sexta-feira, 27 de setembro de 2013

As máscaras da vergonha

Não passa de pura utopia alguém querer usufruir o salutar princípio democrático se não demonstrar transparência nos seus atos. Norberto Bobbio leciona que "nada pode permanecer confinado no espaço do mistério". Nos últimos meses, o país foi tomado por mobilizações de grupos, muitos dos quais autointitulados Black Bloc, constituídos por jovens, na sua maioria, com tendência a atuar sob forte sentimento de inexplicável brutalidade e selvageria, causando depredação e destruição de bens públicos e propriedades particulares, sem nenhuma intimidação diante da força policial, que muito pouco ou quase nada tem feito para impedir a depravação e a desordem, com atemorização à sociedade. A violência protagonizada por esses grupos altamente agressivos, além de agitar os segmentos sociais, evidencia tremenda crise de autoridade, que vem demonstrando incapacidade para o estrito cumprimento dos seus deveres constitucionais e legais. Em todos os casos, fica patenteada a ineficácia das ações do policiamento, com a falta de preparo e de qualificação das corporações para conter a onda de violência, cuja virulência nem sempre tem culpado identificado e preso, como forma pedagógica para coibir e acabar com essa inadmissível bagunça. Não deixa de ser estranho que ainda não foi possível a identificação das reais motivações que levaram esses grupos se portarem com tamanha selvageria e truculência, em clara desmoralização dos preceitos constitucionais e legais, com a imposição da desordem pública e a intimidação das autoridades constituídas, que se acovardam ante a sua impotência para dominá-los e prendê-los, por força da sua competência institucional. Na atual conjunta socioeconômica brasileira, em que o crescimento do país claudica em meio à precariedade das políticas públicas e à falta de reformas estruturais do Estado, que não são suficientes nem satisfatórias ao atendimento das necessidades básicas da sociedade e muito menos capazes de fomentar o desenvolvimento do país, talvez servissem de motivação para tamanha irracionalidade, embora o descomunal exagero não justifique a indignação com a utilização de meios desproporcionais a essa sofrível realidade brasileira, conquanto o governo não demonstre sensibilidade para reconhecer as deficiências da sua gestão, que não permite que tenha alternativa para contornar a situação caótica dos segmentos sociais e econômicos. Esse mistério dos grupos mascarados precisa ser identificado e tratado com urgência, para que sejam evitados maiores prejuízos à sociedade. No Estado Democrático de Direito, as manifestações são absolutamente “improibíveis”, mas seus protagonistas são obrigados a cumprir os preceitos constitucionais, notadamente o disposto no inciso IV do artigo 5º da Lei Maior, que reza: "É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato", em combinação com a norma insculpida do inciso XVI do mesmo dispositivo, que diz: "Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente". Sem a menor dificuldade de interpretação, o uso das máscaras cobrindo os rostos dos manifestantes caracteriza a condição de anonimato, que não pode acobertar atitudes que contrariem os princípios da ordem pública, do pacifismo, do respeito à integridade das pessoas e do patrimônio público e privado, sem prejudicar o sagrado direito constitucional e legal da liberdade de ir e vir, sob pena de responder civil e criminalmente, em harmonia com os princípios de civilidade e racionalidade. Urge que as autoridades públicas tenham a dignidade de fazer cumprir os ditames constitucionais, quanto à proibição do anonimato e à necessidade de respeito aos princípios de pacifismo, como instrumentos capazes de contribuir para a preservação da paz e da harmonia no seio da sociedade. Acorda, Brasil!  
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 26 de setembro de 2013

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