Enquanto os presídios se encarregam de mostrar para o país e o mundo a
degradação dos princípios humanitários, com mortes em séria e a prática das
selvagerias próprias da idade da pedra lascada, justamente pela omissão e
incompetência administrativa flagrantemente exposta à toda evidência, o governo
do Maranhão autorizou a abertura de certame licitatório, no valor de R$ 1,3
milhão, para a aquisição de bebidas e alimentos, inclusive uísque escocês,
champanhe e canapés de caviar para coquetéis e eventos oficiais. A licitação
prevê a compra de bebida "em
quantidades suficientes para atender a contendo todos os convidados",
incluindo vinho importado "de
primeira qualidade" (francês, italiano, chileno, espanhol e português)
e champanhe "de primeira qualidade" - extra brut, brut, sec e
demisec. As refeições, na quantia estimada em R$ 988 mil, incluem pratos como
risoto de lagosta, camarão e caranguejo, cabrito ao vinho, caldeirada de
camarão, bacalhau com natas e filé mignon à provençal. De entrada, os eventos
terão no cardápio casquinha de caranguejo, carpaccio de salmão e coquetel de
mariscos. Já os convidados dos coquetéis oficiais do governo poderão comer
canapés de salmão e caviar, cartuchos de lagosta e empanadas de camarão. Não
foi esquecida a aquisição de comida e bebida para "coffee breaks" e "brunches"
promovidos pelo Estado. Em compensação, o governo teve a “dignidade” de adiar,
talvez diante da notícia de que os presos estão comendo apenas arroz e galinha
crua, o pregão que previa a compra de 80 kg de lagosta para os palácios
oficiais. A gastança do governo maranhense reservou a quantia de R$ 403 mil
para a estrutura, decoração e equipe dos eventos. Os detalhes não foram
desprezados para as recepções, que deverão ter lustre com estrutura de cristal
e tapete persa dos tipos Golpayagan Sherkat e Kashmar, os quais ficarão a cargo
de decorador contratado. Está prevista a contratação de cantor e recepcionistas
bilíngues, todos sujeitos a "aprovação prévia" pelo Estado. Na forma
da orientação do cerimonial da governadora, o cantor deve "interpretar canções de repertório popular,
inclusive regionais, música ambiente, instrumentais e religiosas". Além de representar verdadeira
tapa na cara não somente do povo maranhense, mas dos cidadãos brasileiros,
esse fato constitui insofismável escárnio às boas condutas de dignidade e de
respeito ao erário, pelo evidente esbanjamento de contratações exóticas,
luxuosas e caríssimas, absolutamente dispensáveis para as condições de estado
pobre. É lastimável e vergonhoso que o Estado em pleno estágio de dilaceração
das suas estruturas sociais e econômicas, conforme evidencia o índice de
Desenvolvimento Humano, que o posiciona como o penúltimo estado do país, pela evidente
pobreza e carência ou precariedade dos essenciais serviços públicos, como saúde,
educação, segurança – não somente nas cidades como nos presídios -,
infraestrutura, saneamento básico, entre tantas mazelas, a governadora ainda
tenha a despudorada coragem e indelicadeza de expor à sociedade o quanto seus
palácios desperdiçam dinheiros públicos com opíparas mordomias de extravagâncias
somente comparáveis às nobrezas, às oligarquias europeias e aos países de
primeiríssimo mundo, que, com absoluta certeza, não teriam a leviandade de cometer
excepcional esbanjamento às expensas de notórios minguados e escassos recursos
públicos. Na verdade, essa falta de consciência sobre a necessidade da
austeridade e da parcimônia com recursos dos cidadãos não é privilégio somente
do clã maranhense, porque essa pouca-vergonha se encontra encastelada nos
governos e, de resto, nos poderes da República, cujos titulares, com raríssima
exceção, entendem que eles são os donos do patrimônio público e podem manejá-lo
a seu talante. É com muita tristeza se verificar que a maioria da classe
política brasileira tenha formação com princípios oligárquicos, em que o seu poderoso
pensamento é capaz de atropelar os comezinhos princípios democrático e constitucional
de respeito à coisa pública, que deveria ser utilizada apenas na estrita consecução
das precípuas finalidades políticas de satisfação do interesse público, com total
embargo da saciedade dos abomináveis interesses pessoais. Não fosse a
penalização que essa abusiva permissividade causa ao povo brasileiro, não
somente ao povo desse estado, até que não seria de se lamentar tanto que essa
pouca-vergonha estivesse acontecendo onde a abundância das bebidas e iguarias
deliciosas e caras contrasta com a penúria dos eleitores que elegeu livremente sua
representante, que aproveita o poder para ridicularizar e zombar em justo
merecimento dos seus otários súditos, à vista do dito popular de que o povo tem
o governo que merece. Urge que o povo se conscientize e se sensibilize sobre a
necessidade da escolha de seus representantes pela comprovação dos critérios de
competência administrativa e de compromisso com a preservação do patrimônio público, com total
desprezo aos nomes de famílias na política, que são incapazes de distinguir o
interesse público do privado e de respeitar os princípios saudáveis de
moralidade, economicidade e legalidade, inerentes aos procedimentos na administração pública.
Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR
FERNANDES
Brasília, em 14 de
janeiro de 2014
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