domingo, 19 de janeiro de 2014

Diárias justas?

O presidente do Supremo Tribunal Federal, que se encontra em gozo de férias, segundo anunciado por ele, deverá viajar no período de 20 a 30 deste mês para Paris (França) e Londres (Inglaterra). Nessas capitais, ele proferirá uma palestra em cada e receberá, dos cofres públicos, 11 diárias, na quantia total de R$ 14,1 mil, em decorrência do seu afastamento do país. Segundo a assessoria do Supremo, ele fará a primeira palestra no dia 24 em Paris e a segunda ocorrerá cinco dias depois, em Londres. Na agenda oficial dessa autoridade, não consta registro sobre os referidos eventos nem acerca das atividades desempenhadas por ele nos demais dias da sua permanência na Europa. No entanto, o cronograma do evento francês, publicado no site da Agence Nationale de la Recherche - uma agência do governo francês dedicada à pesquisa científica -, registra que o presidente do Supremo fará palestra de 30 minutos versando sobre a influência da publicidade das sessões do Supremo, a qual será transmitida ao vivo pela TV Justiça. A palestra seguinte, prevista para o dia 29, na Inglaterra, terá por tema o funcionamento da Excelsa Corte, em encontro organizado pelo King’s College de Londres. O presidente do Supremo se encontra oficialmente em férias e voltará ao trabalho somente no início de fevereiro, para a abertura do ano do Judiciário. No final de 2013, sua excelência disse, em entrevista, após a última sessão plenária do tribunal, que tiraria 20 dias de férias neste mês, no período de 10 a 30 e que descansaria até o fim de janeiro. No entanto, ele as antecipou e deixou de expedir o mandato de prisão de um deputado petista e do delator do mensalão, condenados por envolvimento nesse esquema fraudulento, fato que foi justificado pelo tribunal de que não houve tempo hábil para que os mandatos fossem assinados. Este caso, permitindo a liberdade do petista e do outro condenado, foi motivo de críticas entre os pares do presidente, que entenderam que ele deveria ter anunciado as decisões sobre esses casos antes de se ausentar da Corte. Segundo o Supremo, seu presidente resolveu interromper as férias para proferir as palestras e que o pagamento de diárias em dias que antecedem o compromisso se justifica porque "O presidente também visitará e retribuirá visitas a autoridades dos dois países. Em todos os encontros o presidente abordará temas ligados ao funcionamento das instituições brasileiras, especialmente o Supremo Tribunal Federal". O tribunal também informou que os eventos estavam previstos na agenda do presidente, que seriam divulgados em "momento oportuno" e que as passagens aéreas serão pagas pelas instituições e um assessor da Corte deve acompanhar o presidente. À toda evidência, a viagem em questão se reveste de nebulosidade, quando os eventos nem constavam da agenda do presidente do Supremo, que havia afirmado, no ano passado, que gozaria férias e descansaria justamente no período do seu afastamento para o Velho Mundo, tendo deixado de cumprir sua agenda de trabalho, a exemplo da expedição de mandatos de prisão de dois mensaleiros condenados e que estão aguardando a ordem emanada por ele. Por seu turno, o pagamento de diárias também representa grave irregularidade, porque as palestras não têm, em princípio, vinculação com o interesse público, não cabendo, por falta de amparo legal, dispêndio à custa dos contribuintes, quanto mais que, pelo fato de as passagens áreas terem sido pagas pelos organizadores dos eventos, há cristalina demonstração de que as diárias também devem ser assumidas e pagas por eles, que têm interesse na participação do presidente do Supremo nos eventos, sendo de inteira justiça que as despesas sejam integralmente arcadas pelos responsáveis por sua realização. De igual modo, as passagens e as diárias referentes ao assessor que acompanha o presidente devem ser pagas pelas entidades francesa e inglesa, sob pena de haver evidente dano aos cofres públicos, em razão de pagamentos sem justa causa para o Estado, ou seja, a viagem do presidente do Supremo à Europa, com a principal finalidade de proferir duas palestras, de meia hora cada, em eventos de interesse de instituições estrangeiras, sem qualquer vinculação com o interesse público, é injustificável quanto à obrigatoriedade do pagamento de despesas por parte do Brasil. Convém que os homens públicos se conscientizem sobre a necessidade de serem rigorosamente observados os princípios da legalidade e economicidade com relação à aplicação dos recursos públicos, que deve ter por finalidade o atendimento do interesse público. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 19 de janeiro de 2014

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