quinta-feira, 27 de agosto de 2015

A insensibilidade tupiniquim

Diante da gigantesca crise econômica que tomou conta da Grécia, o primeiro-ministro daquele país entregou seu pedido de renúncia ao cargo. 
Na verdade, a principal causa da renúncia do ex-premiê grego foi a divisão no seio de seu partido - o Syriza –, que contribuiu para enfraquecê-lo.
Ele declarou que a sua decisão de renunciar foi tomada para tornar possível a pavimentação de caminho para eleições antecipadas, de modo que ele possa transferir para os gregos a competência para o julgamento da sua atuação nas negociações com os credores estrangeiros, na última batalha sobre as demandas que resultaram na austeridade na administração do país. 
O ex-premiê disse que "O mandato político das eleições de 25 de janeiro esgotou os seus limites e agora a população grega deve ter a sua voz ouvida", para a devida avaliação sobre os últimos fatos pertinentes às negociações econômicas.
O ex-mandatário grego já antecipou que deve se candidatar nas próximas eleições e seu objetivo é conseguir retornar ao poder numa posição ainda mais forte e confortável, com a vantagem de poder descartar os atuais membros mais radicais do seu partido, aqueles que se opuseram contrários ao acordo da Grécia com credores internacionais, uma vez que eles já criaram novo partido e vão seguir, se eleitos, caminhos distintos ao dele.
Ele disse que a convocação de eleições, a mais próxima possível, visa à busca de "claro mandato para um governo forte", diante da sua "obrigação moral e política" para permitir que os eleitores possam decidir quem deve liderar o país nesta "nova era esperançosa". 
As apostas já apontam o favoritismo do ex-premiê nas próximas eleições, que deverá voltar para o cargo com maior vantagem, apesar de ter contrariado a vontade dos gregos no último plebiscito, quando ele promoveu as negociações da dívida do país em condições contrárias ao resultado da consulta popular.
Ao que tudo indica, o ex-premiê grego deu uma de político tupiniquim, ao forçar novas eleições para afastar do seu caminho os opositores indesejáveis ao sucesso do próprio partido e, depois, conquistar nas urnas, poderes absolutos, na forma como fazem os principais políticos brasileiros, que tudo fazem pela absoluta dominação.
Infelizmente, no sistema presidencialista brasileiro não é possível se concluir com as mesmas voluntariedade, dignidade e honestidade do ex-premiê grego, no sentido de reconhecer que o governo dele tenha chegado ao fim, sem o apoio nem mesmo do seu partido.
Embora o parlamentar grego tenha sido eleito apenas em janeiro e governado o país por poucos meses, a sinceridade política o obriga a entender que os empecilhos oriundos da falta de apoio do próprio partido o fizeram entregar o cargo, fato que obriga a realização de novas eleições, evidentemente por falta composição para novo governo, justamente porque a sua continuidade poderia ser ainda muito mais prejudicial aos interesses do país.
É evidente que, no país tupiniquim, ainda não há amparo legal para medida semelhante à adotada na Grécia, que resultou na renúncia do mandatário, em razão de fatos deletérios ao país e ao seu povo, mas a analogia entre eles é mais do que notória, com a mesma caracterização de país completamente atolado no mar das incertezas e da falta de perspectivas, principalmente porque aqui as causas conhecidas permanecem intocáveis, que dizem respeito à indiscutível incompetência e à falta de iniciativa e de coragem para a recomposição da administração do país com pessoas capazes e dotadas de notáveis conhecimentos e experiências nas respectivas áreas de atuação.
Além da falta de abnegação às causas públicas, a moralização do país passa pelo indispensável expurgo do espúrio fisiologismo da máquina pública, tão pernicioso à eficiência da gestão pública, que exige urgente enxugamento, aperfeiçoamento, modernização, eficiência e somente capacidade para o atendimento dos objetivos essenciais à prestação dos serviços públicos.
Enquanto não houver conscientização e racionalização sobre as reais finalidades da administração pública, no sentido de existir exclusivamente para a satisfação do interesse público, com embargo dos projetos pessoais e partidários de absoluta dominação política e perenidade no poder, o Brasil está fadado a continuar caminhando para o abismo do subdesenvolvimento, com respaldo nos pífios indicadores econômicos e na falta de credibilidade e de perspectivas.
Convém se reconhecer que, na Grécia, o ex-premiê perdeu o apoio do próprio partido, mas aqui a situação é ainda mais grave, porque a presidente da República perdeu apoio tanto do seu partido, dos partidos aliados e principalmente do povo, sendo que este gostaria muitíssimo que ela renunciasse ao cargo, como forma de possibilitar alternativa de mudanças nas estruturas arcaicas, obsoletas e retrógradas do Estado, que foram absurdamente negadas por governo de absoluta insensibilidade quanto aos princípios de modernidade e atualização dos mecanismos indispensáveis ao acompanhamento dos avanços da humanidade. Acorda, Brasil!
                               
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 27 de agosto de 2015

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