domingo, 11 de julho de 2021

O extremo da irracionalidade?

 

O presidente da República, ao questionar a legitimidade das eleições presidenciais, chamou o presidente do Tribunal Superior Eleitoral de “idiota” e “imbecil”, sob a sua concepção de que está tudo armado para que o petista volte ao poder.

Em reforço, o presidente disse a apoiadores, na porta do Palácio da Alvorada, que “Não tenho medo de eleições. Entrego a faixa a quem ganhar. No voto auditável. Nessa forma, corremos o risco de não termos eleição no ano que vem.”

Segundo o presidente do país, pesquisas de opinião – como a do Datafolha, divulgada na quinta-feira, mostrou que a rejeição ao atual presidente é de 51% entre as pessoas ouvidas — “fazem parte da fraude, tudo orquestrado para causar a impressão de que o cenário não é favorável para a sua reeleição.”.

O presidente disse que “Daí vem os institutos de pesquisas, fraudados também, botando ali o nove dedos lá em cima. Para que? Para ser confirmado o voto fraudado no TSE. Já está certo quem vai ser presidente no ano que vem. A gente vai deixar entregar isso?”.

O presidente disse que “os levantamentos e o TSE tentam beneficiar o ex-presidente Lula (PT).”.

O presidente do país ainda acrescentou que a declaração do presidente do TSE é “resposta de um imbecil. Eu lamento falar isso de uma autoridade do Supremo Tribunal Federal. Só um idiota para fazer isso aí.”.

Afirmações como estas do presidente do país, de que “o que o Barroso quer é a volta da roubalheira, da fraude eleitoral” não condizem com os princípios constitucionais, diante da falta de provas para respaldá-las, como exige a essencialidade do Estado Democrático de Direito, no sentido de que o ônus da prova compete ao acusador.  

O presidente concluiu, afirmando que “Se as eleições fossem honestas, por causa da tecnologia, por que o mundo não adota? Tá na cara que aqui é voltar a quadrilha de sempre para o poder. Não tenho medo de eleições. Entrego a faixa para quem ganhar no voto auditável e confiável. Dessa forma, corremos o risco de não termos eleições ano que vem. É o futuro de vocês que está em jogo", declarou Bolsonaro a apoiadores na manhã desta sexta.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral afirmou que “A realização de eleições, na data prevista na Constituição, é pressuposto do regime democrático. Qualquer atuação no sentido de impedir a sua ocorrência viola princípios constitucionais e configura crime de responsabilidade.”.

Diante das declarações do presidente brasileiro, de que o Brasil pode não ter eleições em 2022 se não houver voto impresso.” o presidente do TSE as considerou "lamentáveis”, tendo afirmado que “o sistema de urna eletrônica é íntegro e assegurou a alternância de poder.”, embora ele ainda não tenha se dignado a mostrar como realmente funciona a “caixa-preta” imperante nas urnas eletrônicas, objeto de desconfiança do presidente do país, que, por sua vez, também não apresenta nada para provar a necessidade de mudança.

O presidente do Senado Federal foi bastante inciso diante das declarações do presidente do país, ao afirmar que "Tudo quanto houver de especulações em relação a algum retrocesso à democracia, como a frustração das eleições próximas vindouras do ano de 2022, é algo que o Congresso Nacional, além de não concordar, repudia, evidentemente. Nós não admitiremos qualquer tipo de retrocesso nesse sentido".

Nunca se viu em autoridade da República tanta impaciência e extremo desespero de causa diante de situação apenas imaginária na mente da qual pode ter sido retirado o gene que trata do sistema eleitoral, a ponto de deixar o presidente brasileiro completamente louco e desnorteado, partindo para agressão contra o presidente do TSE, chamando-o de idiota e imbecil, algo simplesmente inacreditável em país sério e civilizado.

É de se esperar que o comandante da nação tenha o mínimo de sensatez, sensibilidade e equilíbrio, com a consciência centralizada nos princípios do civismo e da educação, de modo a se observar a liturgia do seu cargo, quanto à imperiosa necessidade do respeito às autoridades da República.

Termos civilizatórios, mesmo que o presidente do TSE esteja completamente errado e abusando da sua autoridade, é completamente inconcebível que ele seja tratado com o extremo de agressividade, em se considerando que as questões de ordem pública devem ser discutidas, analisadas e solucionadas em clima de harmonia, tolerância, competência e responsabilidade, mas jamais fora das quatros linhas ínsitas tanto do ordenamento jurídico do pais como das condutas inspiradoras do respeito à civilidade, em harmonia com os princípios democráticos, onde devam prevalecer os argumentos de equilíbrio, inteligência e racionalidade.

Em princípio, diante do visível estado emocional do presidente do país, que não mede palavras para mostrar seu inconformismo com status quo, que entende que precisa ser mudado, na força e marra, sob pena de sequer haver eleição presidencial no próximo ano, ante forte suspeita de fraude, até possível que existam graves irregularidades por trás dos panos, porque, em caso contrário, o mandatário não teria chegado ao êxtase do desequilíbrio psíquico, somente comparável à loucura, à vista de tantas desarranjos que não condizem com a cartilha da diplomacia que os verdadeiros estadistas procuram seguir como máximo de fidelidade, porque isso apenas demonstra princípios e respeito à relevância do próprio cargo presidencial.

A defesa das questões relacionadas com o interesse público é própria dos estadistas cônscios dos seus deveres constitucionais, porque, do caso contrário, o magistrado poderá até incorrer em crime de prevaricação, agora é preciso que os procedimentos necessários sejam adotadas em perfeita harmonia com as regras da normalidade, em que estejam presentes os projetos apropriados e as devidas justificativas, formalizados sob argumentações absolutamente sintonizados com os objetivos capazes de satisfazerem o império do interesse público.

Ou seja, em qualquer parte do planeta, até mesmo nas piores republiquetas, as medidas de ordem administrativa são sempre concebidas em ambiente da normalidade estabelecida no ordenamento jurídico pátrio, evidentemente por meio do entendimento e do convencimento democráticos, com base nos argumentos superiores da real necessidade da sua aprovação para a exclusiva satisfação dos fins públicos.

Diante disso, causa enorme estranheza que o presidente da República exponha publicamente comportamento animalesco de agressão verbal contra autoridades da República, de outros poderes, na clara tentativa de intimidação, com à aprovação de normas, na base do grito, mediante a mudança no sistema eleitoral que ele sequer tem autoridade nem competência legal para discutir, senão para somente apresentar sugestão para o aprimoramento dele, porque esse político se mostra como um dos principais interessados na tratativa da questão, compreendendo que ele pretende se reeleger e não deveria se imiscuir, por questão ética, em assunto que compete exclusivamente à Justiça eleitoral, ante à competência constitucional dela.

Em contraponto aos ataques irracionais do presidente do país contra o sistema eleitoral brasileiro e integrantes do Judiciário, presidentes de oito partidos se manifestaram em defesa da ordem democrática e em repúdio aos arroubos e abusos autoritários do presidente do país, que estão indo muito além da normalidade democrática e dos comezinhos princípios de civilidade, a ponto de ferir de morte os princípios constitucionais, com capacidade para causar rupturas institucionais, ante as absurdas e desmedidas agressões gratuitas, à vista da falta de elementos plausíveis para justificá-las.   

Enfim, o tema que se relaciona com o aprimoramento do sistema eleitoral, notadamente com o chamado “voto auditável”, por meio do voto impresso, precisa sim ser discutido com a maior rapidez possível, ante a exiguidade de tempo, mas, para tanto, é aconselhável que as questões que emanam para o cenário dos debates sejam tratadas apenas pelas autoridades competentes, nos termos constitucionais, observados, se for o caso, os princípios essenciais da real necessidade das mudanças e do respeito aos sentimentos de civilidade e humanismo, seguindo a melhor tradição dos países sérios e evoluídos, em termos políticos e democráticos.      

Brasília, em 11 de julho de 2021

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