terça-feira, 31 de julho de 2012

Injustificável impunidade

O affaire envolvendo a ex-ministra da Casa Civil e seus familiares é tão confuso que a Justiça não teve “coragem ou competência” para solucioná-lo, tendo preferido encerrá-lo sem nenhum veredicto, apesar de a sua gravidade não recomendar medida nesse sentido, caso ele tivesse sido examinado à luz dos fatos investigados, com a devida observância aos princípios da imparcialidade e da transparência e imune à nefasta influência capaz de mudar a sua normal tramitação. Depois do arquivamento do respectivo processo, sob o argumento da falta de provas quanto ao tráfego de influência, veio à lume relatório inédito da Polícia Federal, obtido pelo Jornal F. de Paulo, onde é mostrado que o filho da ex-ministra e um então assessor daquela pasta operaram dentro do Palácio do Planalto, para ganhar dinheiro por meio de consultorias a empresários interessados em contratos com o governo. As investigações concluíram: "Confirmam-se as reportagens que apontaram que um servidor da Casa Civil indicou aos proprietários da EDRB a contratação da empresa de assessoria Capital (do filho da ex-ministra) para obtenção de parceiros para desenvolver um projeto apresentado na Casa Civil", "a real intenção de Vinicius ao levar a EDRB à reunião na Casa Civil era criar expectativa nos empresários para então oferecer a assessoria da empresa que explorava com o filho da secretária-executiva" e "Fica evidente que a conduta de Vinicius foi toda pautada no interesse em oferecer aos empresários o serviço da empresa que operava com o amigo Israel". A polícia revelou que a conclusão foi baseada em dezenas de depoimentos e análise de contratos entre diversas empresas e o governo, tendo ainda quebrado o sigilo telefônico, fiscal e bancário dos envolvidos. Todavia, a procuradora da República informou que a sua análise sobre o inquérito policial revelou que alguns dos fatos noticiados pela imprensa foram "demonstrados", mas eles não apontavam indícios de crimes e a contratação da consultoria poderia ser "traduzida como uma solicitação de vantagem", mas "não restou evidenciado que tenha se dado a pretexto de influir em ato praticado por servidor". Ela afirmou que o inquérito levantou "fortes indícios que a intenção era viciada", mas "não se pode dizer que o ato, em si, era contrário à disposição legal". Inobstante, a PF viu indícios de sonegação e lavagem de dinheiro e abriu novo inquérito, agora sem a inclusão da ex-ministra. É impressionante como as negociatas feitas dentro do Planalto, ante a necessidade de se criar, com a força do poder, ambiente de confiança e de credibilidade ao lobby, conforme demonstram as apurações, em evidentes ações ofensivas aos princípios da legalidade, que refutam a mistura de interesses privados com os públicos, não tenham sido suficientes para apontarem irregularidades capazes de incriminar os envolvidos. A conclusão de que não houve delito é inaceitável, à vista de ter sido utilizada a máquina pública em proveito pessoal. É provocação à sociedade e afronta à sua inteligência, além de incentivo à reincidência de fatos semelhantes, a afirmação de que tráfego de influência não tem relevância alguma, porque fatos dessa natureza não são tidos como conduta criminosa. Como é desalentador se verificar que as falcatruas e as desonestidades tenham sido praticadas, de forma criminosa, no âmago do poder público, dentro do palácio presidencial, e os delinquentes serem aquinhoados com o perdão, como se nada tivesse acontecido de criminoso. Acorda, Brasil! 

ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 31 de julho de 2012

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