sexta-feira, 2 de julho de 2021

A desmoralização?

 

No presente momento, convém se reconhecer que o presidente da República, percebendo a suma importância do discurso de combate ferrenho à corrupção, precisamente nas linha dos desvios dos recursos públicos, levantados pela Operação Lava-Jato, que fornecera verdadeiro arsenal de casos de malversação esparramada nos governos anteriores, foi muito feliz em lançar, como meta principal, a ideia da guerra contra a roubalheira dos cofres públicos.

Diante do mar de escândalos que estarreciam os brasileiros honrados e ávidos por moralização, era preciso que aparecesse, finalmente, o corajoso paladino para operar o tão ansiado combate à degeneração dos princípios republicanos, cabendo a sua incorporado na pessoa do capitão reformado do Exército.

Daí precisamente que ele surgiu, mostrando que estaria disposto a usar, literalmente, a máscara do herói nacional, com a obrigação de salvar o Brasil dos aproveitadores do dinheiro público e colocar nos eixos os princípios da ética, da moralidade e da família, sob os auspícios de Deus, que, seu governo, estaria acima de tudo, tudo isso sob juramento incrustado no seu programa de governo.

Em princípio, o discurso foi confirmado já como presidente eleito, quando ele indicou o então juiz da Operação Lava-Jato para o superpoderoso Ministério da Justiça e Segurança Pública, dando a impressão de que tudo haveria de acontecer exatamente conforme o combinado na campanha eleitoral, que foi vitoriosa muito mais com o peso das promessas de moralização da administração pública.

          O tempo cuidou de mostrar que os discursos de candidatos são sempre iguais, apenas eles podem mudar de conteúdo, mas invariavelmente completos de muita sinceridade para conquistar o eleitor, que é levado, na sua ingenuidade costumeira, a acreditar neles, certamente na esperança de que, enfim, possa aparecer alguém de caráter para ratificar, na prática, as suas principais metas de governo.

No caso do atual presidente, as promessas essencialmente de moralidade tiveram o sentido de farsa, como verdadeiro estelionato eleitoral, quando se promete e não se realiza, sendo o mais grave, nesse caso, quando houve o desvio do programa de governo que tinha como cerne exatamente o seu principal objetivo, que foi o combate à corrupção, com maiores apoio e incentivo aos trabalhos investigativos da importante Operação Lava-Jato.

Na verdade, o que se viu foi exatamente o contrário, quando as metas do presidente foi o seu ligeirinho distanciamento das ideias pretendidas pelo candidato, em especial com o seu empenho direto em lacrar, exterminar, em definitivo, os importantes e essenciais trabalhos de moralização que vinha sendo empreendido pela Lava-Jato, tendo conseguido por meio da colaboração decisiva do procurador-geral da Procuradoria Geral da República, indicado e nomeado por ele, sem esquecer também que o ministro da Justiça foi obrigado a entregar o cargo, por divergência com entre ambos, justamente depois da interferência do presidente na Polícia Federal, que vinha trabalhando em contrariedade ao seu pensamento, com o que tudo contribuiu, de maneira definitiva, para o sepultamento da primorosa ideia de moralização da administração pública, que teria sido o sonho dos brasileiros honrados, que votaram nele, diante da sua promessa nesse sentido.

O certo é que o presidente venceu a eleição com um pé nas costas, como diz o ditado popular, sem fazer esforço algum nem precisar se envolver em campanha eleitoral e também sem participar de debates sobre as suas metas de governo, que estavam estribadas em palavras, basicamente, na vontade de se cuidar, de forma prioritária, da moralização da administração pública, que contava com a simpatia e o desejo dos brasileiros abençoados pelos sentimentos de dignidade e honradez.

Pois bem, durante a campanha eleitoral, o então candidato até achou por bem debochar do Centrão, como grupo de parlamentares fisiologistas e aproveitadores do dinheiro público e de outras vantagens nada republicanas, tendo jurado definitivo afastamento dele, mas, por obra do destino, ele terminou sendo castigado e obrigado a fazer aliança com esse famigerado grupo, tendo o levado para dentro do Palacio do Planalto, sob entrega de vantagens espúrias, com o envolvimento de dinheiro público, para ajudá-lo a governar o país e ainda blindá-lo contra as pretensões de abertura de processo de impeachment contra ele.

Vejam-se o que o presidente do país disse, em certa oportunidade da campanha, verbis: “Nenhum presidente é maior do que o seu ministério. O segredo para bem administrar o Brasil é você botar as pessoas certas nos lugares certos. O que vem sendo feito ao longo dos últimos anos: o presidente indica os seus ministros de acordo com interesses político-partidários. Tem tudo para não dar certo. Qual é a nossa proposta? É indicar as pessoas certas para os ministérios certos. Por isso, não integramos o Centrão. Tampouco estamos na esquerda de sempre. Vamos escalar as pessoas certas, porque assim você poderá, de verdade, ter saúde, educação e segurança.”.

Pode até funcionar como inacreditável, mas é pura verdade, o Ministério das Comunicações é comandado por autêntico integrante do Centrão, fato que tem o condão de mostrar a falta de sinceridade quanto ao verdadeiro sentimento de moralidade, que apenas pode mudar ao sabor das conveniências políticas, exatamente porque aquele grupo que fora desprezado na campanha eleitoral, precisamente para conquistar voto, é agora quem garante a sustentabilidade do governo, que já teria sido envolvido em processo de impeachment, não fosse a aliança sebosa e esdrúxula com o Centrão.  

Sem a menor dúvida, o atual governo, além de ter passado a ser medroso refém do Centrão, se transformou em autêntico escritório desse grupo desmoralizado, para quem fez loteamento de cargos públicos e ainda permitiu que ele dominasse a gestão da máquina pública, com a implantação de enorme esquema de corrupção, a exemplo desse episódio referente às propinas na saúde pública, envolvendo as compras de vacinas.

É evidente que o governo não apenas deixou roubar, mas é possível já existência da montagem de esquema com capacidade para se permitir desvios de recursos, à vista dos fatos denunciados sobre fortes e poderosos organizações criminosas no Ministério da Saúde, que nada de efetivo tem sido feito para as devidas investigações, segundo as notícias da mídia.

Ao que tudo indica, a máscara pode ter caído, com grande possibilidade de roubalheira no governo, que precisa agir com competência e urgência, para promover as devidas apurações sobre os fatos denunciados, com indicação de graves irregularidades.

É possível que os desvios não ocorrem somente na compra superfaturada de imunizantes, mas há notícia também no assalto direto nos cofres públicos, por meio do orçamento paralelo, que desviou quase R$ 30 bilhões em emendas para a compra de tratores, além de abarrotar bolsos de parlamentares que dão apoio ao governo, que se estrutura para se permitir boa limpeza dos cofres públicos.

          Causa perplexidade ser visível o quadro de dificuldade pela qual o presidente do país ter sido envolvido, mas não ocorre, em momento algum, que ele se mostre preocupado em encontrar mecanismos capazes de ajudá-lo a resolvê-la ou até mesmo minorá-la, principalmente com a adoção de imediatas apurações dos fatos sob suspeitas de irregularidades, como no caso do escândalo da vacina Covaxin, quando ele ficou ciente da situação, mas preferiu ficar em silêncio, talvez para proteger aliado do Centrão, citado como envolvido, permitindo que a bomba viesse a explodir exatamente no seu colo.    

À toda evidência, o desprezo do presidente da República às metas originais, apresentadas na campanha eleitoral, que primavam, de forma prioritária, pela moralização da administração pública, além da suspeita de negligência generalizada no combate à pandemia do coronavírus, têm forte peso na desgraça representada pela acentuada perda de popularidade dele, conforme mostram as pesquisas de opinião pública, dando a entender que ele enganou a muitos, por muito tempo, mas fica muito difícil enganar a todos por todo tempo.

Brasília, em 2 de julho de 2021

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