terça-feira, 20 de julho de 2021

Apelo ao deus das urnas?

 

O presidente da República voltou, ontem, a fazer ameaças e a lançar suspeitas contra o sistema eleitoral brasileiro, sem apresentar, como nas vezes anteriores, qualquer evidência.

O presidente disse não acreditar que a proposta de voto impresso seja aprovada na Câmara dos Deputados e chegou a sugerir que, se o sistema eletrônico de votação não for substituído, ele pode desistir de concorrer à reeleição, em 2022.

O presidente do país disse que "Eu entrego a faixa para qualquer um, se eu disputar a eleição. Se eu disputar, eu entrego a faixa para qualquer um, mas uma eleição limpa. Agora, participar de uma eleição com essa urna eletrônica... Alguns falam: 'Ah, o Bolsonaro foi reeleito tantas vezes com o voto eletrônico...'. Vê o pessoal de banco aí, do sistema bancário. Se usassem a mesma tecnologia dos anos 2000, 1990, não teria segurança nenhuma".

A declaração do presidente, em frente ao Palácio da Alvorada, ainda se referiu, mais uma vez, à palavra “fraude” em relação ao processo de votação, sem também se dignar a apresentar provas acerca das suas acusações.

O presidente ressaltou, enfatizando em tom de ironia, que as urnas eletrônicas serão auditadas dentro do Tribunal Superior Eleitoral, de “forma secreta”’ e, segundo o seu entendimento, os responsáveis por auditar os votos das urnas serão as mesmas pessoas “que liberaram o Lula e o tornaram elegível”.

Desde que os desgastes se aprofundaram e ele passou a atacar o sistema de votação que vigora desde os anos 1990 sem qualquer evidência de fraude, o presidente tem alimentado a narrativa de que apenas a impressão do voto tornará o processo seguro.

Ao retornar ao Palácio da Alvorada, uma apoiadora perguntou se o presidente estava desanimado, no que ele respondeu que, na verdade, está "sem paciência", o que é pura verdade, porque o espírito irritadiço dele é evidente, por ele se mostrar bastante intolerante em público, fato este que não é bom para o estadista, que precisa de muita concentração e paciência para decidir sobre os assuntos de alta relevância nacional.

A afirmação do presidente do país sobre a existência de fraude no processo de votação brasileiro contraria o que diz o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, que garante, também sem apresentar comprovação alguma, que todas as fases da votação são auditáveis, além de ser permitido o acompanhamento dos integrantes dos partidos políticos, no processo de votação.

Ou seja, a votação pode ser passível de auditagem, mas isso não significa, em absoluto, que o processo é imune de fraude, exatamente porque não há conexão entre um caso e outro, considerando que a fraude pode ocorrer normalmente e a sua detecção somente se verifica se houver auditoria, podendo haver irregularidade e nunca ser descoberta se não ocorrer auditoria, fato que leva a se acreditar que a afirmação da autoridade eleitoral é mais do que pueril e totalmente descartável, em termos da garantia de segurança sobre as urnas eletrônicas.

À toda evidência, as declarações do presidente do país demonstram o extremo da incompetência diante de problema que pode perfeitamente ser solucionado, se ele tivesse o mínimo de tirocínio político e administrativo com algum resquício de capacidade para conduzir o processo no foro do diálogo, da concórdia e da harmonia.

Convém que as partes interessadas estejam realmente de acordo para abrir a caixa-preta das urnas eletrônicas e, em clima da mais pura honestidade, como assim devem se resolver as questões que envolvem o interesse público, em que de um lado do presidente tenha a devida competência para apontar o que realmente há passível de fraude no processo eleitoral, pelos seguintes motivos...(mostrar quais são as fraudes), de modo que, em razão disso, urge a necessidade da aprovação da impressão do voto.

Agora, por seu turno, compete ao Tribunal Superior Eleitoral contestar ou não a acusação do presidente do país, de modo a mostrar, se for o caso, com base em indicação técnica, que a sistemática operacional das urnas tem como se evitar totalmente qualquer tentativa de fraude, porque os instrumentos que devem ser  manipulados ali, na prática, são capazes de abortar qualquer acesso estranho à máquina, que, por exemplo, ela paralisa automaticamente de funcionar, sendo preciso a sua imediata substituição, se ela estiver sendo operada.

O ideal é que, na presença de ambos os interessados, seja forjado processo eleitoral como se verdadeiro fosse, com, por exemplo, dez máquinas, em simulação de eleição normal, a realizar-se naquele exato momento, onde seria feita a programação normal com as máquinas preparadas e em seguida formuladas possíveis situações de fraudes para se mostrar o comportamento operacional delas.

Agora, é conveniente e importante que, nesse processo demonstrativo, tenha presente equipe de mestres em ciência da computação, pelo menos dez ou a quantidade razoável, que vão colher, no ato, todos os elementos mostrados na exposição e todos, de maneira individual, vão se manifestar acerca da credibilidade do funcionamento das urnas eletrônicas, na forma apresentada pelos técnicos do TSE, por meio de relatório técnico, dizendo, o mais rapidamente possível, a sua opinião quanto à real segurança ou não das urnas eletrônicas.

Não obstante, fica muito evidente que a maneira como o assunto vem sendo discutido, sem a menor tecnicidade a se atingir os pontos nevrálgicos do problema, a ideia que se tem é que dois bêbados estão no meio de disputas em que ninguém sabe exatamente sobre o cerne da questão.

De um lado o presidente do país, atormentado com a participação do líder petista na disputa presidencial, alega possível fraude no processo de votação, que certamente há de acontecer, mas ele, nesse sentido, acusa e atira no escuro, sem ter certeza sobre o rumo ou a direção para onde disparou e o resultado há de ser o crescimento de fantasmas aparecendo incessantemente na frente dele, como agora, que nem acaba de sair do hospital, mas já coloca o pesadelo das urnas em discussão.

Enquanto isso, não tem o mínimo cabimento o presidente o TSE somente afirmar que as urnas eletrônicas são seguras e que elas podem ser, pasmem, também acompanhadas por representantes de partidos, que não têm condições nenhum e muito menos competência para enxergarem coisíssima alguma sobre possíveis fraudes, quanto mais detectá-las nas urnas, que são verdadeiras caixa-preta, fato este que não passa de santa ingenuidade, como se acreditar que os brasileiros sejam um bando de abobados, para acreditarem em afirmações absolutamente infundadas e medíocres, sob o ponto de vista da racionalidade.

Urge que as partes interessadas sentem à mesa e procurem manter conversação de alto nível, de modo a serem prescrutadas as questões relacionadas com as urnas eletrônicas, com vistas à identificação de possível fraude, de modo que a dissecação responsável e competente do tema possa resultar em medidas práticas e efetivas capazes de contribuir para a solução do problema que aflige terrivelmente o presidente da República, que demonstra, agora, que não vai se conformar com nenhuma forma de derrota, porque somente o deus das urnas pode adivinhar o que se passa na cabeça de quem se diz que está “sem paciência”.

Brasília, em 20 de julho de 2021

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