domingo, 5 de novembro de 2017

A moralização vem das urnas

No Fórum Mãos Limpas & Lava-Jato, promovido pelo jornal o Estado de S. Paulo, em parceria com o Centro de Debate de Políticas Públicas, um juiz aposentado italiano, que integrou equipe de investigadores da Operação Mãos Limpas, fez o seguinte alerta: “Hoje a corrupção na Itália é a mesma do que quando começou a Mãos Limpas”.
Ele deixou claro que a megaoperação judicial, que funcionou por 13 anos de intensas investigações sobre cerca de 4 mil pessoas, praticamente não foi suficiente para diminuir a corrupção na Itália.
Não quer o juiz dizer com isso que a Mãos Limpas tenha sido algo inútil, sem a menor validade, diante da sua importante função que teve à época, quando barrou a volúpia da corrupção sistêmica e endêmica reinante na Itália, no liminar da década de 90, quando ela teve início.
O certo é que, se a Mãos Limpas não tivesse existido, possivelmente a corrupção estaria agora em fase agigantada, com poder ainda abrangente e sem a importância da experiência italiana para o combate especializado da criminalidade, que somente foi possível com a sua estruturação, permitindo melhor desempenho da Justiça, que foi implacável enquanto pôde contar com o trabalho de operação que se dedicou intensamente ao combate desse câncer que tanto prejudica o desenvolvimento socioeconômico da nação.
Tanto na Itália como no Brasil, as principais forças de oposição às investigações partem exatamente do lado que tem poder e influência políticos, sob o argumento de que elas se destinam a prejudicar seus projetos e suas atividades na vida pública e tudo fazem com a finalidade de minar e detonar as ações próprias que visam à moralização da administração do país, a exemplo do que aconteceu com as dez medidas anticorrupção, que foram ignoradas e, em substituição a elas, foram aprovadas medidas de retaliação e punição aos envolvidos com as investigações e aos julgamentos dos fatos inquinados de irregulares.
A verdade é que, por mais que haja intensidade e o máximo de esforços na busca da punição cabível aos políticos corruptos, os mecanismos adotados ainda são insuficientes para o controle e a extinção dos atos irregulares na vida pública, à vista do poder sedutor intrínseco da corrupção.
Diante da relevância que se atribui ao combate à corrupção, por afetar diretamente os princípios essenciais da administração do país, haveria necessidade de legislação específica que pudesse permitir maior amplitude e celeridade às ações pertinentes aos trabalhos da força-tarefa, de modo que fosse permitido, por lei, maior facilidade para as investigações e os julgamentos, evidentemente sem prejuízo da ampla defesa e do contraditório constitucionalmente assegurados aos envolvidos.
Não há dúvida de que as limitações impostas à Justiça é fator preponderante para propiciar, de certa forma, benefício aos corruptos, por ainda usarem as brechas da lei para tirar proveito da insuficiência dos mecanismos utilizados nas investigações, evidentemente em prejuízo da moralidade pública, mas essas deficiências tendem a continuar exatamente porque muitos dos corruptos são aqueles que tramam contra os trabalhos de combate às irregularidades, visto que eles não têm o menor interesse senão de dificultá-los, não permitindo que haja o aprimoramento e a atualização das normas capazes de afetivamente promover a necessária modernização do regramento jurídico, para facilitar e agilizar as ações da Justiça.
          As limitações inerentes às atividades necessárias ao combate à corrupção são fatores divergentes da essência das investigações e dos julgamentos dos fatos irregulares e isso certamente pode levar ao desânimo e ao desestímulo para os agentes incumbidos de tão importante missão institucional, por dificultar o combate e a eliminação dessa peste daninha.
Não obstante, há esperança em um Estado Democrático de Direito, quando se sabe que o poder emana do povo, que tem, em última análise, a incumbência e a responsabilidade de aperfeiçoar as práticas políticas, quando ele pode exercer, de forma consciente, seu direito de votar e escolher seus representantes políticos, em consonância com os princípios ínsitos dos deveres patriótico e cívico, momento em que a população precisa se manifestar exatamente o seu sentimento sobre a necessidade de que determinado objetivo seja implementado para o atingimento da satisfação do bem comum e do interesse público.
Embora haja evidência da fragilidade e da limitação da atuação da Justiça, para se buscar o padrão ideal de moralidade pública sonhado pelos brasileiros, estes já se expressaram com firmeza, em índice recorde de 94%, que apoiam a Operação Lava-Jato e são favoráveis à sua atuação, exatamente por ela ter por escopo a eliminação da corrupção, que tem sido a desgraça que realmente contribui para atravancar o desenvolvimento socioeconômico do país.
O povo também reconhece as fragilidades dos controles sobre os atos da administração do país e espera que nova geração de homens públicos possa ter mentalidade e visão de estadista, com vistas a se aprovar medidas capazes de efetivamente se combater a corrupção, nos moldes da agilidade, eficiência e eficácia com que seus opositores trabalham para o fracasso das investigações e dos julgamentos dos casos irregulares.
Convém que sejam aprimoradas as experiências italiana e brasileira no combate à corrupção e mais ainda aproveitado o apoio de 94% da população, para que tudo isso pese no sentido de que a força e o poder dos corruptos sejam vencidos pelas conscientização e responsabilidade cívica do povo, a se imporem nas urnas, mostrando, sobretudo, a renovação da representação política, que deve se comprometer com a defesa da urgente moralização pública, haja vista que esse espírito de negação à praga da corrupção conduz necessariamente à maior responsabilidade popular, no exato momento de votar, para delegar a sua vontade pessoal de assepsia dos criminosos de colarinho branco. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 5 de novembro de 2017

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