quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

As chamas da incompetência

         Conforme denúncia feita pela imprensa, que filmou o local, a Reserva Particular do Patrimônio Natural, que fica situada no Pantanal, foi destruída, pelos incêndios, em 85% da sua área, compreendendo flora e fauna, restando apenas amontoado de cinzas, no local.

Um cinegrafista contou o horror da sua triste experiência, tendo dito, em determinado momento, verbis: “(...) meus olhos não puderam acreditar no que viram e, apesar de eu ser bem experiente, soltei um berro e não pude conter o choro. Parecia que haviam explodido uma bomba. Não há palavras para descrever aquele cenário: cadáveres carbonizados de famílias de macacos, esquilos, serpentes, veados, mutuns de penacho, tucanos, arancuãs, passarinhos e sei lá mais quantos animais lado a lado, me remetendo à cena dos corpos petrificados pela lava do Vesúvio, em Pompeia. Eu não conseguia entender tamanha concentração de animais mortos, mas um piloto de helicóptero do Ibama me explicou que o fogo vem numa linha e com a virada do vento forma um círculo que ‘laça’ a mata e vem se fechando. Os animais em pânico vão fugindo para o centro dele, onde morrem juntos. Imaginar tamanha dor e desespero foi o que mais me doeu.”.

A reportagem se refere à falta de estrutura para combater os incêndios e para resgatar os animais é apenas mais uma dramática face do horroroso abandono a que o Pantanal está sujeito, e de resto as demais matas brasileiras, que passam por verdadeiro abandono, diante da falta de meios para a sua proteção.

Esse estado de abandono é muito doloroso, quando se percebe que riquíssimo bioma é varrido pelas queimadas que poderiam ser não totalmente eliminadas, mas, ao menos, minimizadas, caso houvesse políticas públicas voltadas para a preservação das florestas e animais brasileiros.  

A seca deste ano, considerada a mais severa dos últimos 47 anos, junto com a falta de fiscalização e a queima irregular praticada por alguns fazendeiros e ribeirinhos contribuíram para destruidora sequência de fogo sem precedentes, na região castigada.

O Pantanal bateu recorde sobre recorde de focos de incêndio, indo de 1.691 em 2018, para pouco mais de 10.000 em 2019 e mais de 21 mil, neste ano.

A destruição atingiu paredes de mais de 120 km de extensão, com abrangência em terras indígenas e unidades básicas de conservação.

O processo de recuperação do Pantanal dependerá mais de ações futuras do homem do que da própria natureza, porque nada será como antes, com as belezas predominantes na área, que foi completamente dizimada.

A contabilização dos prejuízos das queimadas no Pantanal aponta recorde de focos de incêndios que destruíram a área de 43 mil km, com extensão bem superior a um país com a dimensão territorial da Suíça, e o pior é que parte das cinzas, cerca de 29% do bioma, será carregada, pelas águas, para os rios e lagoas, em forma de poluição pesada e letal para animais aquáticos.

As consequências desse gigantesco desastre ecológico são imprevisíveis, porque, além da destruição da flora e da fauna, seguramente as cinzas vão afetar a qualidade da água e interferir nos processos recreativos naturais dos peixes, que são responsáveis pela cadeia alimentar de animais, ou seja, além dos graves prejuízos decorrente das queimadas, ainda é preciso manipular a poluição das águas, para se evitar mais mortes de peixes e animais.

Os especialistas afirmam que a vegetação vai se recuperar com o tempo, a começar pelas gramíneas, depois surgem as árvores, mas, no que se refere à fauna, ao reino animal, nunca mais voltará a ser como antes, diante da imensurável perda de animais do Pantanal, onde muitos eram espécies que ainda sequer tinham sido descritas pela ciência, ou seja, alguns animais desapareceram pelo poder do fogo antes mesmo de eles terem sido conhecidos e catalogados, à vista da diversidade de espécies dizimadas nessa terrível tragédia.

Os fatos mostram que a dimensão do desastre ecológico é imensurável e não tem precedentes, o que demanda muito estudo para se estimar a real gravidade de suas consequências, em termos de prejuízos à natureza.

Em princípio, especialistas e estudiosos do Pantanal avaliam que serão necessários, pelo menos, 50 anos para a recuperação total da vegetação e ainda na esperança do que seja providenciado para garantir que não aconteçam novos desastres, ou seja, a recuperação dessa importante área dependerá mais das ações futuras do que da própria natureza em si, porque, se não houver proteção desse rico bioma, nem precisa pensar em recuperação da área dizimada pelo fogo.

          A grande questão que resta é se, a partir de agora, diante da tragédia ambiental, o Brasil será mais responsável e sensível à real desgraça devastadora da natureza, passando a ter efetiva preocupação com a conservação e a preservação de bioma tão rico e importante para o Brasil e para o mundo, de modo à priorização de investimentos com recursos para os devidos cuidados preventivos e de recuperação das áreas afetadas pelas queimadas.

          A recuperação do Pantanal se transformou em prioridade governamental, que precisa ser eleito como importantíssimo desafio tanto dos governantes como da sociedade em geral, em forma de urgente mobilização das forças e políticas necessárias, sob pena de haver o sepultamento de uma das esperanças brasileiras, em termos valiosos do meio ambiente, da maior importância também para a vida humana.

            Brasília, em 16 de dezembro de 2020

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