terça-feira, 10 de maio de 2022

Vale tudo é vale tudo, mesmo?

 

Circula vídeo nas redes sociais em que o presidente da República faz declaração bombástica, em forma de ameaça bastante clara sobre o seu posicionamento em relação às decisões de ministro do Supremo Tribunal Federal, conforme o texto a seguir.

O presidente do país se expressou exatamente assim: “Se jogarem fora das quatro linhas da Constituição, entramos no vale tudo, no Brasil. Vale tudo é vale tudo. Então, esse negócio de prender esposa, irmãos, filhos é da ditadura. Não acha o cara em casa, prende a esposa e prende os filhos. Então, se a ideia for essa, se avançarem, entram no campo minado chamado vale tudo e vale tudo, vale tudo para os dois lados.”.

É preciso ficar bastante claro também que esse discurso de “Vale tudo é vale tudo” se harmoniza muito com a ditadura, quando tudo é pão-pão, queijo-queijo, sem a menor chance de diálogo e entendimento civilizados.  

Nunca se viu um presidente da República tão estabanado e insensato como esse, que fica a todo instante fazendo avaliações sobre algo inexistente, como se não tivesse se o governo não tivesse assunto importante para se ocupar, quando apenas se volta para conjecturar sobre o imaginário e, o pior e mais grave, se antecipando ao que pretende fazer se realmente acontecer algo desastroso, repita-se, apenas no plano do imaginário.

O estadista com o mínimo de competência sempre age em função dos acontecimentos, salvo a projeção das metas e políticas de governo, com vistas ao atendimento do interesse público, estando sempre preparado para adotar, de imediato, as medidas necessárias apenas quando os fatos realmente se efetivarem.

Na forma como são declaradas, com a indevida antecipação, as medidas a serem adotadas pelo presidente do país, em caso de algo errado ou prejudicial ao governo, fica muito evidente que isso funciona como mera estratégia de ameaças, intimidação, dizendo que, se o adversário fizer isso ou aquilo, a resposta será com as mesmas moeda e  intensidade, à altura que ele julgar conveniente, conforme o seu discurso nada republicano.

O recado do presidente do país deixa patente, para o bom entendedor, que se trata de tolerância zero parte dele, porque essa é a sua decidida disposição, como forma de defesa, ficando muito claro que não haverá qualquer possibilidade de diálogo a respeito dos fatos.

Sem dúvida alguma, essa forma de agir diz da cristalina mentalidade extremamente animalesca e anticivilizatória, em completa dissonância com a evolução da humanidade, que tem por princípio a construção de ideias capazes de se encontrar caminhos para a solução dos impasses e não de revides, que são próprios dos brutos, ante a evolução da humanidade.

É preciso se compreender que são naturais, na vida moderna, o surgimento problemas de toda ordem, mas eles precisam e podem ser saneados, em especial quando houver boa vontade e interesse nesse sentido, em se tratando da administração pública, onde deve sempre prevalecerem a observância dos princípios do bom senso, da racionalidade e da responsabilidade.

Neste caso exposto pelo presidente do país, fica muito claro que ele já tem a fórmula pronta e acabada para simplesmente contra-ataque,  por meio de medidas igualmente malignas vindas do que ele considera de adversários ao governo.

O ideal mesmo seria o contrário, em que o presidente do país estivesse preparado e em condições normais de oferecer alternativas adequadas à solução do impasse, com o emprego do diálogo, das ideias construtivas e do entendimento, como forma civilizada e aconselhável para o trato dos problemas, na melhor maneira normalmente elegida pelas autoridades públicas verdadeiramente conscientes sobre a dimensão das responsabilidades inerentes ao exercício dos relevantes cargos públicos.

Certamente que o presidente do país demonstra não ter essa consciência político-administrativa, porque ele prefere, conforme apregoa publicamente, mostrar elevado sentimento de coragem e bravura para o enfrentamento das questões, em discurso perante seus fanáticos apoiadores, que pouco se importam sobre a qualidade do emprego dos fins para o atingimento de seus objetivos, que são, em síntese, tão somente a reeleição.

Essa mentalidade do presidente do país é bastante lastimável, uma vez que o parâmetro por ele empregado é o pior e o mais desagradável possível, apenas levando em consideração a força bruta, como ele deixou claro no seu discurso, em forma de recado direto, quando a dimensão civilizatória de administrador público aconselha o uso de medidas que levem à pacificação, como assim deve ser a maneira que melhor atende aos princípios do bom senso da racionalidade, à vista da relevância do cargo exercido por ele, que precisa ser modelador e inspirador de tolerância, equilíbrio, sensatez, competência e responsabilidade.

Convém que o presidente da República priorize os interesses do Brasil, evitando confundir seus objetivos políticos com as causas nacionais, conforme ele deixa muito claro no supracitado discurso, quando ali se acena que ele poderá agir sob a égide da irracionalidade e da truculência, diante da mesma atitude que vier a ser adotada por adversários ao seu governo, na nada inteligente compreensão de que o erro não justifica a prática de outro igual ou pior, porque isso equivale a se nivelar por baixo, apenas com a finalidade de se mostrar força e poder de autoridade, que também dispõe dos instrumentos para a digladiagem.

Apelam-se por que o presidente da República mantenha-se em equilíbrio e tolerância, à altura da relevância do cargo presidencial, evitando tentar intimidar autoridades da República, por meio de recados mesquinhos e inoportunos, quando a liturgia inerente às suas funções de estadista exige grandeza, firmeza, competência e responsabilidade nas suas atitudes, que precisam ser respaldadas por meio da rigorosa observância aos salutares princípios republicano e democrático.    

Brasília, em 10 de maio de 2022

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