segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Conflito de interesses

O ministro da Secretaria de Governo foi acusado pelo ex-ministro da Cultura de pressioná-lo para liberar a construção de um edifício em Salvador, empreendimento condenado pelo Iphan, por não respeitar o padrão de construção para a região histórica da cidade, mas isso não deveria motivo para obstáculo para o assessor presidencial, porque ele tem ali bela unidade, com vistas para as belezas naturais.
Em razão desse episódio, o Palácio do Planalto, como não poderia ser diferente, foi colocado, mais uma vez, no olho do furacão, por obra e graça da trapalhada praticada pelo ministro de Governo, que teria até ameaçar de exoneração a presidente daquele órgão, caso o empreendimento não fosse aprovado.
Diante da repercussão bastante negativa do caso, inclusive no Parlamento, o ministro se reuniu com o presidente do país, para discutir a sua permanência ou não no governo.
Segundo o ministro, “A conversa foi tranquila” com o presidente, que teria dado apoio à sua atitude, inclusive se comprometendo a fazer pronunciamento a favor dele, além de assegurar a sua permanência no cargo, dando a entender que a grave irregularidade não tem a menor importância contra a dignidade do governo.
O ministro disse ainda que teria ligado “... para o presidente da Comissão de Ética e pedi para que fosse revista a iniciativa de adiar a decisão sobre o processo. Vamos fazer isso logo”.
Após ouvir o apelo do ministro, a referida a comissão decidiu abrir processo contra ele, para apurar os fatos pertinentes à sua conduta, sendo que o presidente da comissão já se manifestou, com a maior clareza, pelo enquadramento dele em crimes contra a administração pública, em razão da sua atitude nada republicana.
É de se lamentar que o presidente da República não tivesse a necessária sensibilidade para compreender a real gravidade da situação política decorrente do desgaste protagonizado pelo ministro responsável por sua articulação política, uma vez que a terrível pressão contra outro ministro, para a adoção de medida favorável ao interesse dele, demonstra clara afronta aos princípios da ética, moralidade e dignidade, que jamais deveriam se afastar da administração pública.
A afirmação de que a conversa entre o ministro opressor e o presidente do país foi "tranquila" só evidencia a injustificável falta de escrúpulo do governo de lidar com situações que ferem os princípios democrático e republicano, uma vez que a atitude do ministro é indiscutivelmente reprovável, por aconselhar o seu imediato afastamento do governo, como forma de preservação do princípio da moralidade.
Não há dúvida de que o ministro teve comportamento visivelmente contrário à liturgia de importante cargo da República, porquanto ele tem o dever, sobretudo, de distinguir o público do privado, mas, ao contrário, ele agiu com a ingenuidade de se expor perigosamente, ao defender com unhas e dentes a defesa de seus interesses, conforme ele mesmo confirma a interlocução com o ex-ministro, que não suportou a devastadora pressão para que a decisão do Iphan fosse revertida em favor dele.
O ministro alega que não teria pressionado ninguém, conquanto a sua intenção foi de tão somente argumentar sobre as melhores intenções de que a interdição da obra poderia prejudicar a segurança jurídica dos compradores dos imóveis em questão e comprometer ainda mais o emprego no país.
Na verdade, a preocupação do ministro era defender a continuidade do projeto imobiliário, no qual ele é proprietário de uma unidade que ficaria justamente na parte condenada pelo órgão do Ministério da Cultura, deixando visível o conflito de interesses.
É lamentável que o presidente do país tenha fechado os olhos para mais um caso deplorável que ocorre no seu governo, tendo contribuído ainda para a banalização de fato gravíssimo, que afeta diretamente o restabelecimento da moralidade que tanto é ansiada pelos brasileiros, que não admitem mais fraqueza do governo, com relação às explícitas práticas de abuso de poder, em proveito de autoridades públicas inescrupulosas. Acorda, Brasil! 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 21 de novembro de 2016

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