quinta-feira, 26 de julho de 2012

Pouca-vergonha

Embora a lei eleitoral de 1997 barre expressamente os repasses "voluntários" três meses antes da votação, como forma de evitar o uso da máquina em benefício de aliados nos Estados e municípios - neste ano ela passou a valer no último dia 7 -, a presidente da República repetiu péssima lição do seu antecessor e editou decretos que permitem investimentos federais em novas obras durante o período eleitoral. Já foram publicados seis decretos, beneficiando 855 projetos, entre os quais a ampliação do Anel Rodoviário de Belo Horizonte, onde a presidente aposta suas fichas na eleição de ex-ministro petista contra o ex-aliado, prefeito e candidato à reeleição. A possibilidade de transformar por meio de decretos repasse "voluntário", proibido no período de eleição, em repasse "obrigatório", que é liberado, foi dada a partir de lei de iniciativa do governo anterior e aprovada no ano antes da campanha municipal de 2008, tendo como justificativa não prejudicar obras do Plano de Aceleração do Crescimento. Além da ampliação e modernização do citado anel rodoviário, antiga promessa dos políticos mineiros foi atendida por meio da brecha na lei eleitoral, com a liberação de investimentos em projetos relacionados a saneamento básico, urbanização de favelas e habitação popular. É impressionante como o governo federal sempre encontra aquele jeitinho brasileiro para burlar os princípios democráticos, justamente na proximidade das eleições, tendo por finalidade beneficiar seus candidatos, que podem propagar nos palanques os generosos investimentos da União, como antecipação do seu prestígio junto ao Planalto. Não há dúvida de que essa forma deselegante de fazer política contribui como fator de desequilíbrio das regras e dos princípios democráticas, que devem imperar nas eleições, tendo ainda força para causar impacto no pleito, deixando bastante visível o tratamento discricionário, em razão do peso que os investimentos podem significar para o candidato situacionista, que vai argumentar o tempo todo sobre as obras que estão sendo realizadas sob a sua influência política. Diante desses artifícios e dessas manobras espúrias em pleno processo eleitoral, não há a mínima dúvida de que os princípios firmados na lei eleitoral, proibindo o repasse de recursos “voluntários” no citado período, jamais deveriam ser inobservados, sob qualquer hipótese, máxime por envolver o uso da máquina pública e do dinheiro do contribuinte, que teriam por finalidade beneficiar apenas um dos candidatos, sob pena de caracterizar procedimento injusto e criminoso. No caso em apreço, o Ministério Público tem obrigação de exercer a sua competência constitucional, para coibir abusos dessa natureza. Por haver evidente potencial impacto no processo eleitoral, em razão da possibilidade de influenciar o eleitor, a sociedade tem o dever cívico de avaliar, por ocasião do seu voto, tão somente as melhores qualidades dos candidatos, independentemente das obras que estão sendo realizados com recursos federais, sem embargo de que o Ministério Público atue na forma da sua competência legal e constitucional. Acorda, Brasil!

ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 26 de julho de 2012

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