quinta-feira, 3 de setembro de 2015

A degenerescência dos financiamentos

Os maiores financiadores de campanha eleitoral são responsáveis por mais da metade dos valores doados por empresas e pessoas físicas na última eleição, segundo consta da contabilização dos partidos. O grosso do financiamento tem origem na iniciativa privada, que é complementado por valores oriundos do Fundo Partidário, normalmente constituído por recursos públicos.
Embora o universo de doadores seja formado por mais de trinta mil abnegados, é significativa a concentração dos financiadores em grandes conglomerados, sendo que alguns, por razões sabidas, porém absolutamente “inconfessáveis”, se destacam, como o primeiro do ranking, o Grupo JBS, que teria doado centenas de milhões de reais.
Outras empresas também tiveram peso nas doações, como a Friboi e seu grupo, que receberam o reconhecimento pelos expressivos valores repassados aos partidos; o grupo Ambev, proprietária das marcas Brahma, Antarctica e Skol, que abriu seus cofres para doar milhões para os candidatos, com preferência para os de grandes partidos, com dominação no Parlamento; o setor financeiro foi muito bem representado, com destaque para o grupo Bradesco e o banco BTG Pactual e sua administradora de recursos; as empreiteiras, que são protagonistas das bondades, garantindo a supremacia dos financiamentos de campanha, com centenas de milhões de reais, etc.
Os dez maiores doadores da última campanha têm a metade composta por grupos empresariais com base no ramo da construção, com destaque para a OAS, Andrade Gutierrez, UTC Engenharia, Queiroz Galvão e Odebrecht.
Como não poderia ser diferente, por ser o partido dominante da politica brasileira, o PT foi o partido que liderou a arrecadação de todos os segmentos empresariais, tendo sido seguido pelos partidos de maior representatividade política.
Não pode passar despercebido que a maioria das construtoras doadoras está sendo investigada na Operação Lava-Jato, por suspeita de participação em esquema de corrupção envolvendo recursos públicos, como a justificar tamanha facilidade para repasse de montanhas de dinheiro para as campanhas de candidatos e partidos, sendo que alguns também são objeto de investigação na citada operação, dando a entender que se trata de verdadeiro círculo vicioso com uso de recursos dos tolos dos contribuintes, que têm servido apenas para custear milionárias campanhas e garantir a renovação de contratos ou a assinatura de outros novos, em um inescrupuloso e ilegítimo jeitinho brasileiro para que todos se beneficiem de forma irregular e vergonhosa de recursos públicos.
Nesse mar de lama, existem ainda as empresas que se beneficiaram, segundo a mídia, de financiamentos com juros vantajosos do BNDES, como o grupo JBS, Friboi e outros grupos, que, inexplicavelmente, fizeram doações milionárias, principalmente para a campanha da candidata oficial, denotando visível promiscuidade, à vista de o gesto funcionar como ato de claro agradecimento pelos benefícios com dinheiro a juros subsidiados, em condições bem diferentes daquelas praticadas no mercado bancário privado.
Vê-se que o custo da democracia tupiniquim é regado, de forma inconcebivelmente exagerada, por valores bilionários provindos da concentração da ajuda financeira de empresas ligadas a grandes grupos econômicos, como empresários, construtoras, bancos, mineradoras, pecuárias etc., que abrem seus cofres em gesto de extremas generosidade e benevolência, em troca, evidentemente, de inescrupulosas facilitações negociais com o Estado, que certamente rendem formidáveis lucros, caso contrário não havia o escancarar tão generoso dos principais cofres do país para custear nababescos gastos de publicidade e de propaganda eleitorais.
A grande interrogação que se suscita diante dessa constatação de muita bondade caritativa é se essa movimentação bilionária de recursos, de forma absolutamente pegajosa e repulsiva para os princípios da razoabilidade, principalmente para grandes partidos que dominam as urnas, seria possível caso não houvesse o “terceiro” turno para que os grupos econômicos possam realizar o devido “acerto” de contas, que normalmente consiste na concessão de privilégios recompensadores dos benefícios de campanha?
Na realidade, não fosse a existência desse perverso sistema promíscuo da troca de doações por privilégios nas negociatas envolvendo recursos públicos, a se permitir a antecipação de doações para serem, via de regra, compensadas posteriormente, em troca de privilégios nas contratações ou em outras formas de influência política, financeira ou quaisquer modalidades que beneficiem os envolvidos, certamente que as doações não seriam tão generosas e expressivas, diante do comprometimento de tanto dinheiro em causa absolutamente estranha às finalidades precípuas das respectivas empresas.
Essa verdadeira farra com dinheiros dos tolos dos contribuintes precisa acabar, com urgência, mediante a reformulação desse sistema retrógrado, ultrapassado e claramente destinado a beneficiar os participantes inescrupulosos, tanto os doadores como os beneficiados, que menosprezam conscientemente os princípios da ética, moralidade, legalidade e dignidade na gestão dos recursos públicos, como se essa cultura rasteira não contribuísse para a degradação da República, por ser forma primária de alimentação dos famigerados esquemas de corrupção.
É evidente que não será fácil se eliminar essa cultura degenerada e questionável do financiamento por parte dos grupos econômicos, mas ela poderia ser menos censurável se fosse estabelecido limite de valor para as doações por pessoas físicas e jurídicas, caso persista esse espúrio e repugnante sistema de doações, e, de igual modo, os candidatos fossem obrigados a gastar somente o mínimo possível, num limite de gastos estabelecido igualmente para o mesmo cargo, para se evitar o peso do poder econômico nas campanhas, tudo em harmonia com a imperiosa necessidade da busca da isonomia e da moralização do sistema político-eleitoral.
Convém que os brasileiros se conscientizem de que a verdadeira evolução, modernização e reformulação do sistema de financiamento de campanha somente se processarão se houver a vontade e a participação popular, porque é o povo que deve se interessar para a moralização tanto ansiada neste país pelas pessoas de bem, uma vez que os homens públicos já demonstraram completa incapacidade para aperfeiçoar e modernizar o sistema que vem atendendo, de forma satisfatória, às suas conveniências políticas e eleitoreiras. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 03 de setembro de 2015

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