quinta-feira, 14 de maio de 2020

Insensibilidade político-administrativa?

A Presidência da República exonerou o Secretário de Atenção Especializada à Saúde do Ministério da Saúde, sem a anuência do titular da pasta.
Como parte da negociação do presidente brasileiro com os partidos do Centrão, o posto deve ser ocupado por nome indicado pelo PL, sigla comandada por ex-deputado condenado no mensalão, por ter se beneficiado ilegalmente de recursos públicos.
Sem ter base no Congresso Nacional, sob pressão de aliados e após sofrer sucessivas e fragorosas derrotas políticas, o presidente do país começou, na forma acordada com o Centrão, a distribuir cargos aos partidos desse bloco, em troca de votos e apoio aos seus projetos, na forma extremamente vexaminosa, por trazer à tona, em escandaloso ressuscitamento da sebosa velha  prática do “toma lá, dá cá”, bastante disseminada em governos anteriores, que não tinham o menor escrúpulo em manter na administração pública bloco de políticos considerados aproveitadores do dinheiro dos contribuintes.
O PL pretendia a Secretaria de Vigilância em Saúde, pasta estratégica para formular ações sobre o avanço da covid-19, no Brasil, como orientações de distanciamento social, mas desistiu dela porque a Secretaria de Atenção Especializada é mais atrativa e se transformou em novo alvo do partido, haja vista que esse órgão tem a incumbência de autorizar o custeio (habilitação) de leitos de UTI no país, que também certifica entidades que fazem serviços complementares ao SUS, entre outros serviços importantes, atendendo em melhores condições aos interesses desse partido, que demonstra, com isso, a necessidade de serventia à agremiação e não propriamente, como devia, ao interesse público.
Vejam como a gestão pública brasileira se transformou em verdadeira esculhambação, com o ingresso no Central no governo, quando o ministro da Saúde, nesse caso, já havia convidado um especialista da área para ocupar a aludida secretaria, com o que se pretendia nomear pessoa qualificada para a função.
Não obstante, a referida negociação se encerrou, em definitivo, quando o PL pediu o cargo, que certamente será preenchido por político sem necessidade de nenhuma especialização para o exercício de tão importante função, o que demonstra o estrago que a mentalidade presidencial passou a causar aos interesses da nação, ao prestigiar a precariedade e a deficiência da prestação dos serviços de incumbência do Estado, exatamente como mostrou a experiência de governos irresponsáveis e sem nenhum compromisso com a decência e efetividade na aplicação de recursos públicos.
O que se verifica é que a composição da equipe do novo ministro da Saúde está sendo montada com pessoas nomeadas ao talante da Presidência da República, na melhor forma de atendimento dos interesses firmados em acordos do governo para a sustentação de apoio tanto da ala militar como de partidos do Centrão no Congresso, segundo avaliação de integrantes do governo e gestores do Sistema Único de Saúde, demonstrando total irresponsabilidade da gestão pública, com relação à eficiência na prestação da saúde pública, que não terá a qualidade desejável, quando são nomeados dirigentes estranhos às funções que precisam ser administradas exclusivamente por profissionais competentes e possuidores de conhecimentos compatíveis com os serviços a serem executados, como normalmente fazem os países sérios e evoluídos, em termos de compromisso com o elevado interesse em prestar serviços públicos da melhor qualidade possível.
É extremamente penoso para o ministro da Saúde, que recém ingressou no cargo, por ter a obrigação de trabalhar com equipe completamente estranha, sem qualificação e ainda sob a tutela do Palácio do Planalto, com a composição dos cargos principais orientada pelo núcleo militar do governo, fato que, por certo, demandará enormes dificuldades para a execução das políticas de saúde pública, notadamente em momento crucial, em que ele precisaria de equipe própria e de excelência para que pudesse combater, da melhor maneira possível, a pandemia do coronavírus.
Os fatos mostram a mentalidade de governo completamente dissonante com a realidade e o contexto nacional, quando o presidente da República, em demonstração de extrema insensatez político-administrativa, resolve povoar o mais importante órgão de combate ao coronavírus com pessoas desqualificadas e estranhas à área de saúde pública, a exemplo das nomeações de diretores com outras especializações e orientações oriundas do Centrão e militares, ficando evidenciada, com muita clareza, a maneira incompetente e irresponsável para a condução de problemas da maior gravidade inerente à saúde pública, que precisaria ser cuidada com o máximo de zelo e atenção, em forma, inclusive, de mutirão, como mobilização indispensável ao efetivo combate à pior epidemia que grassa impiedosa e cruelmente no país, graças à estridente demência e insensibilidade da gestão pública brasileira.
          Brasília, em 14 de maio de 2020

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