terça-feira, 8 de setembro de 2015

Decadência orçamentária

O governo entregou, pela primeira vez, o projeto de Orçamento da União ao Congresso Nacional, com previsão de despesas maiores que as receitas. A estimativa de gastos para 2016 é de R$ 30,5 bilhões de déficit, representando 0,5% do Produto Interno Bruto.
O ministro do Planejamento disse que o governo continuará adotando medidas para melhorar os resultados das contas públicas em 2016, mediante o aumento de tributos, a venda de participações acionárias e novas concessões.
Para tanto, devem ser revistos alguns tributos, como o IOF e outros, com a finalidade de aumentar a arrecadação em, pelo menos, o valor de R$ 11,2 bilhões. O governo ainda estima ampliar os processos de concessões e venda de imóveis e aperfeiçoar o aumento da cobrança da dívida ativa da União, na expectativa de receber R$ 37,3 bilhões.
O ministro do Planejamento informou que a Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece que o governo deva enviar o orçamento com meta fiscal e que não importa se ela é positiva ou negativa. Ele afirmou que "Estamos fazendo uma proposta orçamentária. Estamos fixando o valor para o próximo ano. Procuramos fazer uma proposta de despesa bem realista e adequada à realidade de recursos...”.
O ministro da Fazenda disse que "A gente sabe onde quer chegar. A gente sabe como vai chegar, que é através de reformas. É fazer o Brasil mais justo simples, eficiente através de medidas legislativas em alguns casos. Precisa de uma ponte para assegurar a estabilidade fiscal, com receitas para cobrir despesas no curto prazo, podem ser ações provisórias, mas é importante considerá-las".
O titular da Fazenda concluiu afirmando que o orçamento em apreço é "transparente e provoca reflexão no momento em que o Brasil enfrenta uma mudança significativa do ambiente econômico".
O vice-presidente da República disse que o projeto com previsão de déficit é uma demonstração de que não haverá "maquiagem" nas contas públicas, o que vale se inferir que os orçamentos anteriores não passavam de meras peças de ficção, por não representarem a realidade orçamentária de receitas e despesas a que se referem as normas legais pertinentes à administração orçamentária e financeira, normalmente observadas nos países sérios e desenvolvidos.
O presidente do Senado Federal disse, in verbis: "Acho que esse Orçamento, apesar do déficit, é uma mudança de atitude. É um primeiro passo. É menos ficção, é mais realismo, e é preciso que nós ajudemos. Esse Orçamento significa, do ponto de vista da gestão, um avanço. O realismo orçamentário fala primeiro da necessidade de nos mobilizarmos todos, Congresso, sociedade, poderes, para encontrarmos saídas para o país".
No caso brasileiro, a Constituição Federal, a Lei nº 4.320/64, o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei de Responsabilidade Fiscal firmaram princípios básicos bem claros e definidos, que devem ser observados com o devido rigor pelo governo, por ocasião da elaboração dos orçamentos públicos.
Um dos princípios fundamentais do orçamento é o de que, com base na expectativa da receita, são fixadas as despesas dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e somente depois de aprovado o orçamento pelo Congresso é que o governo está autorizado a gastar por conta do que foi planejado.
Outro importante princípio é o que estabelece que, se a receita do ano for superior à previsão, o governo fica obrigado a encaminhar projeto de lei ao Congresso, com pedido de autorização para a Incorporação do superávit, como forma de poder executar o excesso de arrecadação. Nesse novo projeto, serão também definidas as novas despesas, que serão custeadas pelos recursos supervenientes.
Ainda segundo o citado princípio, ao contrário, se a receita cair, o governo fica impossibilitado de executar o orçamento na sua totalidade, o que exigirá corte nas despesas programadas, justamente por falta de recursos, em harmonia com as salutares regras pertinentes à execução orçamentária e financeira.
Como princípio básico, o Orçamento da União é da responsabilidade dos três poderes da República, cabendo ao Executivo a sua consolidação, de modo que ele seja, necessariamente, equilibrado, i.e., não pode haver fixação de despesas em valores superiores aos recursos disponíveis, ou seja, às receitas.
Essa limitação obriga o governo a definir prioridades na aplicação dos recursos estimados. As metas para a elaboração da proposta orçamentária são definidas pelo Plano Plurianual e priorizadas pela Lei de Diretrizes Orçamentárias.
O art. 4º, inciso I, alínea a da citada lei, que se harmoniza com o disposto no § 2o do art. 165 da Constituição Federal, estabelece que as diretrizes orçamentárias disponham também sobre o equilíbrio entre receitas e despesas, deixando muito claro que jamais haverá a possibilidade de a despesa poder superar a receita, porque isso deixa de ser observado o salutar equilíbrio entre receita e despesa.
O princípio essencial do equilíbrio orçamentário obriga a rigorosa observância das despesas, de modo que elas sejam sempre inferiores ou, no máximo, iguais às receitas previstas, o que significa dizer que a avaliação contábil do orçamento somente permite, no máximo, o equilibrado, em que pode haver igualdade entre receita e despesa, porquanto as diretrizes orçamentárias são no sentido de, no caso de as despesas superarem as receitas, o governo fica obrigado a cortar os gastos, sob pena de a diferença deficitária ser coberta, obrigatoriamente, por operações de crédito que, por lei, devem também constar do orçamento, ou seja, as despesas autorizadas no orçamento devem ser na medida do possível emparelhadas com as receitas previstas, de modo que haja o saudável equilíbrio a ser mantido em qualquer situação.
Parafraseando o presidente do Senado, com a devida vênia, pode-se dizer que o orçamento, em face exatamente do gigantesco déficit, não servir como parâmetro de mudança de mentalidade nem de atitude, por representar a continuidade da incompetência administrativa e governamental, de se planejar gastos muito além do que se dispõe de receitas factíveis.
Na realidade, ele é muito mais ficção e menos realismo, e, por isso, é preciso que os congressistas se conscientizem, à vista do dever patriótico, sobre o primado das diretrizes orçamentárias de que o Congresso não pode esgarçar os princípios constitucional e legal de que deve haver, na elaboração do orçamento, a rigorosa observância do equilíbrio, no mínimo, entre despesas e receitas, sob pena de se incorrer em crime de responsabilidade fiscal, pelo absurdo de se gastar muito mais do que se arrecada, tendo, que é pior, o irresponsável e insensato beneplácito do Congresso, que, na forma da Carta Magna, é o órgão que tem a incumbência de proibir a fixação de despesas além das receitas previstas, passíveis de arrecadação.
Não há a menor dúvida de que o orçamento em apreço significa, do ponto de vista da gestão responsável, expressivos atraso e ultraje aos princípios orçamentários, quando preceituam que há imperiosa necessidade de somente se gastar até o limite das disponibilidades orçamentário-financeiras, princípios esses postos por terra pela incompetência do governo, que há muito tempo desprezou a sentimento de respeito aos limites de gastos estipulados nas leis e diretrizes orçamentárias, com fulcro, principalmente na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Impende se ressaltar que o realismo orçamentário não é novidade e a sua importância como planejamento responsável e coerente com a razoabilidade já era defendida desde os primórdios dos séculos, como o fez o célebre tribuno Marcus Tullius Cícero - Roma, 55 a.C., com lapidar e modelar citação, ipsis litteris: “O Orçamento Nacional deve ser equilibrado. As Dívidas Públicas devem ser reduzidas. A arrogância das autoridades deve ser moderada e controlada. Os pagamentos a governos estrangeiros devem ser reduzidos, se a nação não quiser ir à falência. As pessoas devem novamente aprender a trabalhar, em vez de viver por conta pública.”.
É completamente inconcebível que os parlamentares cônscios da sua responsabilidade cívica e patriótica possam se posicionar em consonância com orçamento absolutamente fora dos padrões e dos princípios recomendáveis para a sua elaboração, principalmente por haver cristalina e absurda proposição de se gastar acima da previsão das receitas, o que implica a necessidade, no mínimo, da realização de operação de crédito para cobrir o déficit, fato que contribui para elevar o já expressivo montante das dívidas públicas, que já se aproximam dos três trilhões de reais.
Convém se atentar para o fato de que este orçamento pode até ser o marco que o governo tenha apresentado peça realista, mas isso não significa dizer que seja correto, quando nos anos anteriores os parlamentares foram ludibriados, tendo aprovado orçamento forjado, que não refletia a realidade do planejamento e das contas do governo, ou seja, até então os congressistas foram simplesmente enganados, passados para trás, por terem chancelado algo irreal, inconsistente, sendo cúmplice com a monstruosidade da burla orçamentária, quando uma de suas relevantes e precípuas funções é exatamente de fiscalização do Orçamento da União, desde a sua elaboração e até a execução, o que pode ter deixado a desejar, ante a informação o presente orçamento não tem mutreta.
Os parlamentares precisam se conscientizar de que o déficit proposto para a sua anuência é fruto da irresponsabilidade decorrentes das gastanças desmedidas e incontroláveis, que colocaram em cheque as contas públicas, cujas inevitáveis consequências são o sacrifício e o aperto para a sociedade, que continuará privada da prestação dos serviços públicos de qualidade e dos investimentos em obras públicas, além da ruinosa e permanente ameaça de criação de tributos, em que pese a insuportável carga tributária, que já é uma das maiores do mundo, mas, mesmo assim, não consegue sensibilizar a sanha agressiva das garras da Receita Federal, comandada pela cartilha petista.
É induvidoso que o realismo orçamentário exige que a sociedade se mobilize para alertar o Congresso Nacional sobre o seu dever constitucional e legal de principal fiscalizar do Orçamento da União, não permitindo que a incompetência administrativa se sobreponha aos luminares princípios e diretrizes orçamentários, ex-vi do disposto no art. 4º, inciso I, alínea a, da Lei de Diretrizes Orçamentárias, que se harmoniza com o contido no § 2o do art. 165 da Constituição Federal, segundo os quais o orçamento deve respeitar o equilíbrio entre receitas e despesas, sob pena de se gastar além das disponibilidades orçamentário-financeiras e se comprometer a economia nacional, em indiscutível prejuízo para o interesse dos brasileiros. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 08 de setembro de 2015

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