sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Justa manifestação de repúdio

Um grupo de generais da reserva do Exército, que atingiram o posto máximo da hierarquia militar, todos eles com reconhecido prestígio na participação ou no comando do regime militar, compreendido o período entre 1964 a 1985, divulgou, no final de setembro último, manifesto de repúdio ao ministro da Defesa, a par de fazer duras críticas à atuação da Comissão Nacional da Verdade, com esclarecimentos de que o Exército, a Marinha e a Aeronáutica não devem qualquer pedido de desculpas pelos crimes cometidos no aludido regime.
Eles disseram que "Abominamos peremptoriamente a recente declaração do senhor ministro da Defesa à Comissão Nacional da Verdade de que as Forças Armadas aprovaram e praticaram atos que violaram direitos humanos no período militar".
Trata-se de manifesto em resposta a ofício encaminhado pelo ministro da Defesa à Comissão Nacional da Verdade, admitindo pela primeira vez que as Forças Armadas não têm condições de negar a ocorrência de mortes, torturas e desaparecimentos durante a ditadura, tendo por base ofícios dos comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, que disseram que não dispõem de provas para afirmar ou negar fatos como a ocorrência de crimes e assassinatos em unidades militares.
Por seu turno, os membros da mencionada comissão consideraram insuficiente a manifestação das Forças Armadas.
O manifesto diz que a violência no período da ditadura partiu da esquerda armada, nestes termos: "Vivíamos uma época de conflitos fratricidas, na qual erros foram cometidos pelos dois lados".
Os militares ressaltam que a citada comissão "açula" as Forças Armadas ao investigar somente os crimes cometidos pelo Estado e que "Temos orgulho do passado e do presente de nossas Forças Armadas. Se houver pedido de desculpas será por parte do ministro. Do Exército de Caxias não virão! Nós sempre externaremos a nossa convicção de que salvamos o Brasil!".
Com relação ao manifesto dos generais, a presidente da República afirmou que haverá posicionamento do Estado brasileiro, sem dar detalhes, e que "Acredito piamente na democracia. Acredito que as leis em um Estado democrático de direito são para serem cumpridas. Quem não quiser pedir, não peça. Agora, haverá um posicionamento do Estado brasileiro. Quando a lei (que criou a Comissão da Verdade) foi aprovada, estavam todos os ex-presidentes do período democrático. Permito-me não responder a essa pergunta, só dizer que vivemos em uma democracia e as leis serão sempre cumpridas".
A presidente não tem razão quando afirma que as serão sempre cumpridas, a começar por essa que criou a comissão em apreço, porquanto, conforme dispõe o seu art. 1o, a finalidade do seu trabalho se destina ao exame e ao esclarecimento das graves violações de direitos humanos praticadas no período fixado no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (entre 1964 a 1985), a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional, ou seja, o texto legal não exclui as graves violações de direitos humanos e as barbáries protagonizadas pelos terroristas, guerrilheiros e afins, fato que contraria frontalmente a declaração da mandatária do país, que afirmou, ipsis litteris: “Acredito que as leis em um Estado Democrático de Direito são para serem cumpridas”.
No caso, a presidente comete crime de responsabilidade por sancionar a lei e não exigir, como é do seu dever, o fiel cumprimento da norma jurídica, na extensão de seus termos, como forma de produzir os fins colimados de revelar a verdade, doa quem doer, porque realmente, no Estado Democrático de Direito, não se pode ficar todo tempo enganando a sociedade com meias verdades e meias mentiras, como nesse caso, em que os crimes dos opositores ao regime militar sequer foram levantados e jamais serão abordados ou relatados, ficando a mácula do descumprimento da lei de regência, cujo resultado das investigações, ao contrário do espírito da lei, teve o condão de apenas promover desarmonizar no seio onde já se encontrava reconciliado.
Caso houvesse realmente o cumprimento das leis neste país, principalmente pelos juristas que compõem a mencionada comissão, o exame e o esclarecimento sobre as graves violações de direitos humanos abrangeriam necessariamente os crimes perpetrados pelos terroristas, guerrilheiros, assaltantes, sequestradores e assassinos, não os protegendo como se fossem heroicos defensores senão da implantação no país do tenebroso e temível regime comunista, porém eles ficaram incólumes, como se seus horrendos crimes não integrassem a parte triste da história que abrangeu o regime militar.
A situação configurada pela citada comissão, além de evidenciar brutal discriminação contra os militares das Forças Armadas, por somente apurar casos envolvendo-os, deixando de fora as violações igualmente recrimináveis dos terroristas e assemelhados, o que motiva a justa insatisfação não somente dos militares, mas, sobretudo, da sociedade, que não entende as razões pelas quais, em pleno século XXI, com os avanços da humanidade, ainda existam mentalidades atreladas visivelmente ao revanchismo e ao revide, como se isso contribuísse para mudar a verdade sobre os acontecimentos, que foram lamentáveis, mas ninguém tem o direito de omiti-los sem justificativa plausível, apenas na tentativa de acobertar a culpa dos terroristas e assemelhados por seus violentos crimes.
Os brasileiros têm o dever cívico de repudiar, com veemência, a parcialidade intencional, em claro arrepio da norma insculpida na lei de regência, por apenas haver apuração e esclarecimento sobre os fatos envolvendo os militares das Forças Armadas, quando o correto teria sido o cumprimento integral do dispositivo legal, que estabelece a sua abrangência no período de 1964 a 1985, não fazendo exceção às graves violações de direitos humanos praticadas, nesse período, por quem quer que seja, muito menos os facínoras terroristas, que têm parcela de culpa pelos graves crimes cometidos contra a sociedade, os quais não poderiam ficar sob a omissão do Estado, porque isso denuncia, de forma cristalina, a falta de seriedade e de dignidade das autoridades responsáveis pelas questionáveis apurações. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 30 de outubro de 2014

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