segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Respeito à Constituição

 

O Supremo Tribunal Federal houve por bem, com 6 votos contra 5, dizer não à possibilidade de reeleição dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

 A maioria dos ministros daquela corte entendeu, de maneira absolutamente sensata e responsável, que a recondução dos cargos cogitados na ação é inconstitucional, ou seja, fere a Carta Maior do país, que precisa ser respeitada e acatada, tanto quanto por todos os brasileiros, inclusive aquelas autoridades do Congresso Nacional.  

A propósito, o disposto no art. 57, parágrafo 4°, da Constituição Federal proíbe, de forma cristalina, que até os cegos leem (força de expressão), que os chefes daquelas Casas legislativas tentem a recondução no posto dentro da mesma legislatura, nestes termos: "Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente".

Em que pese a explícita proibição em nível constitucional, nada impediu que os mencionados presidentes tivessem postura de enfrentamento ao presidente da República junto ao Supremo, visando interpretação favorável de ministros daquela corte para a mudança pretendida com o especial e decisivo aval deles.

O ministro-relator do caso defendeu a tese mais bisonha que se pode imaginar, no sentido de que o Congresso possa alterar a regra constitucional, internamente, pasmem, por meio de mudança regimental, questão de ordem ou, ainda, "qualquer outro meio de fixação de entendimento próprio à atividade parlamentar", e não necessariamente pela aprovação de uma PEC (proposta de emenda à Constituição), que é exatamente o caso, quando o texto é mais claro do que a luz solar, como visto acima.

Enfim, a respeitável decisão do Supremo pode ser interpretada como peça fundamental no xadrez da disputa pela sucessão no Congresso, porque o seu julgamento diz respeito à ação apresentada pelo PTB, que pediu para aquela corte "afastar qualquer interpretação inconstitucional" a se permitir a reeleição de que se refere o dispositivo em questão.

Ressalte-se, a bem de se ver, que o citado partido é aliado do presidente do país, com o que fica bastante evidenciado que a tentativa dele objetiva ajudá-lo a vetar qualquer chance da recondução do presidente da Câmara, no seu comando.

Por sua vez, a ação em causa poderia ter o efeito reverso e dar respaldo às articulações do presidente da Câmara para a sua continuidade à frente do cargo.

É de se notar que causa perplexidade o interesse do governo nas eleições em apreço, diante da sua simpatia pela manutenção do presidente do Senado e da vontade de se impedir a continuidade do presidente da Câmara, o que poderia facilitar a eleição do candidato do Palácio do Planalto, um dos líderes do famigerado Centrão, que é seu aliado e privilegiado réu no Supremo, sob a acusação da prática de corrupção passiva com recursos públicos.

O declarado apoio do presidente do país é algo inusitado, porque isso seria absolutamente impossível sob a ótica ética do então acadêmico da moralidade, na acalorada e efervescente campanha eleitoral, quando ele dizia, com o peito impoluto, que abominava os integrantes desse desmoralizado grupo político, evidentemente nos seus áureos tempos de candidato, o que é bem diferente de agora, quando se tornou marica, em termos de respeito à dignidade das atividades político-administrativas.

Não somente por esses fatos censuráveis, mas é preciso lembrar, em termos de princípios constitucionais, que os poderes da República são autônomos e independentes e não tem o menor cabimento moral que o presidente da República venha a ter interesse em se imiscuir no processo eleitoral dos presidentes do Congresso, que se trata de procedimento da incumbência exclusiva dos deputados e senadores, ficando à mostra a explícita, insensata e indevida interferência de interesse do Palácio do Planalto, em indiscutível afronta aos liames delineados para Carta Maior do país, que precisa ser respeitada, como forma de consolidação e aperfeiçoamento dos princípios republicanos.

Pois bem, tamanha simplicidade de interpretação por parte de ministro da Excelsa Corte de Justiça do país exprime o importância da credibilidade ética, moral, cívica, profissional, além da clara demonstração da falta de competência e responsabilidade na compreensão de matéria absolutamente lúcida, que não carece do menor esforço para a manifestação de algo que qualquer analfabeto enxerga (força de expressão) e lê facilmente a expressão “vedada a recondução para o mesmo cargo”.

Agora, o que ficou intrigantemente transparente, em termos de ridicularidade, abusividade e menosprezo ao cargo da maior relevância da República, foi a maneira de se sugerir a mudança do texto constitucional por medida colocada no Regimento da Câmara dos Deputados, mera questão de ordem ou, ainda na pior hipótese, por qualquer entendimento inerente à atividade parlamentar, em extrema banalização da norma constitucional cogente, em que a autoridade do quilate do autor dessa ideia estapafúrdia e irresponsável não teria a indignidade de fazê-lo nem mesmo nas piores republiquetas, onde certamente os juristas devem prezar o esforço pela conquista de seus diplomas com habilitação para o exercício de cargo público com seriedade e respeito aos ditames constitucionais.

No meu nenhum entendimento jurídico, pode-se facilmente concluir que o Supremo Tribunal Federal, a excelsa corte que tem incumbência privativa da maior relevância e responsabilidade, perdeu precioso tempo em apreciar questão que versa sobre situação perfeitamente definida na Constituição Federal, com prejuízo da análise de importantes matérias da sua competência verdadeiramente constitucional, a exemplo dos processos pertinentes ao escândalo do petrolão e muitos outros do interesse público, diante da possível necessidade da devolução de valores aos cofres públicos.

Nesses casos já redigidos com toda plena lucidez na Cartilha Suprema do Brasil, é preciso que o Supremo Tribunal Federal tenha a necessária inteligência para simplesmente determinar o arquivamento do pleito, in limine, bastando apenas o despacho do presidente da corte, declarando que o texto constitucional é autoexplicativo e os ministros são subsidiados para cuidar de matérias sérias do interesse dos brasileiros, ou seja, o principal órgão da Justiça brasileira tem a incumbência constitucional de se preocupar exclusivamente com os assuntos do interesse público.

Brasília, em 7/12/2020

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