quarta-feira, 18 de setembro de 2013

O império da impunidade

O ministro decano do Supremo Tribunal Federal disse, ao iniciar seu voto sobre a validade dos embargos infringentes, que a Corte "não pode se expor a pressões externas, como aquelas resultantes do clamor popular e da pressão das multidões, sob pena de abalar direitos e garantias individuais e (levar) à aniquilação de inestimáveis prerrogativas que a norma jurídica permite a qualquer réu diante da instauração em juízo do devido processo penal" e que é dever do Supremo garantir aos acusados "um julgamento justo, imparcial e independente". No seu minudente e judicioso relatório, o ministro disse que "Juízes não podem deixar contaminar-se por juízos paralelos resultantes de manifestações da opinião pública que objetivem condicionar a manifestação de juízes e tribunais. Estar-se-ia a negar a acusados o direito fundamental a um julgamento justo. Constituiria manifesta ofensa ao que proclama a Constituição e ao que garantem os tratados internacionais.". Sem causar a menor surpresa, o ministro resolver se posicionar favorável à aplicação dos embargos infringentes, em consonância com o seu pensamento já exposto anteriormente pelo cabimento do recurso, como forma de garantia dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. O certo é que a aceitação pelo Supremo dos embargos infringentes poderá haver reviravolta nos regimes das condenações já aplicadas, como a mudança do regime de prisão de três réus do fechado para o semiaberto e de semiaberto para aberto. Nos termos do Código Penal, penas entre 4 a 8 anos são cumpridas no regime semiaberto, em que o condenado pode deixar o presídio para trabalhar e voltar somente para dormir. Somente no caso de penas maiores que oito anos de prisão, o condenado é obrigado a cumpri-la no regime fechado, em presídio de segurança média ou máxima. Impende observar que os infringentes possibilitarão novo julgamento, em que os condenados que obtiveram quatro votos poderão ser absolvições das penas já aplicadas ou obterem diminuição delas, podendo ainda haver prescrição do crime, cuja situação estabelece que o condenado não possa mais ser punido em razão do tempo decorrido do cometimento do delito, ou seja, para a Justiça, o crime não aconteceu e os danos causados à honra e ao patrimônio do país e da sociedade simplesmente serão absolvidos e os criminosos comemorarão com champanhe francês a sua inocência pela absurda prescrição, por obra e graça da morosidade da Justiça. Pobre país em que a sociedade tem apenas a obrigação de pagar os altíssimos vencimentos dos Poderes da República, mas não tem influência nas decisões judiciais, para se manifestar no sentido de que devem ser condenados exemplarmente os delinquentes que desviaram dinheiros públicos, mesmo que eles já tenham sido condenados pelos crimes reconhecidos e atestados pela Suprema Corte do país, que pode entender que eles merecem ser julgados até mesmo quando passarem para outra existência, ao conceder-lhes o direito de recorrer eternamente pelos mesmos delitos, ou seja, mesmo depois do primeiro julgamento, vem outro julgamento e depois deste, sendo condenados novamente com quatro votos em seu favor, pode ser julgado novamente e assim sucessivamente até o infinito, enquanto isso a sociedade continua arcando com as custas processuais, inclusive os vencimentos dos juízes. Ao dizer que é dever do Supremo garantir aos acusados "julgamento justo, imparcial e independente", o ministro dá nítida a impressão de que está em franco estado de amnésia, ao ignorar que a aplicação dos embargos infringentes nada mais é do que reconhecer que, no julgamento que resultou a condenação dos réus do mensalão, o Supremo então teria sido injusto, parcial e dependente, a ponto ser obrigado a julgar novamente aqueles que obtiveram quatro votos a seu favor. O mais grave do reconhecimento dos infringentes é ter a certeza de que, no julgamento anterior, para os mesmos réus foram dadas amplas defesas igualmente concedidas aos demais condenados que não podem ser julgados novamente, o que se traduz em injusta discriminação. A sociedade repudia as incoerências e incongruências da Justiça brasileira, que, em nome da garantia dos direitos constitucionais – que não é estendida de forma isonômica para todos -, permite que delinquentes possam ser julgados novamente pelos mesmos crimes e pelo mesmo Tribunal e até isentados dos delitos protagonizados, os culpados deixem de pagar pelos danos causados à nação e a impunidade impere na republiqueta tupiniquim, como incentivo à esculhambação dos princípios sociais. Acorda, Brasil!  
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 18 de setembro de 2013

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