corpo doutrinário do Vaticano, na tentativa de se buscar a melhor via para a definição sobre o assunto da própria Igreja Católica, diante da delicadeza clara de que ela tem a sua própria doutrina firmada, mas o comandante da instituição fez vistas grossas para ela, o que pode não ter sido o melhor caminho escolhido por ele, à vista dos interesses contrariados.

A princípio, o precedente do papa, sob o aspecto doutrinário da Igreja Católica, não pode ser considerada como medida salutar, diante do pensamento prevalente na instituição sobre o tema e da evidência de que se o papa, que é a maior autoridade da igreja, pode contrariar a teoria aprovada por ela, que é diametralmente diferente do pensamento manifestado pela autoridade máxima, então qualquer religioso pode desrespeitar normalmente as doutrinas ou os dogmas estabelecidos pela instituição criada por Jesus Cristo.

Sob essa ótica, o papa contribui, sem a menor necessidade e de maneira precipitada, para lançar dúvidas acerca de tema que se intensifica a polêmica sobre ele, diante da existência de conteúdo oposto ao defendido por ele, precisamente nos termos seguintes, constantes do Catecismo da Igreja Católica: “Apoiando-se na Sagrada Escritura, que os apresenta (aos homossexuais) como depravações graves, a Tradição sempre declarou que ‘os atos de homossexualidade são intrinsecamente desordenados’. São contrários à lei natural, fecham o ato sexual ao dom da vida, não procedem duma verdadeira complementaridade afetiva sexual, não podem, em caso algum, ser aprovados”.

Agora, no mérito, penso que o papa teria sim, como opinião pessoal dele, independentemente da doutrina existente na instituição que preside, direito aos devidos e merecidos aplausos, por defender o legítimo direito de as pessoas, não importando suas convicções comportamentais e sociais, puderem conviver em união familiar, da maneira que melhor lhes aprouver, porque esta é a forma ideal e capaz de se propiciar a plena satisfação da tão sonhada felicidade como sentimento importante e essencial à vida do ser humano, em harmonia com a sua qualidade também de filhos de Deus.

           Brasília, em 23 de outubro de 2020

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