O presidente da República concedeu a 32 cientistas a
condecoração da Ordem Nacional do Mérito Científico, mas, apenas três dias
depois dessa importante outorga, 20 deles anunciaram sua renúncia coletiva à
honraria.
Em carta aberta à nação, os mencionados cientistas afirmaram
que a decisão foi motivada pela “exclusão arbitrária” de dois
pesquisadores da lista de homenageados, fato este que causou “indignação e
repúdio” da classe científica.
Acontece que o presidente do país houve por bem retirar
da lista os nomes de um pesquisador da Fiocruz e da diretora da Fiocruz
Amazônia, sob o argumento de que eles divergiram do chefe do Executivo, quanto
à orientação sobre o protocolo mínimo ministrado contra a Covid-19.
Os
cientistas renunciantes alegaram que “Tal exclusão, inaceitável sob todos os
aspectos, torna-se ainda mais condenável por ter ocorrido em menos de 48 horas
após a publicação inicial, em mais uma clara demonstração de perseguição a
cientistas, configurando um novo passo do sistemático ataque à ciência e tecnologia
por parte do governo vigente”.
Os
cientistas seguem afirmando não compactuar com “a forma pela qual o
negacionismo em geral, as perseguições a colegas cientistas e os recentes
cortes nos orçamentos federais para a ciência e tecnologia têm sido utilizados
como ferramentas para fazer retroceder os importantes progressos alcançados
pela comunidade científica brasileira nas últimas décadas”.
O
grupo de cientista reitera que a renúncia coletiva os entristece, mas expressa
sua “indignação frente ao processo de destruição do sistema universitário e
de ciência e tecnologia”.
A
Ordem Nacional do Mérito Científico é uma das mais altas honrarias concedidas
pelo poder público a personalidades nacionais e estrangeiras, como forma de
reconhecimento à importante contribuição prestada por eles ao desenvolvimento
da ciência e da tecnologia, no Brasil, desde a sua criação, em 1993.
A
indicação dos agraciados é realizada por comissão formada por três membros
indicados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, três indicados pela
Academia Brasileira de Ciências e três indicados pela Sociedade Brasileira para
o Progresso da Ciência (SBPC), tendo por objetivo à premiação simbólica pelos
bons serviços prestados nessas áreas, que são da maior importância para o
progresso do país.
Os
cientistas argumentaram que “Nossos nomes foram honrosamente indicados por
essa comissão, reunida em 2019. O mérito científico (como não poderia deixar de
ser) foi o único parâmetro considerado para a inclusão de um nome na lista.”.
Em
que pese eles dizerem que foram “honrados” por ganharem “um dos
maiores reconhecimentos que um cientista pode receber em nosso país”, mesmo
assim eles destacam que “a homenagem oferecida por um governo federal que
não apenas ignora a ciência, mas ativamente boicota as recomendações da
epidemiologia e da saúde coletiva, não é condizente com nossas trajetórias
científicas”.
Diante
dos justos argumentos, os cientistas decidiram nestes termos: “Em
solidariedade aos colegas que foram sumariamente excluídos da lista de agraciados,
e condizentes com nossa postura ética, renunciamos coletivamente a essa
indicação”.
À
toda evidência, a exclusão de cientistas da lista dos agraciados, por motivo
absolutamente discricionário, na essência, por discordância de posição diretamente
relacionada com a ciência, causa verdadeira indignação, não somente da classe
científica, mas também da sociedade, exatamente por se tratar de medida que contraria
frontalmente o princípio democrático de poder se divergir não somente do
pensamento ideológico como também científico, que precisa ser respeitado,
considerando que os assuntos precisam ser compreendidos cada qual nas suas
instâncias, em razão, em especial, dos aspectos da racionalidade e da
civilidade.
A
propósito, em termos de justiça à concessão da comenda de que se trata, não
poderia haver maior ilicitude, barbaridade, em cristalina indignidade
científica, quando o presidente da República se autoconcedeu a mesma medalha,
só que no grau mais elevado atribuído à honraria de grão-mestre, logo a quem
conseguiu demonstrar, no quotidiano, ser pessoa que contribuiu efetivamente
para o merecimento da medalha do anticientista militante, pelo tanto de peripécias
protagonizadas por ele, visivelmente contrárias aos verdadeiros princípios da
ciência e da tecnologia.
Neste
imbróglio, fica evidenciado o quanto o governo somente contribui para desprezar
o importante valor intrínseco da ciência e da tecnologia, quando prestigia quem
não faz por merecer o reconhecimento e pune exatamente quem muito fez para
fazer jus ao prêmio e isso fica muito claro nesses dois lamentáveis casos, que
o bom senso recomendaria que nenhum nem outro tivesse acontecido, para o bem
não somente da compreensão científica, mas também da racionalidade e da
civilidade.
Tudo
isso, sem contar com o descabimento do corte do orçamento próprio da ciência e
tecnologia, em valor significativamente que impede a continuidade dos trabalhos
de incumbência do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que, ao
contrário, é órgão que tem o menor aporte de verba para a implementação dos seus
trabalhos, de suma importância e imprescindibilidade ao progresso do Brasil.
A
verdade é que o governo tem contra si a unanimidade dos cientistas e produtores
de ciência e da cultura e isso se traduz em ambiente pior possível, no que diz
respeito à busca dos objetivos favoráveis ao desenvolvimento da nação, ante a
clara manifestação de desprezo à luminosidade da classe intelectual, que é da
maior importância para a nação com a grandeza do Brasil, que tem carência de
estudos e pesquisas vindos desse segmento especializado.
Diante
do exposto, os brasileiros honrados expressam repúdio às medidas visivelmente
dissonantes dos critérios de justiça aos verdadeiros princípios do
reconhecimento ao mérito, sob a avaliação de que a única maneira de valorização
desse segmento é o real reconhecimento, por parte do governo, apenas daqueles que
efetivamente contribuíram com o seu esforço para o engrandecimento dos estudos diretamente
relacionados com a aplicação da ciência e da tecnologia.
Brasília,
em 12 de novembro de 2021
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