quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Conduta ilibada?

 O indicado para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal admitiu a um senador que não fez curso de pós-graduação na Universidad de La Coruña, na Espanha, o que não poderia ser diferente porque essa universidade afirmou que não oferece o curso constante do currículo do magistrado e destacou que ele foi aluno apenas de curso com duração de cinco dias, em 2014.

Diante de questionamento, o indicado tenta se justificar, ao atribuir “erro” de informação, ou seja, problema na tradução, porque se trata de curso rápido, denominado de "postgrado", que ele disse ser tipo de especialização sem paralelo com a pós-graduação nos moldes brasileiros.

O indicado também não percebeu o lapso sobre a gravidade da sua informação, que contradiz com o verdadeiro significado do que seja "postgrado", que é, sim, pós-graduação, na definição e no entendimento tanto no Brasil como no exterior, a exemplo do que consta do dicionário de Cambridge, quando estabelece que o verbete se refere a grau de "mestre" de formação universitária, onde também existe explicação de que se trata de curso acadêmico em que estudantes podem levar mais de um ou dois anos para a sua conclusão, após o término da graduação.

O fato se torna mais grave porque a própria Universidad de La Coruña informa, com clareza, com referência precisamente ao mesmo termo - "postgrado" -, com a afirmação de que não houve o curso, nestes termos: "Informamos que a Universidade da Coruña não ministrou nenhum curso de pós-graduação com o nome de Pós-Graduação em Contratos Públicos".

O pró-reitor de pós-graduação da USP esclareceu que, em regra, pós-graduação significa mestrado ou doutorado, ou seja, explicando: "Você pode chamar de especialização, estágio, curso de extensão, mas no meio acadêmico você não utiliza a expressão 'pós-graduação' para um curso tão pequeno como esse, a menos que você fale que é um curso de pós-graduação sensu lato".

Além desse fato, foi verificado, pela revista Crusoé, que a dissertação de mestrado do indicado, que foi apresentada, em 2015, à Universidade Autônoma de Lisboa, em Portugal, contém trechos idênticos às publicações de outro autor, um advogado que teria feito mestrado similar.

Segundo a referida revista, os trechos idênticos incluem os mesmos erros de digitação encontrados nos artigos do advogado, dando a entender a existência de indício de plágio, exatamente por não haver qualquer menção ao trabalho do advogado.

De acordo com o jornal O Estadão, há trechos iguais em pelo menos três artigos do advogado, a exemplo de “Ativismo judicial: as experiências brasileira e sul-africana no combate à Aids; Direito à saúde: cidadania constitucional e reação judicial e O debate imaginário entre Luís Roberto Barroso e Richard Posner quanto à concretização judicial do direito à saúde, que foram publicados, respectivamente, em maio, junho e agosto de 2011.”.

Essas evidências mostram que o curriculum vitae do indicado para ministro do Supremo inclui informações insustentáveis, como nesse caso de curso que não é confirmado pela instituição de ensino e o que pode caracterizar plágio, embora ele tem procurado se blindar das acusações, em encontros prévios com parlamentares, membros do governo e do próprio STF.

O governo tem reafirmado seu apoio à confirmação da indicação em apreço, mas as acusações que pesam sobre seu currículo colocam-no em situação extremamente delicada de desconfiança, tendo em conta, em especial, que o relevante cargo de ministro do Supremo exige e condiciona, por força de ditame constitucional, o preenchimento do requisito de conduta ilibada, ou seja, sem mancha, imaculada, à luz da sociedade.

         Brasília, em 8 de outubro de 2020 

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