sábado, 9 de julho de 2016

Basta de privilégios...


A Justiça Federal de São Paulo suspendeu liminarmente os passaportes diplomáticos de um pastor da Igreja Internacional da Graça de Deus e de sua esposa, que tinham sido concedidos pelo ministro da Relações Exteriores.
Segundo a decisão, a concessão dos passaportes significaria “desvio de finalidade” e “mero privilégio”, porque a “prerrogativa diplomática” não seria compatível com o interesse público, “portanto incompatível com o princípio da moralidade”.
Nos termos da decisão, os questionados passaportes devem ser entregues ao Itamaraty por seus titulares, no prazo de cinco dias.
A decisão judicial diz que “é efetivamente incompatível com a Constituição que líder religioso, nesta condição e no interesse de sua instituição religiosa, seja representante dos interesses estatais brasileiros no exterior, há nisso uma confusão entre Estado e religião incabível”.
O texto ainda diz que o pastor, “em que pese a sua relevância”, não se identifica com nenhum dos cargos ou funcionários mencionados no Decreto nº 5.978, de 2006, que regulamenta a concessão dos passaportes diplomáticos, onde é estabelecido que podem receber o documento o presidente e o vice-presidente da República, os ex-presidentes, governadores, ministros, ocupantes de cargo de natureza especial, militares em missões da ONU, integrantes do Congresso Nacional, ministros do Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral da República e os juízes brasileiros em tribunais internacionais.
O Itamaraty informou que concede passaporte diplomático a dirigentes de denominações religiosas com base no princípio da isonomia, tendo como parâmetro histórico que cardeais da Igreja Católica sempre receberam passaporte diplomático.
De acordo com o Itamaraty, essa isonomia foi adotada durante o governo do ex-presidente da República petista, tendo prosseguimento nos dias atuais.
Embora o passaporte diplomático não conceda direito a privilégio ou imunidade no Brasil ou no exterior, muitos países concedem ao portador facilidade na fila de imigração e em alguns casos, isenção de visto de curta duração.
À toda evidência, a concessão de passaporte diplomático ao corpo religioso não tem amparo no ato regulamentador, que enquadra para tanto as principais autoridades públicas dos três poderes da República, como forma de facilitar o seu trânsito nos aeroportos, com a dispensa do enfrentamento das filas nos balcões de imigração ou até mesmo algumas exigências diplomáticas. 
Há informação por parte do Itamaraty de que o chanceler brasileiro teria determinado a reavaliação da política de concessão de passaportes diplomáticos, possivelmente na tentativa de moralizar o sistema, de modo que somente as autoridades elencadas na norma possam recebê-los normalmente, acabando com qualquer forma de privilégio indevido, como fazem os países civilizados e desenvolvidos democraticamente.
A concessão de passaporte diplomático a quem não faz jus, ou seja, não esteja indicado no rol das autoridades elencadas na norma disciplinadora da matéria, caracteriza mais uma situação ridícula, por burlar claramente a regra aplicável ao caso, e se enquadra no chamado jeitinho brasileiro, em que os aproveitadores sempre abusam da brecha e passam a usufruir vantagem indevida. 
A Justiça poderia aproveitar o ensejo para determinar ao Itamaraty que anule todos os passaportes diplomáticos que não se enquadrem nas normas de regência, como forma de moralizar o sistema e de dar o exemplo de correção que se exige da administração pública, que não pode ficar concedendo forma de privilégio a determinada categoria profissional, em detrimento das demais atividades também importantes para o país, à luz do princípio isonômico segundo o qual os brasileiros são iguais perante a lei, ex-vi de disposição constitucional.
O Brasil precisa, com urgência, seguir o modelo dos países sérios e evoluídos cultural, político e democraticamente, não permitindo qualquer espécie de privilégios para ninguém, além de exigir o cumprimento, com o devido rigor, das normas legais e regulamentares vigentes. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 09 de julho de 2016

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