terça-feira, 24 de maio de 2022

Desprezo aos eleitores?

 

Nos governos anteriores ao atual, era normal a cleptocracia se sustentar, basicamente, com o apoio da ganância dos sindicatos, da avidez dos aproveitadores das inescrupulosas elites empresarial, política, financeira, cultural e artística, e do quase total servilismo da imprensa, em total desprezo aos anseios dos eleitores, os mais interessados na participação da gestão pública.

Com a ascensão à Presidência da República do atual presidente, com os arroubos de moralidade e mudança de governabilidade, havia esperanças de que aqueças mazelas na gestão pública, enfim, teriam  caídas em definitiva decadência, uma vez que o neófito poder sinalizava para rumos estrategicamente diferentes, tendo por base os princípios do liberalismo econômico, que passariam a ocupar o espaço do deplorável estatismo de estrutura eminentemente cooperativista, de cunho populista e antidesenvolvimentista.

Havia a compreensão sobre o vislumbre de outros horizontes para os destinos do Brasil, sob o comando e a orientação da direita ou, quiçá, de centro-direita, que mandaria para o espaço sideral as retrógradas e nefastas ideias do socialismo.

Em que pese a cristalina falta de preparo e capacidade do atual presidente do país, a maioria esmagadora dos eleitores resolveu acreditar nas suas promessas de campanha, que aproveitou o ensejo para falar precisamente o melhor do bom moço, tendo conseguido transmitir as melhores ideias de governo para os brasileiros, já massacrados pelos abusos e por intermináveis roubalheiras, fisiologismo e insucessos nas políticas socioeconômicas, à vista dos melancólicos resultados mostrados pelos índices de desenvolvimento.

Ou seja, aquelas ideias disseminadas pelo dito “paladino” da moralidade e das mudanças, que viriam com as múltiplas reformas estruturais e conjunturais do Estado, se harmonizariam como uma luva com a avidez dos brasileiros, que ansiavam pelo aparecimento de novos tempos na política e na administração do país, na esperança de que as mudanças prometidas eram reais e para valer mesmo, mas os fatos mostraram o completo desvirtuamento das metas de governo, que se transformaram em indiscutível e criminoso estelionato eleitoral, quando as reformas foram apenas acanhadíssimas, exemplo da previdenciária, como a mais notável e talvez a única.

Diante desse novo contexto político, era de se imaginar que os governos anteriores, que tiveram a prodigalidade de se estruturar, em especial, sobre um mar de esquemas corruptivos, que chegou a assombrar o mundo civilizado e democrático, mas apenas na época do auge da Operação da Lava-Jato, seriam varridos da face da Terra, à vista das maravilhas prometidas, em forma de metas de governo, pelas audaciosas promessas do novo gerenciamento do país, sob os ares dos princípios da modernidade, seriedade e moralidade.

Não obstante, os fatos mostram a realidade nua e crua de muitas mazelas e precariedades que insistem em permanecer nas entranhas do governo, em especial, como o vergonhoso fisiologismo, com a entrega da gestão pública para o controle do famigerado Centrão, que é o símbolo do deplorável esquema conhecido como “toma lá, dá cá”, que jamais teria acento em governo com o mínimo de seriedade e honradez, no que se refere à gestão de recursos públicos.

Nessa linha de decadência moral e administrativa, o governo cuidou de reconduzir o procurador-geral da República no cargo, que tudo fez para liquidar, em definitivo, com a competente Operação Lava-Jato, órgão da Justiça que teve papel importantíssimo contra a criminalidade, a corrupção e a impunidade, na administração pública, cujo excelente trabalho havia sido reconhecido e elogiado pelo então candidato à Presidência da República, tanto que, depois de eleito, ele cuidou de nomear o juiz daquele órgão para o seu ministro da Justiça, como prova da confiança nos auspiciosos resultados obtidos nas suas investigações e nos seus julgamentos.

Com o intuito de materializar a verdadeira desmoralização da gestão pública, o presidente do país houve por bem entregar o seu governo para o gerenciamento do famigerado Centrão, com a disponibilização para ele de ministérios e bilhões de reais, sob a forma de emendas parlamentares, além da vexatória instituição do deplorável “orçamento secreto”, que tem por finalidade a exclusiva compra da consciência de parlamentares, igualmente inescrupulosos.

Na verdade, o orçamento secreto constitui expressiva excrescência na gestão pública, por liberar recursos para aliados do governo, sem a necessidade sequer da indicação do nome do beneficiário e, por pior, sem a obrigatoriedade da prestação de contas sobre a aplicação dos recursos pertinentes.

Tal procedimento mostra, com clareza, a falta de seriedade para com o dinheiro dos contribuintes, uma vez que isso significa verdadeira farra com o dinheiro público, quando não há controle, fiscalização nem indicação sobre a sua aplicação, ou seja, o atendimento da satisfação de necessidades públicas.

Agora, há o registro de fato bastante marcante do governo, que diz, precisamente, com o combate à pandemia do coronavírus, com o envolvimento direto das vidas humanas, em que o presidente do país se tornou o símbolo do negativismo e fez tudo para dificultar a compra das vacinas, permitindo que houvesse injustificável atraso na imunização, de quase um mês, além de ter colocado pessoa absolutamente despreparada e sem conhecimentos de medicina nem de sanitarismo à frente do Ministério da Saúde, que é o principal órgão incumbido de executar as políticas de saúde pública, com vistas à proteção dos brasileiros contra as doenças.

Na verdade, foi constatado que o combate ao coronavírus se caracterizou pela cristalina demonstração de insensibilidade humana perante a pior crise da saúde pública brasileira, fato que pode ter contribuído para potencializar a quantidade de mortes pela Covid-19, cujo total de óbitos ascende a mais de 660 mil.

O certo mesmo é que a tão ansiada melhoria na prestação dos serviços de incumbência constitucional do Estado ainda continua pendente de implementação, a par da notória falta das reformas estruturais e conjunturais da máquina pública, que sequer foram ventiladas e nem houve interesse nesse sentido, dando a clara impressão de que tudo ficou na base da mera experimentação para possível execução em oportunidade futura, a depender das circunstâncias e, evidentemente, das conveniências pessoais, com vistas à manutenção no poder.

Urge que os brasileiros se conscientizem sobre a conveniência de se exigir dos candidatos integral rigor no cumprimento das metas de trabalho apresentadas na campanha eleitoral, como forma de moralização do planejamento de governo, uma vez que o afastamento das promessas feitas aos eleitores constitui inaceitável quebra da palavra, com o contorno próprio de estelionato eleitoral, que não condiz com a seriedade e a dignidade ínsitas das pessoas públicas.

Brasília, em 24 de maio de 2022

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