terça-feira, 24 de maio de 2016

Justificativas estapafúrdias


Enfim, o agora ex-ministro do Planejamento teve a dignidade de anunciar, ontem, que estava se licenciando do cargo, diante da estonteante revelação de sua conversa gravada com seu amigo de partido, onde consta que ele teria mentalizado a ideia de importante pacto para barrar as investigações da Operação Lava-Jato.
Bem ao estilo dos maus políticos tupiniquins, na tentativa de justificar seu plano estapafúrdio, o agora senador saiu-se com desculpas esfarrapadas de que pediria manifestação ao Ministério Público Federal sobre a sua degradante conversa com correligionário, a fim de que aquele órgão avaliasse se ele teria cometido algum tipo de crime em relação aos fatos abordados nas conversas gravadas entre ele e o ex-presidente da Transpetro.
          O jornal Folha de S.Paulo publicou matéria contendo diálogo entre o ministro e o citado ex-presidente, onde fica muito claro que ele cogitava sobre a formalização de "pacto" com o objetivo de tentar estancar a sangria das investigações da Operação Lava-Jato, dando a entender que algo mais grave poderia ser revelado com a continuidade dos trabalhos desse importante mutirão que vem se consolidando cada vez mais na busca da verdade sobre os lamentáveis acontecimentos que dilapidaram o patrimônio da Petrobras, que contou com a maléfica participação de importantes políticos, entre os quais o próprio ministro e seu interlocutor.
Na maior cara de pau, porque a gravação é muito clara, objetiva e direta, o senador teve a audácia de dizer que, "Como há certa manipulação das informações, eu pedi ao meu advogado, doutor Kakay, que prepare um documento, e nós estamos dando entrada hoje (segunda) à tarde para que tenhamos posição do Ministério Público Federal, se há ou não irregularidade, crime na conversa. Na medida em que colocar este documento lá no Ministério Público Federal, vou conversar com o presidente Temer e vou pedir licença do ministério enquanto o Ministério Público não se manifestar".
Embora tivesse sido flagrado em conversa altamente comprometedora, por haver nela trama para se interferir nos trabalhos da Justiça, com a detonação das investigações que já foram capazes de pôr no xadrez importantes políticos, empresários e executivos, ele suscita a criação de pacto para encerrar a operação mais eficiente já constituída na República tupiniquim e, dando a entender ser vítima da revelação em apreço, mesmo que ele seja o pivô dela, alega que se afasta do governo e aguardará decisão do presidente em exercício sobre o seu retorno, por ter, pasmem, a convicção de que "Estou consciente que não cometi irregularidade", como se fosse normal tentar paralisar as apurações que visam moralizar, mesmo que minimamente, a administração pública e punir práticas gravíssimas de corrução.
Causa espécie que o senador, em desespero de causa, tenha tentado dá explicações da forma clássica de quem imagina que os brasileiros são ignorantes e não conseguem interpretar texto escrito com a maior clareza e objetividade, quando ele teve a infeliz ideia de reclamar que as frases da sua conversa estão fora de contexto e assim por diante, em que pese ficar translúcido que ele e o interlocutor, ambos investigados pela Operação Lava-Jato, tramavam barrar os trabalhos da Justiça, contando, para tanto, com possível governo comandado pelo atual presidente interino, que teria, ao contrário, se comprometido a apoiar as investigações em apreço.
A absurda conversa em apreço mostra, com muita clareza, a forma promíscua como os políticos são eficientíssimos quando os fatos envolvem interesses pessoais, como no caso em tela, em que as investigações em curso sobre os fatos pertinentes à roubalheira na Petrobras podem pôr em perigo a imagem nada ilibada do senador, diante da sua descomunal preocupação em barrá-las, justamente para tranquilizar seu espírito de malfeitor e de aproveitador do dinheiro público, caso em que, ao contrário, a extinção da Lava-Jato jamais seria objeto senão de apoio aos seus trabalhos.
O presidente da República precisa se conscientizar, à vista da delicadeza e da gravidade do momento, em especial político e econômico, sobre a urgente necessidade de melhor reflexão quanto à situação dos ministros de seu governo que estão sob suspeitas diante das investigações da Operação Lava-Jato, tendo em vista que a sociedade não tolera mais que as políticas públicas sejam executadas por homens públicos investigados, mesmo que ainda não respondam a processo na Justiça, mas o simples fato de haver indícios sobre a conduta deles já é motivo suficiente para se recomendar seus afastamentos do governo, que vem alegando seriedade e responsabilidade.
No caso específico da revelação em comento, que foi confirmada pelo senador, fica caracterizada a falta de condições, principalmente morais, para a permanência dele e de outros suspeitos no governo, sob pena de se contribuir para inviabilizar até mesmo a permanência do presidente interino na Presidência, uma vez que a quebra dos princípios da moralidade e da dignidade não condiz com gestão responsável e interessada em mostrar que o país precisa realmente mudar para melhor, tendo por respaldo a consecução de políticas e ações que satisfaçam exclusivamente o interesse público, respeitados os salutares conceitos da democracia e da República. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 24 de maio de 2016

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