quarta-feira, 19 de abril de 2017

Índole antipatriótica

O presidente da República, em reunião com auxiliares, determinou o destravamento de nomeações de cargos no governo, com vistas a atender, pasmem, pleitos de cerca de 40 deputados da base aliada, em troca de votos favoráveis à reforma da Previdência.
É vergonhoso se saber que o atendimento dos pleitos dos inescrupulosos congressistas encerra imposição por parte daqueles contrários ao projeto do governo, que havia reivindicado ao Palácio do Planalto nomeação de afilhados para órgãos do governo, os quais não tinham sido atendidos, mas agora, com a liberação das nomeações, os referidos aproveitadores da coisa pública passam a ser favoráveis à aprovação, com a garantia de seus votos.
Para tanto, o governo já começou o desbloqueio de indicações para a Polícia Rodoviária Federal e prometeu solucionar imediatamente outras pendências nas estruturas estaduais de órgãos e entidades vinculadas à União, exatamente para satisfazer às exigências de parlamentares.
Assessores do presidente avaliam que há necessidade de se dar mais atenção ao chamado "baixo clero", que é integrado por deputados de menor expressão política, porquanto as cúpulas dos partidos já foram devidamente contempladas.
O governo deu a entender que vem agindo de forma preventiva para a aprovação da reforma em apreço, ao cobrar empenho de ministros em suas bancadas, até com ameaça do corte de cargos de "traidores", passando pelo condicionamento do apoio no Congresso à liberação de mais emendas para parlamentares.
A verdade é que não tem sido fácil para o governo sinalizar de forma positiva para o mercado e ainda mostrar que não sofreu grande abalo com os desdobramentos da Lava-Jato, tanto que vem se empenhando para obter placar robusto em duas votações previstas para esta semana na Câmara dos Deputados, quais sejam: a renegociação da dívida dos Estados e a urgência para votação da reforma trabalhista.
É inacreditável que, em pleno século XXI, quando os países já alcançaram dimensões evoluídas, em termos democráticos, o país tupiniquim ainda seja obrigado a conviver com práticas condenáveis e desprezíveis do toma lá, dá cá tão repugnantemente adotadas no governo anterior, que foi afastado justamente por incompetência administrativa e práticas contrárias à Constituição, como as famosas pedaladas fiscais e os esquemas de corrupção. 
Em se tratando de matéria de interesse nacional, não pode haver nada mais humilhante e ridículo do que o presidente do país precisar negociar com parlamentares a concessão de cargos públicos e outras pequenezas semelhantes para aprovação de matéria de interesse nacional, dando a impressão de que se trata de algo que tem o valor da compra da consciência dos congressistas, como se eles não tivessem responsabilidade cívica pelo caso, que diz respeito à competência institucional dos cargos que exercem, que é a aprovação de matérias que realmente precisam de aperfeiçoamento para melhorar o funcionamento da máquina pública, porque, se não fosse assim, não haveria necessidade de absolutamente nada.
Nesse caso, o governo, que se mostra fragilizado e impotente, deveria ter a dignidade de apenas dizer ao Congresso Nacional que o assunto é importante para a melhoria da governabilidade do país, pelos motivos tais e quais, e passar a responsabilidade para o Parlamento votar ou não, conforme a sua consciência cívica, sem necessidade de negociatas ou quaisquer concessões espúrias e sempre imorais e deprimentes para os padrões de civilidade e moralidade que se exigem nos países sérios e desenvolvidos democraticamente.
Nem mesmo nas republiquetas os governos e parlamentares são subservientes com relação à gestão dos recursos públicos, que devem ser empregados exclusivamente em razão do atendimento às causas de interesse público, que não combinam com negociatas com vistas à aprovação de medidas necessárias, quanto mais em se tratando que isso faz parte da função legislativa.
É por essa e outras condutas desprezíveis e repudiáveis, que o Parlamento brasileiro cada mais contribui para mostrar a sua verdadeira índole antipatriótica e interesseira, quando integrantes fazem barganha explícita até para a aprovação de matéria de interesse nacional, como é o caso da reforma da Previdência, que precisa do aperfeiçoamento justamente pela vontade soberana de congressistas que chegam a ter a indignidade de exigir, de forma vergonhosa e imoral, compensação com cargos públicos. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 19 de abril de 2017

Nenhum comentário:

Postar um comentário