sábado, 21 de julho de 2018

Por que intervenção militar?



O sábio e inteligente irmão Ditinho Minervino, demonstrando irrequieto incômodo com relação à imensurável insensibilidade dos homens públicos, que, em princípio, seriam eleitos para bem representar o povo, mas os péssimos exemplos deles dão conta de que eles são autênticos representantes de si mesmos, à vista do histórico de abuso quanto aos gastos em seu benefício, houve por bem indagar o seguinte: “Mais quando se fala que a solução é INTERVENÇÃO MILITAR é tanta gente se manifestando contra. Resta saber é, com o sistema político existente, quem será capaz de consertar esses desmandos?
Em princípio, o aludido questionamento até parece ter pertinência, não fossem os entraves de ordem constitucional e legal, à vista da imperiosa necessidade do respeito aos princípios republicano e democrático, que são fundamentais para o equilíbrio das relações político-sociais.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 elegeu como a base da democracia o respeito ao Estado Democrático de Direito, como forma político-institucional de Estado, com a previsão da possibilidade de intervenção militar, com o emprego das Forças Armadas, que consistem do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, e somente pode ocorrer nos seguintes casos: I - intervenção federal; II - Estado de Defesa; III - Estado de Sítio.
Sob a égide do Estado Democrático de Direito, a forma de intervenção militar, sempre com o emprego das Forças Armadas, somente ocorrerá sob o entendimento dos poderes constituídos, depois de aprovada por conselho de Estado, formado por membros dos Poderes Executivo e Legislativo, com a devida supervisão do Poder Judiciário, como forma de se autenticar juridicamente o ato intervencional  
As formas de intervenção militar estão previstas na Carta Magna, exatamente na parte que trata “Da defesa do Estado e Das Instituições Democráticas, Do Estado de Defesa e do Estado de Sítio”, vistas no delineamento das medidas capazes de garantir a estabilidade institucional, mantenedora da ordem pública e da paz social no país.
Com essa finalidade, o artigo 136 da Constituição define o que seja o Estado de Defesa, nestes termos: “O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.”.
Com a aquiescência dos membros desses conselhos, fica autorizada a intervenção militar circunstancial em algum município ou estado da federação, que tem a denominação de intervenção federal.
Em se tratando de casos de maior gravidade, a Constituição prevê a possibilidade da decretação do estado de sítio, ex-vi do disposto no art. 137, nestes termos: “O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de: I – comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa; II - declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira.
À toda evidência, o Estado de Sítio configura o recurso mais extremo que o regime democrático se impõe a adotar, evidentemente nas circunstâncias absolutamente no âmbito da normalidade democrática, tendo por base disposição constitucional contextualizada.
A Constituição também dispôs de importante capítulo de ordem democrática, ao estabelecer, no seu art. 142, o papel primordial das Forças Armadas, dizendo que, verbis: “As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.”.
Como se vê, a intervenção militar tem a serventia de ser mediadora com a autoridade das Forças Armadas, ainda sob a égide do Estado Democrático de Direito, de situações específicas previstas na Constituição, a qual não pode substituir as funções próprias do Estado, que tem a competência maior de governo e comando da nação, no âmbito dos princípios democráticos, o que significa dizer que somente nas republiquetas a população menos informada e esclarecida tem a pretensão de pensar que a intervenção militar pode ser empregada para solucionar as crises do Estado..
A bem da verdade, o regime militar, implantada a partir de março de 1964, não teve as características de intervenção militar prevista com fundamento constitucional, mas sim verdadeira ação com objetivos claros e insofismáveis convicções políticas das Forças Armadas de combate aos comunistas, que pretendiam transformar o Brasil em país socialista, a exemplo da ilha caribenha.
O fato é que as ações dos militares de 1964 foram além de intervenção militar democrática, posto que eles conseguiram subverter e subordinar a Constituição e as instituições, por meio de atos contrários aos princípios constitucionais e democráticos.
Enfim, a intervenção militar tem como destinação constitucional tão somente para o uso das forças militares, basicamente o Exército, a Marinha e a Aeronáutica, para o controle de determinada situação que deveria ser de responsabilidade de outro tipo de força ou autoridade, que perdeu a sua competência para atuar e solucionar o problema de que se trata. 
Normalmente, nestes casos, a intervenção militar se justifica em situações particulares e específicas, à vista do entendimento de que isso é imprescindível, apenas nas circunstâncias, como por exemplo, a intervenção localizada na segurança pública do Estado do Rio de Janeiro, em que o governo estadual já demonstrou totais negligência e incompetência administrativas para o combate à criminalidade, que tomou conta daquele estado. 
Por seu turno, a intervenção militar ao arrepio da Constituição caracteriza golpe de Estado, por ter por objetivo o controle dos poderes do país, compreendendo o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, ou seja, trate-se de clara e efetiva maneira inconstitucional e ilegal de derrubar o governo constitucionalmente legitimado pelo voto popular. 
É evidente que longe de ter condições de responder, de forma cabal e a contento, a oportuna indagação do amigo Ditinho Minervino, digo que, no âmbito do sistema político atual, o povo teria as melhores condições para consertar esses desmandos e a desmoralização preponderantes no seio da classe política brasileira, considerando que os homens públicos, os lídimos representantes do povo são a imagem e a semelhança dele, que emana o poder e em seu nome será exercido, ou seja, se o povo criar vergonha na casa e se dignar a escolher com base em critérios, no mínimo, de idoneidade, conduta moral e compromisso de trabalhar em defender a população, i.e., em do interesse púbico, entre outros predicativos próprios e peculiares, é bem possível que não haverá motivos  para que haja falha na escolha dos representantes políticos e certamente será esquecida para sempre essa terrível ideia de intervenção militar.  
Diante do exposto, fica muito claro que a intervenção militar defendida por muitas pessoas não pode, em sã consciência, merecer a ressonância dos brasileiros, porque a sua índole refoge aos sentimentos e princípios republicano e democrático, consistentes nas plenas liberdades de expressão e pensamento, em que o povo tem a centralidade da vontade e do exercício dos poderes individuais, com o usufruto do direito de eleger livremente seus representantes políticos, enquanto a intervenção militar tem o sentido casuístico, circunstancial, evidente fora da normalidade democrática, embora o seu instituto esteja capitulado na Lei Maior do país e quiçá o emprego dele nunca seja preciso, porquanto o Estado Democrático de Direito somente se aperfeiçoa por meio da vontade soberana do povo, que, quanto mais esclarecido, somente aceita remotamente a intervenção militar estritamente nos casos previstos na Constituição Federal. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 21 de julho de 2018

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