sábado, 31 de julho de 2021

Desrespeito aos princípios?

 

O presidente do Supremo Tribunal Federal resolveu preparar discurso com recados democráticos ao presidente da República, ante os reiterados  ataques que este vem fazendo, de maneira injusta e atrevida às autoridades da República.

O presidente do Supremo pretende ler o texto no próximo dia 2 de agosto, por ocasião da retomada das sessões plenárias do tribunal.

Segundo foi apurado, o presidente do Supremo exporá sobre a importância do respeito aos princípios democráticos e como cada autoridade institucional deve se pautar no estrito limite da liturgia apropriada do seu cargo, respeitando, na forma civilizada e evoluída, a autoridade que representa os demais poderes da República.

O presidente do Supremo pretende sinalizar a visão do STF sobre a importância da defesa da estabilidade e da consolidação democrática.

De antemão, já se sabe que o presidente do Supremo não deve mencionar nominalmente o presidente do país nem o ministro da Defesa, autoridades que se insurgiram contra a resistência sobre o voto auditável, sob o argumento de se evitar animosidades, em especial no seio dos militares.

A atuação do presidente do Supremo ocorre em momento de crescente tensão entre aquela Corte e o Palácio do Planalto, em que pesem as sucessivas tentativas de trégua, como a mais recente, em 12 deste mês, quando o presidente do país disse que ele e o presidente daquela corte estavam “alinhados com a Constituição, mas somente na falácia, porque o mandatário continuou atacando, sem trégua e com violência, ministros do tribunal, precisamente em razão de decisões e posicionamentos que desagradam o governo.

A crise atingiu mais um degrau, depois que o presidente do país ter resolvido atacar, novamente, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, que vem declarando ser contrário ao voto auditável.

Diante dessa disputa ferrenha sobre o voto impresso, o magistrado se tornou alvo constante do chefe do Executivo, por ele ser crítico à proposta dessa medida, defendida pelo Palácio do Planalto, nas eleições de 2022.

Em uma de muitas manifestações sobre o voto impresso, o presidente do país questionou: “Por que o presidente do TSE, na iminência de ver a PEC (proposta de emenda constitucional) da deputada Bia Kicis (PSL-DF) ser aprovada na comissão especial, ele vai para dentro do Parlamento, se reúne com várias lideranças partidárias e, no dia seguinte, muitos desses líderes trocam a posição da comissão por parlamentares que se comprometeram a votar contra o voto impresso. Qual foi o poder de persuasão do Barroso? Que poder ele tem?”.

Na realidade, a propósito disso, o presidente do país falta com a verdade, porque o presidente do TSE foi ao Congresso Nacional a convite da comissão especial que analisa o voto impresso, cujos membros retribuíram, depois, a visita do ministro com a sua ida ao próprio TSE, para contato de natureza técnica.

Não há a menor dúvida de que o presidente da República é useiro e vezeiro em fazer críticas a autoridades da República, em especial a ministros do Supremo, com indiscutíveis indelicadeza e desprezo, no sentido bastante evidente de desconstrução da amizade e da tolerância que precisam existir no seio da administração pública, no melhor sentido visando ao estreitamento e à consolidação das relações entre as autoridades, como forma do aprimoramento natural da convivência pacífica na prestação dos serviços públicos devidos aos brasileiros, em forma da contraprestação dos pesados tributos deles arrecadados.

O certo mesmo é que a índole de civilidade do presidente do país, conforme ele faz questão de assim se comportar, não se harmoniza com os sentimentos modernos de cidadania e diplomacia, sendo que isso não condiz com a verdadeira liturgia presidencial, que exige sentimentos de tolerância, moderação e principalmente de renúncia, quando o que está em jogo é precisamente o interesse público, que espera somente atos de nobreza das autoridades da República.

É evidente que faz todo sentido o presidente do Supremo Tribunal Federal propugnar por apelo inteligente e civilizado ao bom senso e à razoabilidade, na certeza de que ele tem o mesmo efeito do grito no deserto, uma vez que o presidente da República o ouvirá e o compreenderá perfeitamente, mas de nada adiantará, em termos de aproveitamento para a mudança do relacionamento dele com as autoridades da República, que seria em forma de aconselhamento ao bom-tom, diante do seu normal temperamento avesso aos princípios recomendáveis ao tratamento compatível com a evolução humanitária, a exemplo do seu já consolidado histórico no cargo.

Enfim, é de se louvar a iniciativa construtiva em apreço, para que fique o registro de que é saudável que as autoridades da República tenham plena consciência sobre a necessidade do fiel respeito aos princípios modernos da civilidade e da diplomacia, no relacionamento entre elas, como forma de fortalecimento em especial do sentimento de humanismo.

Brasília, em 31 de julho de 2021

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