O Ministério Público Federal abriu inquérito civil
para investigar os últimos quatro ex-presidentes da República, por "possível apropriação indevida de bens
públicos", os quais já foram citados para se defender, à exceção de um
que já se encontra falecido, que será representado por seu espólio.
Eles estão sendo intimados para dizer se levaram dos
Palácios do Planalto e da Alvorada, ao fim de seus mandatos, objetos "entregues por Estados estrangeiros em
encontros diplomáticos e outros de natureza pública e institucional",
que pertencem "à República
Federativa do Brasil". Ou seja, eles devem dizer de levaram dos
palácios de Brasília bens que não lhes pertencem de direito.
Inicialmente, o inquérito foi aberto contra o
ex-presidente petista, mas os advogados dele alegaram que a Lei nº 8.394/91 estabelece
que "documentos que constituem o
acervo presidencial privado são de
propriedade do presidente da República, inclusive para fins de herança, doação
ou venda". Ao fim de cada governo, esses bens são catalogados, embrulhados
e entregues ao ex-mandatário, para que ele os preserve em outro lugar, ou seja,
os bens que devem ser levados dos palácios são somente os de propriedade privada
e jamais aqueles vinculados ao Estado, que, legalmente, pertencem à União.
Como não poderia ser diferente, à vista da
dificuldade de assumir seus erros, o petista alegou na sua defesa, naturalmente
como álibi para seus atos, que outros ex-presidentes da República também
levaram objetos que ganharam em seus mandatos para casa ou para seus respectivos
institutos.
Nesse ponto, demonstrando pura esperteza, o petista
assume que teria levado para sua casa bens públicos, quando alega que outros presidentes
também levaram.
Com base nesse argumento, que naturalmente o levou
a considerar normal tal procedimento, que é notoriamente irregular e
reprovável, ele pediu o arquivamento da ação, com o respaldo em atos de igual
ilegitimidade praticados por outros ex-presidentes, o que juridicamente não é
correto.
Todavia, em face da alcaguetagem presidencial, ao
invés de acolher o pedido de arquivamento da ação em causa, os procuradores
estenderam a investigação para os ex-presidentes que exerceram mandatos depois
de 1991, quando a lei dos arquivos públicos foi editada.
Desde logo, o instituto do ex-presidente do PSDB já
disse que a desocupação dos palácios pelo tucano seguiu as regras estabelecidas
na lei de acervos presidenciais.
À
época da desocupação dos Palácios da Alvorada e do Planalto pelo petista, a
imprensa noticiou que foram carregados 11 caminhões de mudança, tipo baú com os
pertences dele, com objetos em uso nesses locais - inclusive o crucifixo que
ficava na parede atrás do assento do presidente, no Palácio do Planalto - e outros
oriundos de presentes da diplomacia presidencial. Falava-se que um dos
caminhões era equipado com refrigeração.
É
lamentável que o petista não tivesse tido a sensibilidade para esclarecer e
justificar seu possível ato de ter levado, de forma indevida, objetos
pertencentes à União, preferindo envolver também seus pares, como tentativa
para se livrar da ilegitimidade praticada, ou seja, não ficou nada elegante ele
atribuir a culpa de seu erro a outrem e o pior é que possivelmente os demais
ex-presidentes não tenham agido com idêntico desvio de conduta.
Causa
perplexidade que homens públicos ainda tenham o sentimento de ser normal a prática
de algo errado simplesmente porque tal ilicitude tenha sido praticada por
outras pessoas, como se isso fosse padrão normal a ser seguido, ficando
devidamente justificado o desvio de conduta em razão de semelhante procedimento
por terceiros, ou seja, a reincidência de ilicitudes, na concepção de ex-presidente,
passa, então, a regra para a sociedade, conforme a ilação do presente caso.
Não
há dúvida de que o petista foi absolutamente mal assessorado por seus
advogados, que, por certo, entenderam que a mera inclusão de outras pessoas no caso
em referência teria o condão de justificar possível ato inquinado de ilícito,
quando, na verdade, isso contribui para piorar a situação do ex-presidente, no caso
de os outros ex-presidentes demonstrarem lisura nos seus procedimentos, em
seguimento às regras da civilidade que todo homem público deve observar com
relação ao patrimônio dos brasileiros, com a devida legitimidade e
transparência.
E inacreditável que alguém que tenha ocupado cargo
tão relevante, como o de presidente da República, possa ter sido sequer
orientado para evitar levar dos palácios, junto com os seus pertences, bens
públicos que são de propriedade dos brasileiros, inclusive correndo o risco de
devolvê-los e promover o ressarcimento, no caso de gêneros consumíveis e de
pouca duração ou validade, como bebidas e alimentos, à vista da possibilidade
do uso de veículo com refrigeração, para transportá-los.
Convém
que o inquérito em tela sirva de ensinamento para os homens públicos, no
sentido de ser possível mostrar para eles a conveniência do entendimento sobre
a necessidade do rigoroso respeito aos limites entre o público e o privado, à
vista da compreensão jurídica que delimita caso a caso.
É
evidente que nos países sérios e evoluídos, os ex-presidentes têm absoluta
consciência sobre os seus direitos e deveres e jamais eles levariam consigo
objetos que pertencem à União, pois sabem que a sociedade não admite o desvio
de conduta dessa natureza, de tal modo que a punição é rigorosa para deslize
dessa ordem.
Caso seja confirmado que houve a apoderação de bens
públicos por ex-presidente da República, esse fato é capaz de causar enorme
sentimento de revolta da sociedade, pela confirmação de que houve dilapidação
de bens públicos justamente por quem tem o dever de ser modelo de dignidade e
de cumpridor das normas constitucionais e legais, nos termos do seu juramento
no ato de posse, perante a nação.
Convém que o Ministério Público
Federal seja fiel aos termos da legislação de regência e conclua o inquérito em
apreço exatamente retratando a realidade dos fatos, não permitindo que manobras
interfiram nas investigações para prejudicar a elucidação
dos fatos, de modo que a verdade prevaleça e, se for o caso, os culpados possam
responder por seus atos, inclusive promover a reparação dos prejuízos causados
ao erário. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 30 de outubro de 2015
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