sábado, 30 de maio de 2020

Liberdade de expressão

O ministro da Educação e outros investigados no inquérito sobre ataques ao Supremo Tribunal Federal, sob a suspeita de divulgação de fake News, alegam estar exercendo o direito à liberdade de expressão.
Diante disse, alguns juristas explicam as claras diferenças entre esse direito democrático e os atos caracterizados de difamação, calúnia e ataques à honra, que podem constituir proibições puníveis  por lei, ou seja, o direito de se expressar livremente não pode ferir direitos constitucionais dos ofendidos com as agressões verbais.  
Na forma da Constituição brasileira, a liberdade de expressão é importante e essencial direito assegurado aos brasileiros que não pode ser negado a ninguém, por constituir princípio fundamental em sociedade livre, porque ele tem por pressuposto ajudar a consolidação da democracia do Brasil.
Um professor de direito da Universidade Estadual do Rio de Janeiro disse que “A liberdade de expressão é a forma pela qual os seres humanos constroem a sua identidade, a sua visão de mundo, se comunicando uns com os outros. Do ponto de vista político, ela é a mola mestra da democracia, porque é só através de um ambiente de livre informação e de livre discussão de ideias que as sociedades se informam sobre a verdade”.
A Carta Magna brasileira garante a liberdade de expressão, quando estabeleceu que "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;" e "é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença", ex-vi de disposição no art. 5*, incisos IV e IX, da referida carta.
Ao atacar, com veemência, a operação da Polícia Federal, acontecida esta semana, a mando de ministro da Excelsa Corte de Justiça, de busca e apreensão contra blogueiros, empresários e políticos, no inquérito que investiga fake news, ofensas e agressões contra aquela Casa e seus ministros, o presidente da República alegou ter havido desrespeito à liberdade de expressão, em claro menospreza aos seus verdadeiros primados, que se assentam exclusivamente na verdade, na informação digna e no respeito ao direito da cidadania.
O presidente assegurou que “E a liberdade de expressão é sagrada, me coloco no lugar de todos aqueles que tiveram suas propriedades privadas invadidas na madrugada. Me coloco, fosse cidadão, no lugar deles. Repito, não teremos outro dia igual ontem. Chega. Chegamos no limite. Estou com as armas da democracia na mão. Eu honro os meus compromissos no juramento que fiz quando assumi a presidência da República (sic)”.
A verdade é que a Lei Maior do Brasil assegura o sagrado direito de se manifestar livremente, mas, por outro lado, também impõe limites que impedem a invocação da liberdade de expressão para ameaçar, caluniar, difamar alguém, fazer campanhas e insuflar o ódio contra autoridades e instituições públicas e tudo isso já foi além da liberdade de expressão para tudo, menos para ofensas morais, com danos à imagem do agredido.
A liberdade de expressão não quer dizer que a pessoa fica imune de responsabilidade se tentar destruir a imagem de autoridades, pessoas e instituições e ficar por isso mesmo, como se não tivesse acontecido absolutamente nada, com relação à imagem de quem foi atingido com as agressões verbais.
Mal comparando, mas é o mesmo que a pessoa ter a posse de arma, assegurada por lei, e sair por aí matando quem bem entender, sob a condição e o entendimento que a autorização do uso da arma dá o direito de usá-la da maneira que bem quiser, sem precisar prestar conta sobre seus atos ilícitos e criminosos.
É preciso se entender que o princípio da legalidade tem como pressuposto que a liberdade dos atos pessoais tem como parâmetro o respeito aos ditames das leis, ou seja, é livre sim a expressão, mas é conveniente e precisa se acatarem as normas sobre a proibição de agressões verbais às pessoas e às instituições, no estrito sentido segundo o qual o nosso direito termina onde começa o direito do outro, o que vale dizer que ninguém gostaria de ser agredido verbalmente, nem mesmo quem agride.
A liberdade de expressão não pode se sobrepor a outros direitos constitucionalmente garantidos, como o direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem, enfim, à dignidade, que exige respeito recíproco, em uma sociedade dita democrática, onde os direitos e os deveres são na mesma paridade, em que não pode haver privilégios para ninguém, nem mesmo para as autoridades públicas, cuja primazia é a de ser respeitado, nas mesmas condições em relação à sociedade em geral, em consonância com o princípio constitucional da isonomia.
A liberdade de expressão pressupõe o compromisso com a verdade, ou seja, esse direito não pode proteger quem mente para agredir verbalmente a imagem de pessoas ou instituições, porque, depois do dano causado, bastava alegar a blindagem contida no direito à livre expressão, fato que contraria os princípios da fidelidade e dignidade sobre a verdade, ínsitos do ser humano, que precisa evoluir sob o pálio da honestidade de seus atos.
Em última análise, tem-se que a expressão da verdade presume-se a essência da manifestação do pensamento humano, enquanto a mentira não passa de criação normalmente com a finalidade de distorcer a verdade dos fatos, para, em muitos casos, servir da propagação de algo inventado e agressivo ao convívio social, tendo por característica a busca de resultados ilícitos, imorais e indignos, configurando crime capitulado na legislação protetora da ordem pública.
Infelizmente, os ambientes virtuais passaram a oferecer múltiplas facilidades para o surgimento de verdadeiras milícias digitais, por meio das quais a inteligência humana desenvolve volume extraordinário de ideias mirabolantes, sob a forma de manipulação de fatos fraudulentos e falsos, que são facilmente disseminados nas redes sociais, com poderes enormes de desinformação com o objetivo de ofender, desmoralizar e desacreditar pessoas, grupos e instituições, em ambiente absolutamente contrário ao primado do direito da liberdade de expressão.
Essa maneira de procedimento é condenável, por destoar completamente da essência da liberdade de expressão, à vista da caracterização de conduta criminosa que não pode, de modo algum, contar com o beneplácito de ditame constitucional que existe exatamente para proteger o livre e sadio exercício de cidadania, em termos de expressão da palavra, de puder defender suas ideias livremente, mas no sentido de pureza e construtivo, como forma de aprimoramento dos princípios democráticos.
Não tem o menor cabimento, em um país sério, se tentar pôr sob a proteção do direito da liberdade de expressão, as notícias que objetivam a disseminação de fatos inverídicos e manipulados, tendo  por finalidade a destruição de imagem e prejudicar direitos de terceiros, para se propiciar benefícios artificiais e ilicitamente, por meio de processo espúrio e vergonhoso e depois os envolvidos ficarem impunes, sob a indevida alegação do direito da liberdade de expressão.
O mais grave dessa imoralidade é que, normalmente, ela tem o financiamento de grupos poderosos e influentes da política e do mundo empresarial aproveitadores, sendo que, alguns deles, nem se robustecem em defender essa indignidade como sendo liberdade de expressão, por considerar que é direito sagrado, mesmo nessas condições de degradação do princípio da verdade, que não pode se  afastar dos sentimentos humanitários.
Com vistas à defesa da dignidade humana, urge que sejam desvendados os casos ilícitos e identificados os autores dos crimes contra a liberdade de expressão, porque se trata sim de atividade degenerativa da dignidade social, em especial em razão da necessidade da proteção e preservação do salutar e fundamental princípio da liberdade de expressão, como forma do aperfeiçoamento e da consolidação de um dos principais pilares da democracia moderna, que precisa ser defendida e exercida com o maior senso de responsabilidade possível.
         Brasília, em 30 de maio de 2020

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