quinta-feira, 26 de maio de 2016

A degeneração do princípio da verdade


Uma ministra do Supremo Tribunal Federal notificou a presidente da República afastada para que ela esclareça, se quiser, no prazo de 10 dias, as declarações de que é vítima de um "golpe de Estado", diante do processo de impeachment que tramita no Congresso Nacional contra ela.
A solicitação em tela atende pedido formulado por deputados agora governistas, que entraram com ação na Suprema Corte, na tentativa de obter explicações dela sobre as infundadas e inconsistentes declarações de “golpe”, somente entendido assim por petistas e demais inconformados com o legítimo processo em causa.
O pedido em referência foi tomado por base regras do Código Penal, que prevê que a ofensa por calúnia, difamação ou injúria pode ensejar a reparação do dano moral junto à Justiça, com pedido de explicações a quem acusa de proferi-las, para fins de retratação. O dispositivo do citado código estabelece que "Aquele que se recusa a dá-las ou, a critério do juiz, não as dá satisfatórias, responde pela ofensa".
A ação aponta uma série de eventos onde a petista acusa de golpe o processo de impeachment, a exemplo da comemoração do Dia do Trabalho, em 1º de maio, de eventos no âmbito do Palácio do Planalto e entrevistas à imprensa, inclusive a jornalistas estrangeiros, em Nova York, em que a presidente foi enfática em alardear o impeachment de golpe, sob o argumento de que não teria cometido crime de responsabilidade, embora a expressiva maioria de congressistas se julgam atingidos pelas acusações da presidente, por serem protagonistas do afastamento dela, até o momento.
Os parlamentares afirmam que, ainda como presidente em exercício, a petista deu diversas declarações indicando que o processo de impeachment contra ela é golpe parlamentar, fato que, na acepção deles, constitui "acusação séria e gravosa contra as instituições", como a Câmara dos Deputados, o Senado Federal e o Supremo Tribunal Federal.
A ação deixa claro que, "Ao comportar-se da maneira como vem fazendo, a Senhora Presidente da República deixa toda a nação em dúvida, recomendando, portanto, a presente interpelação, a fim de que possa explicar qual a natureza, os motivos e os agentes desse suposto ‘golpe’, por Sua Excelência alardeado. É deveras espantoso que a Interpelada, no uso da importante posição de Presidente da República, incumbida do dever constitucional de promover o bem geral do povo brasileiro, não adote a cautela necessária às suas falas públicas e, ao contrário do que recomenda o bom senso, faça uso de expressões dúbias, vagas e imprecisas, insinuando em favor da ocorrência de um golpe no Brasil. E, pior, que deixe de explicitar qual golpe seria esse, consequentemente, subtraindo-se ao dever de tomar providências indispensáveis para evitar sua eventual ocorrência".
Com base nos esclarecimentos da presidente afastada, conforme o caso, os parlamentares podem ingressar com ação contra ela na Suprema Corte, alegando a existência de crime contra a honra daqueles que forem apontados como patrocinadores do suposto golpe.
Os parlamentares alegam que "Evidencia-se, portanto, que a presença de dubiedades nas afirmações da interpelada, segundo a qual está ocorrendo um golpe no país – sem nominar autores ou tomar providências para sustar algo de tamanha gravidade –, é o suficiente para que se possam pedir esclarecimentos".
Conquanto a petista alega que há golpe parlamentar em curso, sob o entendimento de que as acusações contra ela, objeto do processo de impeachment, não configuram crime de responsabilidade, mas, ao contrário disso, a denúncia contestada se fundamenta nas famigeradas pedaladas fiscais e decretos que ampliaram os gastos federais em R$ 3 bilhões, causando significativo rombo nas contas públicas, fato que se justifica, na forma da Constituição Federal, a caracterização do crime de responsabilidade por ela cometido.
Impende sublinhar que ministros do Supremo Tribunal Federal já rebateram a ridícula tese de golpe, sob o entendimento de que há previsão de impeachment na Constituição Federal e os atos praticados pelos parlamentares, questionados na Excelsa Corte, já foram apreciados, avaliados e mantidos por ela, quanto à sua juridicidade, restando rechaçadas as questões suscitadas pela presidente e por seus aliados, diante do entendimento de que há legitimidade nos procedimentos até aqui adotados pelo Congresso Nacional.
A extrema importância desses fatos desautoriza, por questão de bom senso e de racionalidade, a mandatário da nação ficar reiterando inverdades para o mundo, na vã tentativa de que elas possam ser transformadas em verdade, como fazem aqueles que, de forma desesperada, não aceitam a realidade nua e crua dos fatos.
A ridícula disseminação de “golpe”, partindo da própria presidente da República, ofende não somente os brasileiros que entendem diferentemente dela, mas em especial as instituições públicas, com destaque para o Congresso Nacional, que é o órgão incumbido do processamento do impeachment, e com maior grau de desrespeito o Supremo Tribunal Federal, que tem a relevante missão de zelar pela integridade da Carta Magna, que, em caso de golpe, seria ela a ter seus preceitos violados, recaindo sobre este a pecha da inaceitável omissão, por se calar diante do que seria flagrante desrespeito ao ordenamento jurídico pátrio, quando deveria tomar as necessárias medidas da sua alçada.
A propósito, a Advocacia Geral da União abriu sindicância para apurar a responsabilidade do então titular desse órgão, que não teve o menor senso profissional de ter sustentado, de maneira reiterada, formalmente perante o Congresso Nacional e o Poder Judiciário, em defesa da presidente afastada, a tese de que ela estava sendo alvo de golpe de Estado, fato que contraria frontalmente suas atribuições institucionais de também representar os interesses dos referidos órgãos, constituindo forma explícita e direta do uso do cargo para atentar contra a imagem dos poderes constituídos, em clara acusação de atuarem em conspirata contra o chefe do Executivo.
O titular da AGU afirmou que "A defesa de Cardozo foi criminosa. Esse discurso jamais poderia ter sido feito por um advogado da União. Ele acabou com a dignidade do órgão e cometeu crime de responsabilidade ao forjar o discurso do golpe".
Convém que, o quanto antes, se ponha os devidos freios, na forma constitucional e legal, à tentativa maléfica de desordem e desrespeito aos ditames vigentes, quanto mais no sentido de que deva prevalecer somente a verdade, como primado para os imprescindíveis aprimoramento e aperfeiçoamento dos princípios democrático e republicano, porque, ao contrário disso, a baderna com a disseminação de informações inverídicas e inconsistentes somente contribui para a consolidação do atraso e da pobreza das ideologias que degeneram os sentimentos de brasilidade. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
          Brasília, em 26 de maio de 2016

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