quarta-feira, 11 de julho de 2018

Herói nacional?

A assessoria do maior político brasileiro divulgou vídeo em que ele se compara a Tiradentes, o notável mártir da Inconfidência Mineira. 
No vídeo, o político afirma que "o herói não foi o cara que enforcou o Tiradentes. O enforcado é que virou o herói".
O político afirma também que entrará para a história como o presidente que mais fez pelo Brasil, mas "Não sei se eles vão entrar para a história como juízes ou algozes", em referência aos juízes das primeira e segunda instâncias, que o condenaram.
O político se encontra preso desde 7 de abril último, na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba (PR), em cumprimento à condenação de doze anos e um mês de prisão, em razão dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, referentes ao caso do tríplex do Guarujá, litoral de São Paulo.
Como é notório, normalmente, o mártir é alguém como o Tiradentes, que foi submetido a extremos sacrifícios, torturas, outras agressões físicas ou até mesmo à morte, por um ideal nobre em benefício da sociedade, a exemplo do que aconteceu com o inconfidente mineiro.
Nosso herói nacional, o mártir Tiradentes foi bárbara e cruelmente sacrificado por ter se insurgido contra a decretação da derrama, uma medida administrativa que permitia a cobrança forçada de impostos, que foram chamados pelo “quinto”, que correspondia a 768 arrobas de ouro em impostos atrasados, mesmo que isso fosse preciso prender o contribuinte, cuja medida tinha a incumbência do então novo governador da Capitania controlada por Portugal.
Agora, convenhamos, parece muito estranho que alguém se autointitule herói ou mártir, pasmem, somente porque foi condenado à prisão e se encontra encarcerado, em decorrência da prática dos mencionados crimes, cuja autoria sobre os fatos denunciados à Justiça não foram justificados na forma legal, por meio de provas juridicamente válidas.
Como é sabido, não bastava somente a declaração de que o acusado não é proprietário do imóvel em questão, diante da falta de registro cartorial, porque esse fato a Justiça tinha plena ciência, visto que o cerne da querela judicial envolve o crime de ocultação de patrimônio, com base em testemunhas, fotografias, documentos, demonstrativos e planilhas referentes a despesas, com fortes vinculações do acusado e seus familiares com o bem objeto da demanda judicial.
Não há a menor dúvida de que a comparação com mártir histórico, herói nacional, de político que é considerado e cognominado pelo Ministério Público Federal o comandante de organização criminosa que, em cujo governo, conseguiu promover aparelhamento da Petrobras, para desviar recursos da petrolífera, com destinação para o financiamento de projetos pessoais e político-partidários, não tem o menor cabimento, em termos de bom senso, razoabilidade e plausibilidade.
Diante do lamentável e triste momento da sua vida pública, que seria melhor compreendida se ele tivesse, ao contrário da jactância, a singeleza, a grandeza e a sensatez de confessar, admitir e reconhecer as suas falhas, evidentemente abdicando de seus sonhos e projetos políticos, porque estes já se perderam nos torvelinhos e no lamaçal da podridão tecida nas entranhas das ideologias degenerativas que resultaram na sua própria imagem política, que ainda persiste com base em inexplicável e arraigado fanatismo construído por meio de estratégia e marketing sem fundamento plausível e sustentável.
Trata-se de monstruosa irracionalidade que alguém nessas condições de indiscutível decadência política tenha a insensibilidade de se autodenominar mártir da pátria, quando seria muito mais condizente com a realidade fática se o político tivesse a sensatez de se autointitular traidor da pátria, em razão da sentença condenatória que foi prolatada com base nas provas consubstanciadas na materialidade da autoria dos fatos objeto da denúncia de que trata o caso do tríplex, tendo em vista que mais de vinte advogados renomados, todos da maior competência jurídica, não conseguiram produzir defesa à altura dos fatos, com capacidade e suficiência para se infirmar os fatos pelos quais o político foi condenado à prisão.  
O simples fato de o político se considerar o presidente que mais fez pelo Brasil não significa que ele possa se autopromover ao honroso título de herói nacional nem se imaginar que tem sido tratado como injustiçado ou vítima por algozes, porque é preciso que ele entenda de vez por todas que, se a sua gestão foi considerada exitosa por ele, houve nela tão somente o cumprimento da obrigação de administrar a coisa pública na melhor forma, em consonância com o dever de bem exercer o cargo público eletivo para o qual se comprometeu, o que não significa que isso mereça tratamento diferenciado, especial ou cousa que o valha, nem por parte da Justiça e muito menos diante do ordenamento jurídico, que tem como princípio fundamental de que os brasileiros são iguais em obrigações e direitos perante a lei, o que vale dizer que ninguém está acima da lei e muito menos poder ser merecedor do privilégio de deixar de ser julgado pela Justiça, na forma da lei.
É preciso que os brasileiros se conscientizem de que o que houve no governo do político preso foi exclusivamente a priorização de políticas públicas com a distribuição de renda entre os pobres, no âmbito do dever do Estado de suprir as carências das famílias carentes, em forma de assistência social, que tem sua importância social, mas é inegável e incontestável que essa forma de sistema extremamente populista teve o perverso viés oportunista objetivando à formação da consciência desse povo de que somente ele teria sido capaz de enxergar a pobreza, carência e miséria.
É evidente que não fosse a estratégia muito bem planejada e executada da formação de currais eleitorais, como forma de recompensa pelo fomento das políticas assistencialistas, certamente que os mais de cinquenta milhões de brasileiros não estariam sendo mantidos em programas que não produzem nem contribuem para o desenvolvimento socioeconômico, porque o governante com o mínimo de competência e eficiência administrativa teria priorizado, em concomitância aos programas assistencialistas, outros que privilegiassem investimentos que resultassem na industrialização e desenvolvimento econômico nas regiões Norte e Nordeste, como forma natural da indispensável criação de empregos e da diminuição dos encargos onerosos dos programas meramente assistencialistas, que são mantidos em condições de notória precariedade, à vista da falta de controle e fiscalização quanto à efetividade da sua execução, quando se sabe que há muitos beneficiários que não se enquadram nas exigências previstas na legislação de regência, conforme, vez por outra, é denunciado por auditoria do próprio governo.
Ademais, o simples fato de alguém se considerar herói nacional já é mais do que sintomático de que o resultado da sua gestão tem sido mostrado como se fosse algo extraordinário, quando análise sem exagero indica apenas que a sua administração pode ter sido uma das piores e extremamente prejudiciais aos interesses nacionais, notadamente porque, tirante a preocupação com a distribuição de renda, não houve a realização de obras públicas de destaque.
A bem da verdade, ressalve-se a transposição do Rio São Francisco, que apenas teve início no seu governo e se arrasta até quando, consumindo rios de recursos públicos, e também deixaram de ser promovidas as tão necessárias e prometidas reformas das conjunturas e estruturas do Estado, quando, ao contrário, verificou-se o turbinamento da máquina pública, com a criação de mais de 40 empresas públicas, que dão bilhões de prejuízos aos cofres públicos, o aumento de mais de dez ministérios, o vertiginoso crescimento da quantidade de servidores públicos, passando de 35 mil para 105 mil, entre outras precariedades que contribuíram para que o país apenas regredisse e contabilizasse rombos extraordinários nas contas públicas, em razão das mazelas.
Uma questão que precisa ser chamada a atenção dos brasileiros diz respeito aos financiamentos concedido dos governos anteriores, para que países normalmente comandados por ditadores, a exemplo de Cuba, Venezuela, nações africanas, entre outras, realizassem importantes obras com recursos oriundos do suor dos contribuintes brasileiros, normalmente a fundo perdido, como no caso da Venezuela, que, recentemente, deu calote ao Brasil, deixando de pagar a sua dívida e obrigando que o Tesouro brasileiro fosse recomposto com recursos do Seguro Desemprego, conforme Medida Provisória convertida em lei pelo Congresso Nacional.
Certamente que nenhum herói nacional seria capaz de financiar obras no exterior, quando o Brasil ressente das mesmas obras e de outras importantes à satisfação das imperiosas necessidades de serviços públicos, que não foram implementados por falta de recursos, mas para aqueles países não faltaram dinheiro, que foram liberados com a ajuda do principal político brasileiro, que, a troco de palestras milionárias, em valores superiores a trinta milhões de reais, fazia as vezes de lobista, para facilitar a concessão desses empréstimos a governos estrangeiros, ou seja, o político se aproveitava dessa sistemática de negociação entre empreiteiras brasileiras, principalmente a Odebrecht, e nações cujos presidentes eram da sua relação de amizade, em que a sua influência ajudava a liberar os recursos junto ao BNDES, segundo revelação da força-tarefa da Operação Lava-Jato.
É evidente que os idólatras não enxergam nessas transações espúrias e inescrupulosas nenhuma irregularidade, embora seja cristalina a forma nada republicana de se emprestar dinheiro dos brasileiros para o exterior, quando tais recursos deveriam ser primacialmente investidos em obras para o usufruto dos brasileiros, que são extremamente carentes daquelas obras públicas construídas fora do país.     
A verdade é que os brasileiros precisam se conscientizar de que convém que não seja visto somente caso que pode ter sido importante na gestão do político preso, porque os fatos prejudiciais que foram implementados ou deixaram de ser realizados precisam ser também sopesados, como forma de avaliação sobre o conjunto da obra, sem desmerecer o que foi realizado, mas sobrelevando o tanto daquilo que poderia ter sido feito em benefício do país e dos brasileiros.
Veem-se um líder extremamente capenga, que insiste em ser reconhecido como herói nacional, tão somente enaltecendo algo que possivelmente teria feito senão no contexto da normalidade e da obrigatoriedade do exercício do mandato popular, por força do dever de trabalhar em benefício exclusivamente do povo que o elegeu, sem qualquer forma de recompensa, que tem sido cobrada, de forma reiterada e exaustiva,  sempre que se refere ao mandato, sem ter a sensibilidade ínsita e indissociável dos grandes estadistas do apego ao princípio da humildade de também reconhecer suas fragilidades e falhas, absolutamente normais nas atividades político-administrativas.
Os fatos nebulosos passam ao largo de quem pretende alçar ao pedestal dos heróis nacionais, justamente porque não faz o menor sentido se comentar ou até mesmo, embora imprescindível, sobre a corrupção endêmica e sistêmica enraizada no famigerado petrolão, conforme exaustivamente dissecado pela Operação Lava-Jato, tendo por base dezenas, centenas, de delações premiadas, investigações da Polícia Federal e do Ministério Público, entre outros elementos de prova da ladroagem, que resultaram até o momento  em condenações penais de diversos inescrupulosos lideranças partidárias, políticos, executivos, empresários e outros ladrões assemelhados, todos com a marca indelével da escrachada roubalheira disseminada contra o patrimônio público.
A verdade é que, à luz da moralidade e da dignidade públicas, os fatos concentrados nas irregularidades e corrupção que sufocaram a administração do país, que são absolutamente reais e inquestionáveis, não somente justificariam, de forma inapelável e inexorável, pesadas e exemplares condenações às pessoas envolvidas, como instrumento extremamente necessário em uma República com o mínimo de decência e seriedade, nas circunstâncias, para servir de importante lição às gerações de políticos, mas em especial para a eliminação, em definitivo, do cenário político não apenas deles, mas dos partidos políticos a quem eles são filiados, considerando que é terminantemente imprópria a filiação de criminosos a agremiações, conquanto as suas saudáveis finalidades estatutárias não contemplam situação de clara degeneração das atividades político-partidárias.
Os brasileiros precisam se indignar, com o máximo de veemência, contra político que perde o raciocínio lógico, a compostura e a polidez em se autovangloriar como o melhor presidente da história republicana, só por ter liderado a potencialização da distribuição de renda de forma prioritária, embora, não por isso, mas por notória incompetência administrativa, os demais programas de governo não tiveram nenhum ganho em termos de desenvolvimento alcançado na sua gestão, que não passou de verdadeiro voo de galinha, porque o pseudo crescimento sumiu no desastrado governo seguinte, que ficou marcado com a recessão econômica, o desemprego, as altas taxas de juros, entre tantas outras mazelas e precariedades que constituíram triste e lamentável legado para os brasileiros.
 Convém que os brasileiros conscientes sobre os verdadeiros significados dos princípios republicanos pertinentes à ética, à moralidade, ao decoro, à dignidade, à transparência e principalmente à extensão da idoneidade na gestão dos recursos públicos, demonstrem amor ao Brasil, ao se expressarem em extremado repúdio aos péssimos políticos que foram alçados, pelo sufrágio universal, aos píncaros do poder e dele conseguiram sugar o tanto que puderam em benefício próprio e de seu grupo político, tendo por objetivo a absoluta dominação das classes política e social, além da tentativa da permanência no poder, por meio do qual foram exercidas espúrias influências em todas as esferas da administração direta e indireta da República, conforme mostram as investigações e os levantamentos realizados pela Operação Lava-Jato, que desvendou e mostrou os caminhos percorridos pelas sujeiras entranhadas na administração do país. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
          Brasília, em 11 de julho de 2018

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