domingo, 19 de agosto de 2018

Fake news?


O Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas determinou ao Estado Brasileiro que “tome todas as medidas necessárias para permitir que o autor (ex-presidente petista) desfrute e exercite seus direitos políticos da prisão como candidato nas eleições presidenciais de 2018, incluindo acesso apropriado à imprensa e a membros de seu partido político.”.
A aludida decisão foi recebida e conhecida pelo Itamaraty, órgão da diplomacia do governo brasileiro, na classificação de mera recomendação, tendo afirmado, em nota, que o Ministério das Relações Exteriores concluiu que os termos do documento do mencionado Comitê "não possuem efeito juridicamente vinculante" e que a documentação pertinente será encaminhada ao Poder Judiciário, a quem cabe examiná-lo e deliberar sobre as medidas a serem tomadas acerca do teor dela.
O Itamaraty também afirmou que o Brasil é "fiel cumpridor do Pacto de Direitos Civis e Políticos. Os princípios nele inscritos de igualdade diante da lei, de respeito ao devido processo legal e de direito à ampla defesa e ao contraditório são também princípios constitucionais brasileiros, implementados com zelo e absoluta independência pelo Poder Judiciário."
Não obstante, o Comitê dos Direitos Humanos da ONU manifestou pensamento diferente, tendo dito que o descumprimento da decisão pelo Brasil é um desrespeito ao Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, ao qual o País aderiu em 1992. 
O texto do pacto diz que os Estados signatários "reconhecem que o Comitê tem competência para receber e examinar comunicações provenientes de indivíduos sujeitos à sua jurisdição que aleguem ser vítimas de uma violação". 
A vice-presidente do Comitê da ONU e autora da liminar disse que se tratar de uma "obrigação legal", tendo afirmado ao portal UOL e a um jornalista brasileiro que o Brasil tem de acatar a decisão, por se tratar “medida urgente e de efeito imediatoO comitê não é uma Corte. Então essa não é uma ordem judicial. Mas o Brasil é um signatário de tratados, e a posição do comitê é que o Brasil tem obrigação legal de cumprir o pedido do comitê".
Ela também disse que o “descumprimento seria uma violação do pacto firmado em 1992 e ratificado em 2009, mas reconhece a ausência de mecanismos do órgão para garantir o cumprimento da medida ou impor sanções. Por outro lado, terá capacidade para concluir que o País violou suas obrigações.”. 
          Segundo a avaliação do Itamaraty, o mencionado Comitê é um "órgão de supervisão do Pacto de Direitos Civis e Políticos", que é integrado não por países, mas por peritos que exercem a função em sua capacidade pessoal, ou seja, trata-se de Comitê composto por 18 especialistas independentes em direitos humanos de diversos países, em cuja composição não tem nenhum brasileiro. 
Em princípio, o referido Comitê somente tem competência para atuar quando constatado que houve qualquer violação dos direitos humanos, segundo foi anteriormente dito por aquela integrante do comitê, nestes termos: "Para que se peça a um Estado que se estabeleçam medidas cautelares, deve-se demonstrar que este está violando de forma irreparável alguns dos preceitos do Pacto (Internacional sobre Direitos Civis e Políticos)". 
Agora, o comitê entende que o pacto pode ser violado se o petista não disputar as eleições, mas o governo brasileiro e o Judiciário por enquanto ignoram a decisão, enquanto o ministro da Justiça afirmou que a decisão em causa não tem relevância jurídica, tendo a classificado como medida de "intromissão política e ideológica indevida em tema técnico-legal”.
Os advogados do petista defendem que a manifestação do comitê é uma norma e precisa ser atendida, tendo alegado: "De que forma o Brasil vai cumprir isso não cabe a nós aqui discutir, mas não há opção. Deve cumprir, não é uma recomendação".
Um celebrado jornalista político da GloboNews considerou verdadeiro embuste a pantomima da ONU, em que “dois coleguinhas do advogado australiano de Lula apresentaram um relatório fake recomendando a candidatura fake do presidiário.”.
O referido jornalista disse, in verbis: Fake News não são apenas mentiras deslavadas. Quer dizer, muitas são, mas facilmente desmentidas. As que produzem efeitos fortes são as fake mais elaboradas, com base em algumas verdades e muitas distorções (…). Há um jeito simples de entendê-las: buscar a história em sua fonte original, ali de onde partiu a informação posteriormente manipulada. O comunicado é do Comitê de Direitos Humanos, um órgão formado por 18 ‘especialistas’ independentes – acadêmicos em geral – e que não tem nenhum poder decisório ou mandatório. Está lá no site da ONU: a função do Comitê é ‘supervisionar e monitorar’ o cumprimento dos acordos internacionais de defesa dos direitos humanos. É fazer recomendações, sempre em entendimento e consultas com países envolvidos. Esse comunicado não foi divulgado oficialmente, mas saiu em matéria da BBC, na última sexta-feira. Um vazamento. Depois, saiu uma nota do Escritório de Direitos Humanos, no site oficial da ONU, com o título ‘Information note’ sobre o Comitê de Direitos Humanos. Ali se explica que não se deve confundir o Comitê com o Conselho de Direitos Humanos – este um órgão de alto nível, formado por representantes (diplomatas) de 47 países e que se reporta à Assembleia Geral das Nações Unidas, o órgão máximo da Entidade. E este Conselho não decidiu absolutamente nada sobre esse caso. Vai daí que são fake todas as notícias do tipo: ONU manda, determina, exige que Lula participe da eleição; Conselho da ONU decide a favor de Lula, (forçando uma confusão do Comitê com o Conselho, por ignorância ou má fé); decisão do Comitê é obrigatória. Tem mais: O primeiro texto oficial da ONU faz as ressalvas que denunciam indiretamente aqueles fake news. Diz: é importante notar que esta informação, embora seja emitida pelo Escritório das Nações Unidas para Direitos Humanos, é uma decisão do Comitê de Direitos Humanos, formado por especialistas independentes. (Logo) esta informação deve ser atribuída ao Comitê de Direitos Humanos.”. Por que essa ressalva? Óbvio, para deixar claro que não se trata de decisão da ONU, nem do Conselho de Direitos Humanos, nem do Alto Comissariado, muito menos da Assembleia Geral. E isso, claro, faz diferença. Pode-se dizer que o comunicado do Comitê é um primeiro passo para um longo procedimento, inclusive de consultas antes de qualquer decisão conclusiva (...). E, de novo, é um órgão superior descompromissando a ONU da decisão do Comitê. Além do mais, a própria nota do Comitê tem um jeitão de fake News. Por exemplo: pede que o ‘Brasil’ ou ‘Estado brasileiro’ garanta os direitos eleitorais de Lula. De que se trata? Do Executivo? Do Legislativo? Do Judiciário? Todo mundo sabe, ou deveria saber, que o caso está no Judiciário, que é independente e que os demais poderes não podem fazer nada. Logo, o Comitê deveria ter se dirigido ao Judiciário. Mas como não pode fazer isso formalmente, saiu com esse vago ‘Brasil’ ou o ‘Estado’. Mostra que busca repercussão política e não efeitos políticos. Além disso, o Comitê endossa totalmente a tese da defesa de Lula. Diz que o ex-presidente deve ser candidato com plenos direitos, como uma medida liminar, uma cautela – ‘até que todos os recursos pendentes de revisão contra sua condenação sejam completados em um procedimento justo e que a condenação seja final’. Ora todo mundo sabe que, pela decisão vigente do Supremo Tribunal Federal brasileiro, o condenado em e segunda instância vai para a cadeia cumprir pena, mesmo que ainda possa recorrer ao STJ e STF. E atenção: a função do Comitê é supervisionar o cumprimento dos direitos humanos previstos nos diversos tratados patrocinados pela ONU. E em nenhum desses tratados está escrito que cumprir pena depois da segunda instância é uma violação de direitos humanos. Reparem: nenhum tratado internacional condena a execução da pena em segunda instância. Nem em primeira instância – como ocorre em grande parte dos países, assunto que nunca mereceu a atenção do Comitê de Direitos Humanos da ONU.”.
À luz do minudente, objetivo, lúcido e esclarecedor comentário acima transcrito, fica muito cristalina a forma com que uma questão de extrema seriedade e importância é tratada com a maior irresponsabilidade, deixando à mostra as fragilidades e pontos a descoberto, tudo na tentativa de se arranjar escapatória para o cumprimento do ordenamento jurídico brasileiro.
Além do mais, essa tentativa de se buscar proteção de entidade internacional não passa de sentimento explícito de desrespeito às normas jurídicas brasileiras, em clara demonstração de não acatamento às respeitáveis decisões proferidas pelo Judiciário brasileiro, quando compreende que esse recurso à ONU tem o condão de atropelar e menosprezar a soberania da Justiça brasileira, diante da sua competência para o julgamento das demandas e dos recursos pertinentes aos seus julgamentos.
Convém se repisar que o referido Comitê compete atuar em casos onde houver clara constatação da violação dos direitos humanos, conforme explicitado anteriormente, não tendo sido apontado, mesmo que minimamente, qualquer violação, mesmo porque se tivesse alguma teria sido com relação à campanha eleitoral, que é o cerne da recomendação do comitê, mas essa possibilidade inexiste, porque o petista, nos termos da Lei da Ficha Limpa, é totalmente inelegível, não tendo direito a absolutamente nada, nesse sentido, tendo em vista que, no momento, o político é considerado fora da lei.
Já se percebe, como se vê, que o ponto nodal da celeuma cai por terra, porque, conforme afirmação da representante do comitê, a sua atuação somente tem cabimento e se justifica para se exigir a adoção de medidas cautelares, há a necessidade da demonstração de que o Estado está violando, de forma irreparável, alguns dos preceitos do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos.
No caso específico do petista, não existe a mínima violação de coisíssima alguma, porque ele já foi condenado por órgão colegiado da Justiça, ou seja, em segunda instância e, conforme atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, está cumprindo a sanção aplicada a ele, em razão da prática dos graves crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Como corolário, a referida condenação implica o seu enquadramento como político inelegível, nos termos da Lei da Ficha Limpa, o que significa ele é cidadão fora da lei, classificado, no jargão popular, como “ficha-suja”, sem nenhuma condição moral e legal para se candidatar a qualquer cargo público eletivo, quanto mais para o de principal estatura da República.
Diante desses fatos, o petista, a bem da verdade, não tem direito a desfrutar senão da obrigação de cumprir a pena imposta pela Justiça, porque os direitos políticos como candidato ele, infelizmente, não faz jus, não lhe sendo devidos o acesso à imprensa e a membros de seu partido político nem qualquer outra regalia, diferentemente do elencado pelo comitê em causa, de vez que ele é inelegível e jamais deveria ter insistido em ser candidato, por não preencher os requisitos mínimos exigidos de idoneidade e conduta moral, para o exercício de cargo público eletivo.
O Comitê dos Direitos Humanos da ONU pode ter naufragado em uma canoa furada, porque, previamente à sua decisão, era precioso que fosse confirmado qualquer violação dos direitos do petista, que não pode reclamar absolutamente de nada, salvo de perseguição política, mas isso ele não tem como provar, como também não conseguiu provar a sua tão decantada inocência, considerando que a alegação de que não há registro do imóvel no nome dele não tem a menor validade, porque a prisão consiste basicamente na ocultação de patrimônio, que é crime capitulado no Código Penal Brasileiro.
Convém que seja frisado que a sentença condenatória imposta pelo juiz da Operação Lava-Jato também aplicou a pena da perda dos direitos políticos, por oito anos, o que se confirma o enquadramento dele como cidadão inelegível.
A inelegibilidade decorrente da aludida condenação está prevista no artigo 1º, I, e, 1. da  Lei Complementar nº 64/90, com a alteração dada pela Lei Complementar nº 135/2010, que estabelece que a inelegibilidade se aplica aos “que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena(…)”.
A bem da verdade, o petista perdeu, por ter sido condenado, o direito de ostentar a situação de cidadão, previsto em alguns dispositivos constitucionais, por estar com os seus direitos políticos suspensos, de acordo com a Constituição e a legislação infraconstitucional existente sobre a espécie.
Por seu turno, é sabido que a conceituação de direitos políticos tem enorme amplidão, mas uma de das situações diz respeito à questão da elegibilidade, que, no momento, faz falta ao petista e isso o desatento comitê da ONU nem teve condições de perceber, fato que tem como consequência a inépcia ou a inutilidade da sua determinação, recomendação ou orientação, exatamente pela cristalina falta de objeto, qual seja, a candidatura, que é questão de tempo pra ela ser declarada sem validade, justamente com amparo na Lei da Ficha Limpa, que já o enquadrou como inelegível desde o momento do pronunciamento do órgão colegiado de apelação.
Por sua vez, convém se observar e isso não foi feito, que, mesmo que alguma violação fosse constatada, é preciso se avaliar se seria plausível um órgão externo integrante de organismo internacional, mesmo integrante da ONU, que teria poder máximo e distanciado de mero comitê, teria algum poder de sobrepor decisão ao Estado brasileiro, passando por cima das normas do Direito Internacional, como se o Brasil fosse mera republiqueta.
Impende se ressaltar que toda essa mixórdia internacional teve a iniciativa de quem preferiu cometer grave erro de desrespeitar o Poder Judiciário brasileiro, ao levar a matéria em causa ao referido comitê, antes de esgotados os recursos legais da alçada da Justiça brasileira, permitindo que mero órgão colaborador da ONU para apenas acompanhar o cumprimento dos tratados de direitos humanos se ache no direito de impor medidas absurdas, levianas e descabidas, ante a constatação da absoluta legitimidade com que o caso do petista vem sendo analisado e julgado pelo Judiciário do Brasil.
Espera-se que o Poder Judiciário brasileiro, nos termos da sua independência institucional, preste as devidas informações ao Comitê de Direitos Humanos da ONU sobre a legitimidade acerca dos procedimentos adotados com relação ao autor da demanda em causa, em especial no sentido de que, na forma da Lei da Ficha Limpa, ele se tornou inelegível desde o julgamento da segunda instância, tendo perdido os direitos políticos e a condição de se candidatar a cargo público eletivo, e que, na forma do ordenamento jurídico brasileiro, estão sendo propiciados a ele os direitos à ampla defesa e ao contraditório, caso em que a sua prisão assenta-se no entendimento jurídico prevalente, não havendo qualquer violação aos direitos políticos nem humanos. Acorda, Brasil!
Brasília, em 19 de agosto de 2018

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