segunda-feira, 8 de setembro de 2014

A República da indignidade

Segundo reportagem publicada pela revista Veja, um ministro do Tribunal de Contas da União – TCU, que à época presidia a corte, trocou mensagens entre a então secretária executiva da Casa Civil da Presidência da República, chefiada na ocasião pela atual presidente da República. A aludida reportagem tratava de pedido da ajuda dela para o seu uso de influência junto a políticos importantes, com vistas à indicação da mulher dele para o cargo de ministra do Superior Tribunal de Justiça - STJ. A revista mostra que a servidora se comprometia, em mensagem, a pedir apoio a parlamentares e ministros para ajudar na aprovação da indicação em causa. Embora a nomeação não tivesse sido exitosa, em 2008, época das mensagens, ainda assim, o ministro agradeceu gentilmente o esforço da então ministra da Casa Civil e da sua secretária executiva, dizendo em mensagem que "Não tenho palavras para a ministra Dilma. Eu sei bem a quem devo por estar no jogo". Somente em 2010, ainda no governo do petista, a mulher do ministro foi nomeada, quando a Casa Civil já estava sendo chefiada pela referida secretária executiva, que substituiu a presidente da República. Na mesma reportagem, a revista mostra que o ministro do TCU tentou atrapalhar as investigações sobre a hoje presidente da República e a então ministra da Casa Civil, na CPI dos cartões corporativos, conforme evidencia mensagem para esta, dizendo que ele esteve com a presidente da CPI e que "Ela quer os documentos e processos do TCU. Informei, por terceiros, que só os remeteria se aprovado o requerimento na comissão. Ela parece furiosa conosco". Diante da gravidade das aludidas denúncias, a ONG Contas Abertas entrou com representação junto ao TCU, sob a alegação de que seus ministros têm o dever constitucional e legal de exercer seus cargos com absoluta isenção, para não comprometer a credibilidade das decisões da corte de contas. As Associações do Ministério Público de Contas e dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas solicitaram rigorosa apuração sobre os fatos trazidos à lume. Em consequência das denúncias, a Corregedoria do Tribunal de Contas da União resolveu investigá-las, por entender que há evidência de tráfico de influência na Casa Civil, durante o governo do petista, envolvendo interesse do ministro do TCU, que, agora, nega interferência na indicação da sua mulher para o STJ. A ministra do STJ não quis comentar o caso. A ex-ministra da Casa Civil não foi localizada e a assessoria da presidente do país declarou que ela não pretende se manifestar sobre o caso em apreço. Trata-se de verdadeiro caso de promiscuidade na administração pública, envolvendo autoridades inescrupulosas do alto escalão da República, que não têm o menor pudor para a traficância de influência envolvendo indecente troca de favores entre servidores públicos, para benefícios mútuos, consistentes na aprovação da indicação da mulher do ministro do TCU e na participação deste em manobras para se evitar que documentos da corte fossem enviados à CPI do Congresso Nacional. No caso da ministra da Casa Civil, a sua atuação nesse imbróglio não constitui a menor surpresa, porque se trata de mera reiteração de tráfico de influência promovido por ela, em favor de seu filho, que montou escritório dentro do Palácio do Planalto para receber clientes indicados por ela, que era a poderosa ministra, cujo escândalo causou apenas a sua exoneração do cargo, sem ser importunada mais nenhum crime. Agora é absolutamente inadmissível que o ministro do TCU se envolva em crime de tráfico de influência, à vista de ele ter a incumbência constitucional de exercer com responsabilidade, lisura e conduta ilibada a fiscalização dos atos da administração pública, com absoluta isenção, imparcialidade e justiça, jamais podendo se envolver em ato com capacidade para desqualificar a sua condição ética e moral de fiscalizar as despesas públicas e de julgar as contas dos gestores da República. Não há dúvida de que essa pouca-vergonha é mero reflexo do paradoxo ideológico do que foi prometido antes da assunção do governo ao poder, por mostrar que essa prática nada mais é do que a degeneração dos conceitos éticos e morais, com a constância de atos de corrupção (mensalão, operação Lava Jato, quebra da Petrobras...), do fisiologismo político, das questionáveis alianças de governabilidade, das deficiências da prestação dos serviços públicos (inexistência de segurança pública, sucateamento do sistema de saúde pública, má qualidade do ensino público, carência de investimentos em saneamento básico e infraestrutura etc.), da incompetência nas políticas econômicas (decepcionantes desempenho dos indicadores econômicos), do arcaico e pernicioso sistema político-partidário, da falta de prioridades para a reforma das estruturas do Estado, entre tantas precariedades e deficiências que não condizem com os anseios de moralização e de modernização dos costumes e dos princípios que poderiam contribuir para o efetivo desenvolvimento do país. Os fatos demonstram que a indecente troca de favores e o tráfico de influência já se tornaram indigna moeda corrente na República, sendo comum essa prática entre os poderes, cujas autoridades se corrompem à luz do dia, em vergonhoso menosprezo aos princípios da honestidade, da moralidade, da legalidade e do decoro. É induvidoso que autoridades da República não tenham o menor pudor de perder a compostura, pois se prostituem em defesa de causas pessoais, como no caso em comento, sem ao menos se envergonharem das sujeiras de seus atos, que são proporcionais ao tamanho dos cargos que ocupam por ocasião da indignidade. À toda evidência, as indicações para cargos de Tribunais Superiores já demonstraram a sua forma deletéria aos princípios do mérito e da qualificação técnico-especializada, para se confundir com mera troca de favores e tráfico de influência, com a contribuição do espúrio compadrio, em contraposição aos consagrados conceitos de ética, moralidade e legalidade. A sociedade precisa repudiar, com urgência, os reiterados casos de desmoralização dos princípios da honestidade, do decoro e da dignidade, a par de exigir que os envolvidos sejam responsabilizados, na forma da lei, e os homens públicos omissos quanto ao cumprimento do seu dever constitucional de moralidade, decoro e honestidade sejam devidamente penalizados, inclusive com a perda dos cargos, como forma de moralização e dignificação da administração pública. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 07 de setembro de 2014

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