terça-feira, 15 de novembro de 2016

Reformulação do sistema carcerário

Segundo a mídia, a Holanda registrava, há dez anos, uma das maiores populações carcerárias da Europa, mas esse quadro se transformou de forma positiva, na atualidade, com a proporção de 57 pessoas presas em cada 100 mil habitantes, em comparação com 148 por 100 mil no Reino Unido e 193 no Brasil, que padece da crônica superpopulação carcerária, em presídios superlotados, comparáveis a verdadeiros infernos terrestres.
Quase todos os países do mundo se debatem com insuperáveis problemas de superlotação no sistema carcerário, mas aquele país se encontra em estágio bastante avançado de superação dessa drástica situação, ou seja, lá há escassez de criminosos para trancafiar, a exemplo do fechamento, nos últimos anos, de 19 prisões e outras deverão ser desativadas no próximo ano, em obediência ao decréscimo acentuado da população carcerária.
O diferencial para se alcançar esse avançado estágio de mentalidade carcerária está na forma como o condenado é tratado, levando-se em conta o verdadeiro sentido prisional, que tem por essência o cumprimento da pena e a recuperação do ser humano que cometeu crime contra a sociedade.
Um diretor do sistema carcerário afirmou que "Aqui na Holanda, nós olhamos para o indivíduo. Se alguém tem um problema com drogas, tratamos o vício. Se é agressivo, providenciamos gestão da raiva. Se tem dívidas, oferecemos consultoria de finanças. Tentamos remover o que realmente causou seu crime. É claro que o detento ou a detenta precisam querer mudar, mas nosso método tem sido bastante eficaz.".
O diretor disse ainda que alguns reincidentes no crime normalmente recebem sentenças de dois anos e programas personalizados de reabilitação e menos de 10% voltam à prisão, enquanto, em países como Reino Unido e EUA, cerca de 50% dos detentos que cumprem pequenas penas voltam a ser presos nos primeiros dois anos, após a libertação. Nas mesmas condições, no Brasil, estudos revelam que a taxa geral de reincidência chega até 70%.
O diretor deu o exemplo de uma prisão de segurança máxima que se encontra localizada em área com bastante espaço, cujo pátio tem a dimensão de quatro campos de futebol, onde têm carvalhos, mesas de piquenique e redes de vôlei, permitindo que o ar fresco da região possa contribuir para reduzir o estresse tanto dos detentos quanto dos guardas.
Nesses locais, os detentos podem andar "à vontade por áreas comuns como biblioteca, departamento médico e cantina, e essa autonomia os ajuda na readaptação à vida em liberdade.”.
Não obstante, os bem executados modelos de programas de reabilitação não são a única razão para o sensível declínio de 43% no número de pessoas atrás das grades naquele país, que registrava 14.468 detentos, em 2005, tendo alcançado vertiginosa queda para 8.245 presos, em 2015.
O pique da população carcerária verificado em 2005 foi expressivamente contribuído depois da implantação do aumento e do aperfeiçoamento da segurança no principal aeroporto de Amsterdã, tendo como consequência a gigantesca quantidade de prisão de "mulas", que traficavam entorpecentes proibidos.
Já especialistas entendem que houve mudança das prioridades do policiamento, ou seja, “Eles mudaram o foco das drogas para concentrar esforços no combate ao tráfico humano e ao terrorismo".
Também contribuíram para a diminuição da população carcerária as modalidades de penas aplicadas aos criminosos, por meio de penalidades alternativas à prisão, a exemplo de trabalhos comunitários, multas e monitoramento eletrônico, ficando dispensado o encarceramento de pessoas.
A diretora do serviço penitenciário da Holanda disse que o encarceramento se tornou regra aplicável para os casos envolvendo criminosos de alta periculosidade ou para detentos em situação vulnerável, que podem se beneficiar dos programas disponíveis, com vistas à sua recuperação social.
Ela disse que "Às vezes é melhor que pessoas fiquem em seus empregos e suas famílias, e que cumpram a pena de outra forma. Como temos penas mais curtas e uma taxa de criminalidade em queda, isso está levando a celas vazias".
Naquele país, as prisões desativadas estão sendo convertidas em centros de triagem para refugiados, que se traduzem em oportunidade de trabalho para guardas que perderam o emprego. Mas uma unidade nas imediações de Amsterdã foi convertida em um hotel de luxo.
Aproveitando o esvaziamento de presídios, o governo holandês passou a alugar as celas ociosas para prisioneiros de países com problemas de superlotação carcerária, como os vizinhos Bélgica e Noruega.
Nesses casos, os guardas são holandeses, mas o sistema penal norueguês é mais liberal que o holandês, porque os prisioneiros da Noruega têm a liberdade para dar entrevistas e assistir aos DVDs que quiserem, entre outras liberalidades, sob o império do princípio básico da normalização, ou seja, o de que a vida na prisão deve ser o máximo possível parecida com a do mundo fora dela, justamente para contribuir à reintegração dos presos.
O diretor do sistema carcerário disse que "Fazemos as coisas de maneiras diferentes. Aqui (na Holanda), tomamos ações disciplinares assim que um prisioneiro quebra as regras, ao passo que os noruegueses primeiro abrem inquérito e depois tomam providências. Esse estilo confundiu os guardas no começo. Mas, no geral, compartilhamos os mesmos valores básicos sobre como administrar uma prisão".
Trata-se, como se vê, de questão que demanda, em muito, a vontade política para que o sistema carcerário funcione com eficiência e possa corresponder exatamente às expectativas que dele se espera, que é a recuperação e reintegração do criminoso na sociedade, como pessoa capaz de contribuir para o bem comum.
Os países que conseguiram diminuir a população carcerária tiveram a dignidade de equacionar os problemas prisionais e a decência de implantar as medidas necessárias à sua solução, por meio de métodos atualizados de tratamento e compreensão com as pessoas fragilizadas pela sua condição de delinquente, que normalmente não passam de verdadeiras párias da sociedade.
A realidade mostra que ninguém, muito menos as autoridades públicas incumbidas de cuidar e zelar pelo sistema carcerário, demonstra o menor esforço para mudar esse quadro degradante que é imposto nos presidiários tupiniquins, que são jogados às verdadeiras masmorras medievais, quando não são piores ainda, porque elas são normalmente infectas, superlotadas e ainda recebem cruéis, terríveis e generalizados desprezos, motivando constantes e naturais rebeliões diante dos tratamentos indignos e desumanos.
Em que pese o volumoso dispêndio com os presos, bem superior em relação ao gasto com educação, em caso específico, conforme denunciou a presidente do Supremo Tribunal Federal, o governo não esboça nenhuma iniciativa com vistas a estudar, tendo por base brilhantes medidas implantadas em países desenvolvidos, com vistas a solucionar, ou atém mesmo minimizar, a gravíssima situação do sistema penitenciário brasileiro, que se traduz em vergonhosa pobreza em termos de humanização, que ainda tem o condão de animalizar cada vez mais as pessoas encarceradas, diante do tratamento desumano que ali é dispensado pelo Estado.
Urge que o arcaico e obsoleto sistema carcerário brasileira passe por completa reformulação, mediante os indispensáveis aperfeiçoamento e modernização que se impõem, à vista das conquistas da humanidade, que exigem que as pessoas sejam tradadas com dignidade, respeito e humanidade, sob o princípio de que a degradação das pessoas trancafiadas nas masmorras tupiniquins, nas condições atuais, somente contribui para destruir moral e psicologicamente ainda mais o verdadeiro sentido de ser humano, cujo trauma pode servir para a consolidação do ímpeto natural de delinquência. Acorda, Brasil! 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 15 de novembro de 2016

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