segunda-feira, 24 de abril de 2017

Republiqueta?

Está tramitando em caráter de urgência, no Senado Federal, o projeto que visa disciplinar o abuso de autoridade, de autoria de alguns senadores que estão sendo investigados na Operação Lava-Jato e foram denunciados nas delações premiadas dos executivos da Odebrecht, sob suspeita de terem recebido doações por meio do caixa 2.
O referido projeto tem como claríssima diretriz forma de retaliação de políticos aos procuradores e juízes que estão investigando os fatos denunciados, com maior incidência no âmbito de homens públicos, sendo que alguns já são investigados em mais de dezena de casos de recebimento de propina.
É evidente que, não tendo argumentos e muito menos provas para contestar as acusações sobre o recebimento de propinas, muitos congressistas encontraram o jeitinho brasileiro como arranjo para facilitar sua saída desse imbróglio, por meio de projeto de lei que resume medidas capazes de intimidar os procuradores e juízes que os tenham denunciado ou julgado, sob o pretexto de interpretação divergente, em outras instâncias da Justiça, o que poderá levá-los a responder pela reparação do abuso de autoridade. 
Alguns sensatos juristas se insurgiram contra a mediocridade desses parlamentares e elaboraram documento mostrando a dramaticidade do absurdo que eles pretendem implementar, pasmem, em nome do combate ao abuso de autoridade, que pode realmente ter sido cometido tamanha ignomínia, mas em face da revelação da real situação criminosa daqueles que tiveram a indignidade de compactuar com esquemas de corrupção, sendo favorecidos por meio do recebimento de dinheiro sujo.
Os aludidos juristas entregaram moção nos gabinetes dos senadores, contendo manifestação contrária ao malsinado projeto de lei de abuso de autoridade, cujos autores estão intimamente envolvidos em falcatruas, não tendo, por isso, a mínima legitimidade para propor medida sentido, por haver vício de origem, quando a sua principal finalidade objetiva beneficiá-los com a reafirmação da impunidade e do fortalecimento do câncer da corrupção, diante da robusta possiblidade de a sua aprovação não ser mais viável a investigação sobre fatos irregulares, ou seja, os desvios de recursos públicos, popularmente conhecidos por corrupção passam a ser investigáveis. 
Em síntese, os juristas ressaltaram que “A Nação Brasileira recusa a manobra de retaliação contra a Operação Lava-Jato representada pelo projeto de Lei de Abuso de Autoridade, de autoria do Senador Renan Calheiros (PMDB/AL) e relatado pelo Senador Roberto Requião (PMDB/PR). A CCJ ao, eventualmente, aprovar este projeto, estará insuflando uma revolta política de consequências imprevisíveis. O Senado não tem o direito de desmoralizar e destruir as instituições do país para proteger as dezenas de Senadores investigados por práticas continuadas de corrupção. A Cidadania brasileira espera que o Senado Federal não se transforme numa organização de proteção aos políticos corruptos.”.
À toda evidência, o projeto em comento representa o que de pior se pode imaginar, em termos de medida legislativa, porque ele significa ato que vem na contramão da evolução da humanidade, no sentido de que o correto é haver, nos países sérios e civilizados, o aperfeiçoamento de normas jurídicas para aprimorar o mais amplamente possível os trabalhos pertinentes às investigações e ao julgamento dos casos irregulares, tendo por base justamente a segurança jurídica, inclusive possibilitando o salutar emprego da ampla defesa e do contraditório, que permitem a apresentação de provas contestatórias, capazes de se infirmar os fatos apurados.
Não há a menor dúvida de que a medida cogitada por alguns senadores não tem cabimento nem mesmo nas republiquetas, onde a mentalidade política se comporta em harmonia com a evolução de seu povo, que não permite que, em pleno século XXI, seus políticos tenham o direito de privilegiar causas pessoais, em detrimento do interesse público e que ainda possam imaginar que a corrupção e a impunidade fazem parte da cultura e das atividades políticas.
Urge que os brasileiros tenham vergonha e dignidade suficientes para se insurgir, de forma veemente, contra os maus homens públicos que fizeram da atividade política práticas criminosas, não tendo o menor pudor de pretender usar os cargos outorgados pelo povo para aprovar normas jurídicas em benefício próprio, como forma de anular o indecente episódio das denúncias sobre o envolvimento em atos irregulares, pertinentes ao recebimento de propina, por meio da absurda criação do instituo do combate ao abuso de autoridade, permitindo com isso o fortalecimento do indigno império da corrupção e da impunidade. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 24 de abril de 2017

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