sábado, 13 de setembro de 2014

Indisfarçável blindagem

 
O presidente do Tribunal de Contas da União disse que ia investigar a transferência de bens da presidente da Petrobras para seus dois filhos. Esse fato despertou o interesse da corte de contas depois que houve o vazamento de informação acerca da cessão dos imóveis enquanto havia o julgamento sobre a indisponibilidade dos bens da executiva, que é alvo de processo pertinente à responsabilidade na compra da refinaria de Pasadena, no Texas, considerada prejudicial aos cofres da estatal pelo mencionado tribunal. A Petrobras afirmou que a transferência dos bens em apreço estava sendo preparada desde o ano passado, cuja transação não tem relação com o referido processo. Em defesa da executiva, as autoridades governistas disseram que não existe irregularidade nesse fato. O vice-presidente da República afirmou que “Sob o foco jurídico, é a coisa mais natural que acontece. A ideia é essa: houve uma doação com usufruto. Todo mundo faz doação com usufruto enquanto viver. (Só) depois, é que essa doação se concretiza. Pelo que li nos jornais, a doação foi feita bem antes, pelos idos de março. Portanto antes da primeira decisão do TCU. Não houve ilegalidade nenhuma. É a coisa mais comum fazer doações. Agora, sobre qual é a razão para ela doar, essa é uma questão subjetiva”. Por sua vez, a presidente do país também reiterou enfática defesa da presidente da Petrobras, afirmando que "A presidente Graça Foster respondeu perfeitamente sobre a questão dos seus bens numa nota oficial. Eu repudio completamente a tentativa de fazer com que a Graça Foster se torne uma pessoa que não pode exercer a presidência da Petrobras. Sabe por quê? Porque, se fizerem isso, é pelos méritos dela... Eu lamento profundamente a tentativa, a cada eleição, de primeiro se fazer uma CPI da Petrobras; de segundo, criar esse tipo de problema". A presidente questionou o motivo de problemas na gestão anterior da Petrobras, durante o governo tucano, não terem sido alvo de investigações, insinuando com isso que, se houve erro no governo da oposição, por qual razão não pode haver falha na sua gestão, como se desacerto no governo anterior tivesse o condão de respaldar ad eternum as irregularidades futuras, que também não precisariam ser investigadas? Essa mentalidade limitada e estreita precisa, com urgência, ser mudada, desenvolvida e despertada para a realidade e a modernidade dos novos tempos, em que os governantes não podem, a seu talante, abdicar da sua incumbência constitucional e legal de administrar com competência, lisura e dignidade o patrimônio público. Eles também precisam perceber que é da sua incumbência o controle e o eficiente funcionamento da administração pública, tendo o dever de instituir e manter sistemas de controle e fiscalização capazes de evitar desvios de recursos públicos, sob pena de incorrer em crime de responsabilidade, por deixar de reconhecer e de assumir integralmente os deveres institucionais da sua gestão, que são inconfundíveis e intransferíveis. Com absoluta certeza, os governistas, na condição de oposicionistas, nesse caso, fariam verdadeiro escarcéu, porque eles iriam arranjar terríveis argumentos para incriminar e condenar os procedimentos, que poderiam ser promovidos a qualquer tempo, menos no momento em que se discute a indisponibilidade de bens de executiva com possível envolvimento em transação fraudulenta. No entanto, no caso vertente, ninguém do governo estranha que haja doação de imóveis quando a direção da Petrobras se encontra no olho do furação, em razão da possível trapalhada envolvendo a compra da refinaria sucateada de Pasadena, a preços exorbitantes e fora de mercado, que teria motivado gigantesco prejuízo aos cofres da estatal e aos brasileiros. As veementes defesas da dirigente da empresa, pelas autoridades máximas do país, além de causarem enorme perplexidade, pela demonstração da indevida e injustificável interferência na autonomia do Tribunal de Contas da União, como se ele não tivesse discernimento nem competência para fazer juízo sobre as irregularidades com recursos públicos, tiveram indisfarçável intenção de blindar a executiva de qualquer culpa ou responsabilidade. Não obstante, as pressões do Executivo resultaram em decisão favorável à presidente da estatal. Convém que não somente a competência constitucional e legal do Tribunal de Contas da União seja fielmente respeitada pelas autoridades da República, mas também das demais instituições públicas do país, como forma de aperfeiçoamento e aprimoramento dos princípios democrático e republicano, em consonância com a modernidade inspirada nos países desenvolvidos, social, político, econômico e democraticamente. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 12 de setembro de 2014

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