quinta-feira, 15 de julho de 2021

Falência de competência

 

Diante de crônica que foi dito que subprocuradores da República pretendem que o chefe do Executivo brasileiro seja investigado por declarações criticando o sistema eleitoral vigente, inclusive com ameaça de não haver eleições caso não seja aprovado o “voto auditável”, distinta e sempre atenta conterrânea pretende saber, basicamente, se o presidente do país tem competência constitucional para suspender eleições?

À toda evidência, não consta na Lei Maior do Brasil competência para o mandatário brasileiro suspender eleição.

A depende da situação grave irregularidade, evidentemente de natureza insanável, somente o Supremo Tribunal Federal tem competência constitucional para suspender eleição no Brasil, mas isso dificilmente há de acontecer, talvez em caso excepcionalíssimo, por exemplo, de aguda e perigosa pandemia seria possível o adiamento da eleição, como forma de proteção da sociedade.

A ameaça do presidente de bravatear que nem haja eleição, caso não tenha voto auditável, não passa de insanidade por parte de quem enxerga fantasma e deve viver drama de consciência, porque tudo que ele vem fazendo conspira contra os princípios constitucional e democrático, à luz do saber jurídico que ele demonstra desconhecer, evidentemente por interesse político.

Dizer que pode não ter eleição se não tiver voto impresso seria a mesma coisa que decretar a violação de princípios constitucionais previstos para a renovação dos mandatos políticos, onde o país inteiro ficaria sem o próprio presidente da República e todos os cargos que precisam ser renovados logo no início de 2023 e isso é absolutamente impossível de acontecer, em se tratando que não há, de maneira clara e efetiva comprovação de fraudes, salvo as suspeitas sobre a possibilidade que isso possa vir a acontecer.

Agora, preciso se entender, sob o prisma do bom senso, que, com voto impresso ou não, ninguém neste mundo pode evitar que as urnas sejam fraudadas, quanto mais agora, porque é com certeza absoluta que elas deverão ser indevidamente mexidas, só que de propósito, com a exclusiva finalidade de prejudicá-lo, diante das presepadas engendradas pelo presidente, que fez o diabo para desmoralizar a reputação do sistema eleitoral brasileiro, com a credibilidade do Tribunal Superior Eleitoral sendo jogada literalmente na lama da desconfiança e da incompetência, precisamente por patrocinar o processo eleitoral com o emprego de sistema ultrapassado e inseguro, à luz da compreensão do presidente do país.

Não à toa que o presidente da República pode vir a ser investigado por crime contra o sistema eleitoral brasileiro, exatamente por ele ter lançado, de forma extremamente imprudente e até irresponsável, para os brasileiros graves suspeitas de que as urnas eletrônicas são susceptíveis de fraudes, fato que não é novidade, com possibilidade de aproveitamento de votos de um candidato para outro, quando ele não foi capaz de provar o que alega.

Tudo estaria dentro da normalidade se o presidente da República ou qualquer brasileiro apresentasse sugestão para o aperfeiçoamento do sistema eleitoral, apontando falha passível de resultado da votação, na forma acima aludida, porque faz sentido que isso aconteça, diante da suprema necessidade da correção que deve e precisa imperar o pleito eleitoral, onde os votos colhidos sejam necessariamente computados exatamente para os candidatos destinados.

Até aí tudo bem, mas a lógica, a racionalidade é que, se isso não estiver ocorrendo precisamente assim, como previsto dentro da correção, é preciso que se mostre com base em caso concreto, provando, por exemplo, que voto dado para candidato A foi para a caixinha do candidato B, de modo a se mostrar, sem erro, que houve calamitosa falha de processamento eleitoral, em razão dos fatos tais, tais e tais, de modo que a única alternativa é providenciar o mais rapidamente possível o saneamento da falha, porque ela pode causar prejuízos imensuráveis para alguns, em benefício indevido para outros candidatos.

Enfim, o que falta é seriedade, compromisso, compreensão, competência, respeito e principalmente boa vontade para se fazer a coisa certa, tendo por base o diálogo construtivo entre as autoridades envolvidas, por meio do qual haja a precisa exposição dos fatos, com a presença dos elementos de provas de quem os tiverem, de modo que se resolva as pendências em clima de alto nível, no âmbito dos princípios da maturidade, tolerância e compreensão, de modo que seja possível o atendimento satisfatório do interesse público e a tranquilidade dos brasileiros, que são os principais interessados de que tudo funcione em perfeitas condições de legalidade.

Quando o presidente sugere e acena, em discurso nacional, a possibilidade da adoção de medidas de exceção, no caso de pôr em cheque a realização das eleições, não há a menor dúvida de que existem sinais evidenciadores de grave e concreta ameaça ao principal mecanismo de concretização e consolidação da democracia.

 Contra tal pensamento nefasto a sociedade precisa reagir e dizer de alto e bom som que o povo exige respeito, por parte do chefe de Estado, aos princípios constitucional, democrático e republicano, em harmonia com os pressupostos da suprema garantia da estabilidade da segurança jurídica.

É preciso que a atuação efetiva, firme e preventiva das instituições jurídicas do Estrado se faça presente neste exato momento em que autoridade da República tenta prevalecer pensamento negativista sobre a legitimidade dos pleitos eleitorais, conforme mostram os fatos noticiados na mídia, cuja atuação é forma de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, precisamente como previsto nos preceitos impositivos da Carta Magna.

Convém que os ímpetos de impulsividade do presidente do país sejam tolhidos logo na origem, não permitindo que eles ultrapassem os limites dos seus desejos, ante o cristalino ferimento ao exercício do direito constitucional à liberdade de expressão, cuja forma de rebeldia à sagrada regra constitucional pode sim configurar abuso de poder, com reflexos graves não apenas na normalidade do processo eleitoral, mas, agora, na sua própria existência, além de essa prática abusiva puder servir de precedente extremamente perigoso para se adentrar em outras áreas do governo, igualmente protegidas por ditames constitucionais, porque há o ditado de que, quem faz um sexto, pode também fazer um cento.

Não precisa muito esforço para se intuir que o presidente do país, na exagerada defesa do “voto auditável” abusou do poder de autoridade e atentou contra a normalidade das eleições 2022, ante o compromisso e a imperiosidade da obrigação dele de observar fielmente a Constituição Federal e as leis do país, nas quais preveem as eleições, naquele ano, para a renovação de quadros representativos da República, e a ameaça de não haver pleito nesse sentido configura sim claro ato de prepotência, autoritarismo, além de desestabilização dos princípios constitucional e democrático, fato este que caracteriza crime de lesa-pátria.

Enfim, à toda evidência, as elocubrações protagonizadas pelo presidente da República ferem de morte o sagrado e solene juramento feito no ato da sua posse, no sentido de que “prometo respeitar e cumprir a Constituição e as leis brasileiras.” e isso é extremamente preocupante, porque sinaliza para possível desandamento ou desestabilização das estruturas dos princípios jurídico-democráticos do Brasil.

Brasília, em 15 de julho de 2021

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