segunda-feira, 28 de novembro de 2016

A fragilidade do controle

O juiz federal de Curitiba, responsável pelos processos da Operação Lava-Jato na primeira instância, concedeu à Secretário de Administração da Secretaria da Presidência da República, em atendimento a pedido formulado por ela, mais 30 dias para que esse órgão examine a legalidade da incorporação dos bens levados dos Palácios do Planalto e da Alvorada, pelo ex-presidente da República petista.
O novo prazo tem o objetivo de avaliar se os presentes recebidos ao longo do mandato do ex-presidente foram regularmente incorporados ao patrimônio do político, ao invés de ficar com a União, por serem objetos recebidos no exercício de cargo público, à vista da legislação aplicável à espécie. 
O pedido de análise foi feito dentro de um dos inquéritos que tramitam contra o petista, na primeira instância, embora os advogados do ex-presidente tivessem afirmado, à época do primeiro prazo, que o juiz não tem jurisdição sobre o acervo em questão.
Os advogados disseram também, à época, que "A decisão agora proferida – determinando a avaliação do acervo – é mais um exemplo dos excessos cometidos por Moro em relação a Lula e reforça a sua suspeição para qualquer julgamento envolvendo o ex-Presidente", embora a questionada decisão tenha sido adotada em atendimento a pedido do Ministério Público Federal.
Eles afirmaram ainda que “A seletividade de Moro também confirma sua parcialidade. Moro não atua como juiz em relação a Lula, mas, sim, como implacável acusador que quer condená-lo a qualquer custo, para interferir no cenário político-eleitoral de 2018".
Os bens em apreço estavam guardados em um cofre do Banco do Brasil, em São Paulo, por cinco anos, sem qualquer custo, sob a alegação de que eram bens pertencentes à Presidência da República, embora eles estejam sob a responsabilidade do ex-presidente
A força-tarefa da Operação Lava-Jato afirmou, no princípio de setembro, que relatório de Fiscalização do Tribunal de Contas da União indicou que somente 1,58% dos itens recebidos pelo ex-presidente, durante seus dois mandatos, foram incorporados ao patrimônio da União.
Segundo os dados levantados pelo TCU, foram recebidos 568 itens, mas apenas nove se destinaram ao patrimônio da União.
O relatório destaca a existência de "fragilidade" para se caracterizar os presentes e, por isso, em consonância com os princípios da moralidade, legitimidade e razoabilidade, todos devem ser públicos.
Ainda consta do citado relatório que “Desse modo, mais razoável é que os presentes nesta condição recebidos (excluídos os de consumo, por sua própria natureza depreciativa, e os de caráter personalizado) façam parte do patrimônio da União e, não da pessoa física que, naquele momento, a representa oficialmente”.
Na tentativa de tirar da competência de apreciar a legitimidade da retirada dos bens em tela, os advogados do ex-presidente alegaram que “O acervo presidencial entregue a Lula ao final do seu segundo mandato observou as disposições da lei 8.394/91, exatamente como ocorreu em relação aos ex-Presidentes da República que o antecederam.”.
Não obstante, a aludida citação não corresponde à realidade, porque a norma legal invocada tem redação claríssima, ao se referir exclusivamente sobre a classificação, os cuidados e a exposição tão somente de “documentos” do acervo referente ao período compreendido à gestão presidencial, não tratando, em absoluto, sobre “bens patrimoniais”, que é o caso sob exame, dando a entender que a defesa tenta distorcer a real interpretação sobre a disposição constante da citada lei, possivelmente na tentativa de dar amparo legal indiscutivelmente inexistente, no caso.
Por seu turno, os demais presidentes que antecederam o petista já alegaram que, em momento algum, levaram consigo bens recebidos na forma de presente.
Se a defesa do ex-presidente tem certeza sobre a legitimidade da retirada de bens da Presidência da República, então por que tanta indignação contra o juiz, que apenas cumpre o seu dever funcional?
Convém que os fatos sejam investigados normalmente, tal qual como se procede nos países sérios e civilizados, onde os homens públicos se colocam à disposição das autoridades, nos casos de investigação, e fazem questão de prestar contas sobre seus atos públicos.
Caso as suspeitas sobre desvio de finalidade não se confirmem, então o ex-presidente tem todo direito de demandar ação na Justiça por calúnia ou coisa que a valha contra atos arbitrários, mas é estranho que ele resista às investigações, dando a entender que seus atos não devam ser investigados e que ele está acima da lei, em condições de intocabilidade e de incensurável, diante de fatos que suscitam enorme interesse da sociedade, à vista do envolvimento de bens que podem realmente pertencer ao patrimônio da União.
Convém que, em atenção aos princípios constitucionais da transparência e da legalidade, o ex-presidente tenha a sensibilidade democrática e de cidadania de atender aos apelos que se impõem no caso em apreço, no que se refere à normal apuração sobre a licitude quanto à retirada de bens dos Palácios do Planalto e da Alvorada, à vista da dignidade ínsita da liturgia do cargo de presidente da República. Acorda, Brasil! 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 28 de novembro de 2016

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