Depois
de ter sido acusado de manter assessora fantasma no seu gabinete na Câmara dos
Deputados, em Brasília, o candidato à Presidência da República pelo PSL-RJ, já identificado
pela imprensa por sua linha ultradireitista, a exonerou, tendo apenas afirmado,
talvez como justificativa, que o "crime
dela foi dar água para os cachorros (sic)".
O
parlamentar, como que a querer justificar a sua irreparável e intolerável conduta,
declarou que "Tem dois cachorros lá
e pra não morrer de vez em quando ela dá água pros cachorros lá, só isso. O
crime dela é esse aí, é dar água pro cachorro".
Ocorre que, em janeiro,
o jornal A Folha de S.Paulo revelou a existência da aludida funcionária
fantasma, que foi identificada como prestadora de serviços particulares na casa
do deputado fluminense, mas a principal atividade dela é o comércio de açaí, que
é praticada exatamente no horário de expediente da Câmara, o que significa clara
caracterização de desvio de finalidade e, por via de consequência, de crime
contra a administração pública, por ter ficado patente que os serviços para os
quais ela foi contratada, como assessora parlamentar, não vinham sendo
executados na forma legal, ou seja, no gabinete do deputado, em Brasília.
A
mencionada assessora figurava desde 2003 como uma dos 14 funcionários do
gabinete parlamentar do presidenciável, pasmem, em Brasília, que vinha recebendo
o salário bruto do valor de R$ 1.351,46.
O
presidenciável ressaltou que a funcionária ligou pedindo demissão, mas ele
disse que seria "muito complicado"
então para ele a exonerou, porque "Eu
fico chateado até, porque ela precisa, é uma pessoa pobre".
Como
se vê, trata-se de caso de ato irregular, em que há de se convir que o principal
parâmetro para a conceituação de corrupção tem a ver simplesmente com a falta
de lisura, a dificuldade da comprovação da inocência e muito mais ainda com a
desgraça de alguém ser pego com a mão e a boca na botija, quando os fatos são
inexoráveis, como nesse caso da assessora fantasma, que nunca apareceu para
trabalhar no seu local de expediente.
É
preciso que o candidato tenha a consciência de que a sua ex-assessora - tida
por fantasma, por não dar expediente como funcionária do seu gabinete, em Brasília,
como era do dever dela de comparecer ao
trabalho para o qual ela foi contratada e era remunerada para o exercício da função
pública e não particular -, não cometeu absolutamente nenhum crime, porque ela
foi contratada pelo parlamentar para cuidar da casa dele, inclusive alimentar
cachorros, ou seja, o único crime cometido nesse caso não foi dela, mas sim do
deputado, por ter utilizado verba pública para o pagamento de servidor para
cuidar da sua propriedade.
Na
verdade, quem cometeu gravíssimo crime foi o candidato presidencial, que se
beneficiou pessoal e indevidamente de recursos públicos, prática essa que se
caracteriza como corrupção passiva, que é recriminável e condenável pela
sociedade, ante a indiscutível utilização do poder de
parlamentar, delegado pelo povo, para a obtenção de vantagem indevida, ou seja,
irregular, fazendo uso do dinheiro público para a satisfação do seu próprio
interesse, no caso, a contratação de empregada para zelar do seu patrimônio, da
sua casa.
A
atitude do parlamentar demonstra extrema irresponsabilidade cívica, pela
notória indicação de tentar transferir para a ex-servidora o grave crime
praticado por ele, que precisa ter a dignidade de assumi-lo, inclusive tendo a
iniciativa de, moto próprio, decidir pelo menos em repará-lo, no que se refere
ao crime civil, providenciando o devido ressarcimento dos valores desviados dos
cofres públicos, considerando que dificilmente o crime penal deverá ser avaliado,
como é devido, porque o Ministério Público deverá se omitir, deixando de
denunciá-lo, como é do seu dever institucional.
Causa
enorme estranheza que o presidenciável se refira a dois cachorros como se eles
pertencessem ao Estado, para serem cuidados pela assessora parlamentar, com o
que se justificaria a contratação dela, fato que é repudiável e inadmissível, à
luz do bom senso e da razoabilidade.
O
parlamentar precisa entender que realmente é muito complicado que pessoa do
nível dele não tenha a clara consciência de que o caso em tela se trata de
questão absolutamente particular e que a contratação, à luz da normalidade e da
legalidade, nunca deveria ter sido por conta dos contribuintes, ou seja, custeada
com dinheiro da verba da Câmara dos Deputados.
Compete
exclusivamente a ele a responsabilidade pela contratação de empregado dele,
porque, na verdade, trata-se de assessora do gabinete dele, sendo que é incompatível
com a função de auxiliar de gabinete o cuidado de propriedade particular, inclusive
dos cachorros do deputado, devendo ficar claro que ele precisa assumir os danos
causados ao erário e providenciar o devido ressarcimento dos valores pagos a
ela, como forma de, ao menos, amenizar a gravidade dos estragos já causados à
sua imagem de homem que era tido por absolutamente honesto, quando os fatos vindos
à lume mostram exatamente o contrário.
Essa
situação de moralidade precisa ser sopesada e avaliada pelos brasileiros, tendo
em vista que corrupção na administração pública tem muito a ver com a lisura
inerente aos atos praticados pelo político na vida pública, não importando se a
irregularidade se refere a apenas ao valor mensal de R$1.351,46 ou de bilhões de
reais, porque é preciso se ter em conta a conduta retilínea de moralidade que o
norteia, principalmente porque não se pode garantir que foi somente a bagatela
de pouco mais de um mil e trezentos reais, mas poderia ter sido de milhões, a
depender das investigações, que deviam acontecer, para se verificar a
regularidade na conduta do parlamentar.
O parlamentar precisa entender que, mesmo
envolvendo pequena quantia, o ato de corrupta tem o condão de sacrificar a
camada pobre, que depende basicamente dos serviços públicos, mas, em muitos
casos, aquele valor desviado, faz gigantesca falta, porquanto alguma
necessidade social pode deixar de ser suprida, notadamente se for levada em
conta que o somatório de pequenas parcelas usufruídas irregularmente por somente
centenas de parlamentares, que sempre têm a mesma mentalidade de que se trata
de valor insignificante, faz enorme diferença para a população, que termina
ficando no prejuízo, enquanto os poderosos e gananciosos corruptos, um a um, se
beneficiam indevidamente dos minguados recursos públicos.
É
risível que o deputado tenha ficado chateado com o episódio em comento,
alegando que se trata de pessoa pobre, que tem precisão, mas isso não vai ao
caso, porque ele é que deveria ter vindo arcando com o pagamento do salário dela
e não a Câmara, além do mais não parece haver tanta pobreza assim, porque ela negocia
com açaí, conforme mostra a notícia.
O
presidenciável, como lídimo representante do povo e potencial candidato ao
Palácio do Planalto, deveria se preocupar, em caráter prioritário, em justifica
a lambança envolvendo o questionado desvio de finalidade, com o uso de
assessora fantasma em atividade exclusivamente particular, que tinha a
incumbência de cuidar, entre outras coisas, de cachorros, que poderiam morrer
de sede, não fosse a sua contratação com recursos dos bestas dos contribuintes.
À
toda evidência, a atitude do candidato ultradireitista se torna ainda mais
grave quando, na atualidade, os brasileiros honrados se mobilizam em defesa da
tão ansiada moralização da gestão pública, que precisa contar com a liderança
de quem tem a cara e as mãos limpas, imaculadas e protegidas contra as
falcatruas que tanto envergonham a atual classe política, completamente
manchada com a lama pútrida das suspeitas da prática de atos contrários aos
salutares princípios republicanos da moralidade, da ética, do decoro, da dignidade,
entre tantos conceitos amplos da honorabilidade que são indispensáveis no
nobilitante exercício de cargos públicos eletivos.
Infelizmente,
a bandeira da ética e da moralidade, defendida com bastante ardor, tanto pelos
militantes como pelo impoluto candidato ultradireitista, acaba de ser arreada
do mastro, de forma melancólica, pelas próprias mãos sujas de quem não teve a
dignidade e a compostura para sustentar o que parecia tão consistente na figura
de ex-militar, cuja farda verde-oliva, quer queira ou não, tem a sua imagem indiretamente
tisnada com a mancha indelével da mácula originada de tremenda cachorrada.
É
muito complicado para o presidenciável conseguir atravessar o Rubicão apenas
atribuindo culpa por tão grave crime praticado por homem público à pobre e
indefesa ex-servidora, quando ele deveria ter a grandeza cívica e patriótica de
reconhecer seu gravíssimo pecado de ter usufruído, por tanto tempo, de
vantagens indevidas, mas não o fez, esquecendo-se de que a relevância do
principal cargo da República exige que o seu ocupante não pode te qualquer
suspeita, por mínima que seja, sobre a prática de irregularidade com recursos
públicos. Acorda, Brasil!
Brasília,
em 14 de agosto de 2018
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