domingo, 2 de agosto de 2015

À espera não somente da ética

"Trata-se de um pássaro de bela plumagem e cores fulgurantes que voa sobre as cabeças, incitando a agarrá-lo. Quando alguém ergue as mãos e o pega, só fica nas mãos um montão de excremento." Sergio Ramírez, notável escritor nicaraguense
 
Diante da montanha de denúncias de corrupção na Petrobras, objeto das investigações da Operação Lava-Jato, que vem revelando intermináveis podridões nos porões da estatal, que levou de roldão a credibilidade da administração do país, o ex-presidente da República petista divulgou, tempos atrás, vídeo na internet, no qual afirma que uma das lições deixadas pela última eleição foi que "o povo quer mais ética", tendo aconselhado a presidente petista a assimilar o recado das urnas e "continuar" o combate à corrupção, se quiser fazer mandato "histórico".
No vídeo, o petista afirma que "A lição que ficou foi a seguinte: o povo quer mais democracia, mais participação, mais esperança, mais ética. O povo quer ser mais ouvido e continuar sonhando. Essa é a mensagem que a presidenta Dilma deve assimilar do resultado eleitoral e fazer do seu mandato um mandato histórico. Ou seja, o povo está mais exigente, o povo quer mais".
Amparados em resultados de pesquisas qualitativas, os petistas estão cientes de que as seguidas denúncias de corrupção envolvendo o governo e o PT são as principais causas do antipetismo que tomou conta dos brasileiros, motivando a iniciativa de discurso apropriado para reverter este quadro.
Além do dever de "continuar" a política de combate à corrupção, o petista entende que também é importante a transparência das ações do governo, para investigar e punir os responsáveis por desvios de dinheiros públicos.
O ex-presidente pede também que a sua sucessora dialogue com a sociedade, por considerar que a falta de disposição dela para conversar com os políticos, movimentos sociais e empresários foi um dos principais alvos de suas críticas no primeiro mandato da presidente.
Ele asseverou que "Nós devemos conversar sempre com o povo no sentido de fazer com que nada seja escondido. Continuar a política forte de combate à corrupção onde toda e qualquer coisa deve ser dita e tem que ser dita porque um governo não pode esconder nada".
O petista ressaltou que hoje, com a ampliação do acesso à internet, grande parte da população tem mais acesso às informações sobre o que acontece nos governos e nos partidos políticos, possibilitando maior conhecimento sobre a atuação e o desempeno da gestão pública, ou seja, "O povo está sabendo mais das coisas, está acompanhando mais o processo de desenvolvimento de um governo ou de um partido político", disse ele.
À toda evidência, as palavras do principal líder petista não passam de gritos no vácuo, de afirmações ao vento, justamente por serem meras afirmações da boca para fora, considerando que, na prática, as ações do governo não existem com relação ao combate à corrupção, à punição aos corruptos e muito menos à conexão dele com absolutamente ninguém, para tratar da governança do país, como pretendido pelo cacique petista.
De igual modo é a continuidade da falta de transparência sobre as ações da administração do país, que, como é mais do que notório, o governo gasta montanhas de recursos em marketing e publicidade com o absoluto propósito de promover a imagem da presidente, porquanto as políticas públicas permanecem esvaindo em precariedades quanto à prestação dos serviços públicos, padecendo da falta de qualidade e pior ainda da efetividade, à vista da completa insatisfação do povo, que não suporta tanto descaso com relação à priorização das ações do governo para solucionar as mazelas que grassam no país.
Por seu turno chega a ser risível a expressão do petista de que "Nós devemos conversar sempre com o povo no sentido de fazer com que nada seja escondido...”, porque isso contradiz o modelo adotado na campanha eleitoral, quando foram omitidos do eleitorado o resultado do estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), pertinente à evolução da miséria extrema, e tantas informações de governo que teriam sido prejudiciais à candidata oficial, sob a fajuta e injustificável alegação de que a legislação eleitoral proibia a divulgação de dados que pudessem favorecer candidatos.
Na atual conjuntura, é completamente impossível se imaginar em algum êxito da administração do país, quando o governo pensa em consegui-lo tão somente com o emprego do entendimento e da aproximação com a sociedade organizada, sem esboçar o mínimo de esforço no sentido de mudança da sua mentalidade quanto aos métodos ultrapassados e retrógrados de imobilismo das estruturas do Estado, a exemplo do arraigado fisiologismo na administração pública, em que os ministérios e as empresas públicas, em quantidade injustificável, são loteados aos aliados da coalizão de governabilidade, em troca de apoio político, sem o menor critério pertinente ao mérito administrativo.
Não é verdadeiro que o povo quer mais ética, porque ele ressente mesmo é da existência dela, pois a falta de ética tem sido, infelizmente, a marca registrada de muitos políticos que cresceram na vida pública justamente menosprezando o princípio ético, o qual somente tem o devido valor quando o povo se conscientiza sobre a sua importância para o aprimoramento do princípio democrático.
Também não é que o povo queira mais democracia, porque a democracia plena é a aspiração de nação livre e independente, que não se harmoniza com a falta de ética dos maus políticos, quando, para eles, a verdadeira ética somente é invocada para possível socorro às suas conveniências políticas, como parece ser o caso, agora, das lideranças petistas, que veem o distanciamento de seu partido do povo exatamente em razão da perda do princípio da ética.
Na atualidade, nem mesmo quem teria votado na presidente brasileira estaria satisfeito com o desempenho dela, à vista dos resultados das pesquisas, que mostram o alto nível de desaprovação do governo, em percentual superior a 70% dos entrevistados, graças à sua incapacidade para administrar o país e a inconsistência do princípio ético.
A verdade é que parcela significativa dos eleitores que votaram na oposição desaprova a forma como o país vem sendo administrado, por não corresponder aos parâmetros desejáveis de ética, transparência, moralidade e eficiência, notadamente na condução das políticas econômicas, na prestação dos serviços públicos, no combate à corrupção, ante a fragilidade dos controles e da fiscalização na aplicação dos recursos públicos, para a qual não há a mínima preocupação com as prioridades que devem imperar nos governos cônscios de suas responsabilidades perante o povo.
Espera-se que os brasileiros, no âmbito de sua responsabilidade cívica, sejam capazes de entender, com a máxima urgência, que a inobservância dos princípios da ética, transparência, moralidade e eficiência são extremamente prejudiciais à consecução dos objetivos essenciais à satisfação das necessidades da população, ante as dificuldades na condução das ações de incumbência constitucional do Estado, notadamente das políticas econômicas, que se mostram prenhe de frustrações com os terríveis indicadores a indicar tendência de forte recessão, com reflexos no desenvolvimento do país. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 02 de agosto de 2015

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