sábado, 18 de janeiro de 2014

Esculhabação orquestrada

O senador pai da governadora do Maranhão afirmou que o caos no sistema prisional não é exclusividade do Complexo Penitenciário de Pedrinhas e que as denúncias contra maus tratos de presos fazem parte de uma campanha contra o Estado. Ele disse que "Os que manipulam a opinião no país acham que só aqui acontecem as misérias, que são nacionais e globais. O Maranhão nunca teve tradição de violência. Passam uma imagem de nossa terra que atinge nosso orgulho, é injusta, tendenciosa, cheia de preconceito e tem uma conotação política. O Maranhão não merece isso”. O senador classifica as denúncias sobre o caos em Pedrinhas e a divulgação de licitações de artigos considerados supérfluos, a exemplo dos 80 quilos de lagosta e 2,4 toneladas de camarão, como “campanha” orquestrada por políticos da oposição contra o Maranhão. Ele endossa o discurso da filha de que o aumento da violência urbana é consequência do “crescimento do nível de renda” no Estado. O político concluiu, dizendo que “A campanha contra o Maranhão, infelizmente, tem dedo oculto de políticos nossos que acham que têm de destruir o Maranhão para desviar o interesse e o progresso que estamos vivendo e tirar vantagem política, repetindo que somos mais pobres, mais miseráveis e coisas mais”. Somente no ano passado, ocorreram sessenta mortes nas penitenciárias do Maranhão, fato incomum que responde por 1/3 dos óbitos nos presídios brasileiros e demonstra completa desmoralização das instituições públicas e das autoridades constituídas, levando à ilação de que não precisa ter tradição de violência para se asseverar que a segurança pública, nas terras maranhenses, padece de qualidade e exige urgente melhoria para que a bandidagem seja tratada na forma da lei. Enquanto os políticos não tiverem a dignidade de reconhecer suas falhas, sua incompetência administrativa e sua insensibilidade quanto à compreensão da exata dimensão das finalidades precípuas do importante exercício de cargos públicos, o país não terá condições para caminhar em rumo à civilidade que tanto se aspira, como forma capaz de fortalecimento dos princípios democráticos. No caso do Maranhão, há forte evidência de degeneração das estruturas do Estado, onde a criminalidade dominava e controlava os presídios, estabelecendo suas regras de extrema violência, barbaridade e crueldade, sem que as autoridades públicas tivessem competência para conter a grave crise, com a adoção de medidas indispensáveis ao controle da mortandade, que somente foi estancada após a intensificação das notícias pela imprensa, denunciando a omissão e a insensibilidade das autoridades para o caso. Não há a menor dúvida de que constitui extrema gravidade o fato de o governante não ter a dignidade de assumir suas fragilidades e suas responsabilidades pelos seus fracassos e insucessos, quando tudo conspira, no caso do Maranhão, contra os argumentos fajutos de tentativa de culpar fatores estranhos pela tragédia, como a manipulação da opinião no país, por passar a imagem distorcida da realidade, com conotação tendenciosa e carregada de injustiça, como se a violência fosse reflexo do crescimento do estado, que, na verdade, isso somente existe na ótica tacanha de quem não quer enxergar a verdade dos fatos, que indicam a extrema pobreza em todos os segmentos sociais, conforme atesta o Índice de Desenvolvimento Humano, ao posicionar o Maranhão no penúltimo lugar de miserabilidade do país, sendo ultrapassado por Alagoas, que também convive com alarmante índice de violência. É absolutamente contraditória a defesa do senador de que seu estado não merece a avaliação tendenciosa e injusta de ser o mais violento do país, por entender que se trata de opinião cheia de preconceito e de conotação política, quando os fatos chocantes ali protagonizados pela bandidagem ajudam a tornar insustentáveis seus frágeis argumentos, que são próprios de quem insiste em não aceitar a realidade nem se dignar a assumir a culpa pelos crimes havidos, justamente em razão da omissão quanto ao cumprimento da competência constitucional do Estado de oferecer condições dignas aos presos, que se deram conta da esculhambação com o vácuo de autoridade nos presídios e se “organizaram” a seu modo de selvageria nunca vista no país. Com certeza, num país sério, com o mínimo de civilidade e humanização, o governante como no caso do Maranhão já teria sido enquadrado no crime de responsabilidade pelos horrores ocorridos nos cárceres sob a sua jurisdição, como forma de punir os culpados e se evitar aberração semelhante a essa, além de afastar a possibilidade da insensatez de alguém atribuir a culpa pelos fatos ao imaginário, quando ela existe em substância e deve ser atribuída à incompetência da administração do Estado. A sociedade anseia por que os homens públicos sejam cônscios das suas responsabilidades e as assumam como forma de dignificar o cargo que exercem, evitando humilhações e ridicularizações ao tentar atribuir a culpa sobre os fatos a quem efetivamente não teve participação nos episódios, e de primar pela fiel observância aos princípios da sinceridade, moralidade, verdade e honestidade. Acorda, Brasil!
  
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 17 de janeiro de 2014

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