O sábio e inteligente irmão Ditinho Minervino,
demonstrando irrequieto incômodo com relação à imensurável insensibilidade dos
homens públicos, que, em princípio, seriam eleitos para bem representar o povo,
mas os péssimos exemplos deles dão conta de que eles são autênticos representantes
de si mesmos, à vista do histórico de abuso quanto aos gastos em seu benefício,
houve por bem indagar o seguinte: “Mais
quando se fala que a solução é INTERVENÇÃO MILITAR é tanta gente se
manifestando contra. Resta saber é, com o sistema político existente, quem será
capaz de consertar esses desmandos?
Em princípio, o aludido questionamento até
parece ter pertinência, não fossem os entraves de ordem constitucional e legal,
à vista da imperiosa necessidade do respeito aos princípios republicano e
democrático, que são fundamentais para o equilíbrio das relações
político-sociais.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988
elegeu como a base da democracia o respeito ao Estado Democrático de Direito, como
forma político-institucional de Estado, com a previsão da possibilidade de intervenção
militar, com o emprego das Forças Armadas, que consistem do Exército, da Marinha
e da Aeronáutica, e somente pode ocorrer nos seguintes casos: I - intervenção federal;
II - Estado de Defesa; III - Estado de Sítio.
Sob a égide do Estado Democrático de Direito, a
forma de intervenção militar, sempre com o emprego das Forças Armadas, somente
ocorrerá sob o entendimento dos poderes constituídos, depois de aprovada por
conselho de Estado, formado por membros dos Poderes Executivo e Legislativo,
com a devida supervisão do Poder Judiciário, como forma de se autenticar juridicamente
o ato intervencional
As
formas de intervenção militar estão previstas na Carta Magna, exatamente na
parte que trata “Da defesa do
Estado e Das Instituições Democráticas, Do Estado de Defesa e do Estado de
Sítio”, vistas no delineamento das medidas capazes de garantir a
estabilidade institucional, mantenedora da ordem pública e da paz social no
país.
Com
essa finalidade, o artigo
136 da Constituição define o que seja o Estado de Defesa,
nestes termos: “O Presidente
da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para
preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e
determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e
iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de
grandes proporções na natureza.”.
Com
a aquiescência dos membros desses conselhos, fica autorizada a intervenção
militar circunstancial em algum município ou estado da federação, que tem a
denominação de intervenção federal.
Em
se tratando de casos de maior gravidade, a Constituição prevê a possibilidade
da decretação do estado de sítio, ex-vi do disposto no art. 137, nestes termos:
“O Presidente da República
pode, ouvidos o Conselho
da República e
o Conselho
de Defesa Nacional,
solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos
casos de: I – comoção
grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia
de medida tomada durante o estado de defesa; II - declaração de estado de guerra
ou resposta à agressão armada estrangeira.
À
toda evidência, o Estado de Sítio configura o recurso mais extremo que o regime
democrático se impõe a adotar, evidentemente nas circunstâncias absolutamente
no âmbito da normalidade democrática, tendo por base disposição constitucional
contextualizada.
A
Constituição também dispôs de importante capítulo de ordem democrática, ao
estabelecer, no seu art. 142, o papel primordial das Forças Armadas, dizendo
que, verbis: “As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército
e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na
hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da
República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes
constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.”.
Como
se vê, a intervenção militar tem a serventia de ser mediadora com a autoridade
das Forças Armadas, ainda sob a égide do Estado Democrático de Direito, de
situações específicas previstas na Constituição, a qual não pode substituir as
funções próprias do Estado, que tem a competência maior de governo e comando da
nação, no âmbito dos princípios democráticos, o que significa dizer que somente
nas republiquetas a população menos informada e esclarecida tem a pretensão de pensar
que a intervenção militar pode ser empregada para solucionar as crises do
Estado..
A
bem da verdade, o regime militar, implantada a partir de março de 1964, não teve
as características de intervenção militar prevista com fundamento constitucional,
mas sim verdadeira ação com objetivos claros e insofismáveis convicções
políticas das Forças Armadas de combate aos comunistas, que pretendiam
transformar o Brasil em país socialista, a exemplo da ilha caribenha.
O
fato é que as ações dos militares de 1964 foram além de intervenção militar
democrática, posto que eles conseguiram subverter e subordinar a Constituição e
as instituições, por meio de atos contrários aos princípios constitucionais e
democráticos.
Enfim,
a intervenção militar tem como destinação constitucional tão somente para o uso das forças militares, basicamente o Exército,
a Marinha e a Aeronáutica, para o controle de determinada situação que deveria
ser de responsabilidade de outro tipo de força ou autoridade, que perdeu a sua
competência para atuar e solucionar o problema de que se trata.
Normalmente,
nestes casos, a intervenção militar se justifica em situações particulares e
específicas, à vista do entendimento de que isso é imprescindível, apenas nas
circunstâncias, como por exemplo, a intervenção localizada na segurança pública
do Estado do Rio de Janeiro, em que o governo estadual já demonstrou totais negligência
e incompetência administrativas para o combate à criminalidade, que tomou conta
daquele estado.
Por
seu turno, a intervenção militar ao arrepio da Constituição caracteriza golpe
de Estado, por ter por objetivo o controle dos poderes do país, compreendendo o
Legislativo, o Executivo e o Judiciário, ou seja, trate-se de clara e efetiva
maneira inconstitucional e ilegal de derrubar o governo constitucionalmente legitimado
pelo voto popular.
É evidente que longe de ter condições de
responder, de forma cabal e a contento, a oportuna indagação do amigo Ditinho
Minervino, digo que, no âmbito do sistema político atual, o povo teria as
melhores condições para consertar esses desmandos e a desmoralização preponderantes
no seio da classe política brasileira, considerando que os homens públicos, os
lídimos representantes do povo são a imagem e a semelhança dele, que emana o poder
e em seu nome será exercido, ou seja, se o povo criar vergonha na casa e se
dignar a escolher com base em critérios, no mínimo, de idoneidade, conduta
moral e compromisso de trabalhar em defender a população, i.e., em do interesse
púbico, entre outros predicativos próprios e peculiares, é bem possível que não
haverá motivos para que haja falha na
escolha dos representantes políticos e certamente será esquecida para sempre
essa terrível ideia de intervenção militar.
Diante
do exposto, fica muito claro que a intervenção militar defendida por muitas pessoas
não pode, em sã consciência, merecer a ressonância dos brasileiros, porque a
sua índole refoge aos sentimentos e princípios republicano e democrático, consistentes
nas plenas liberdades de expressão e pensamento, em que o povo tem a
centralidade da vontade e do exercício dos poderes individuais, com o usufruto
do direito de eleger livremente seus representantes políticos, enquanto a
intervenção militar tem o sentido casuístico, circunstancial, evidente fora da
normalidade democrática, embora o seu instituto esteja capitulado na Lei Maior
do país e quiçá o emprego dele nunca seja preciso, porquanto o Estado
Democrático de Direito somente se aperfeiçoa por meio da vontade soberana do
povo, que, quanto mais esclarecido, somente aceita remotamente a intervenção militar
estritamente nos casos previstos na Constituição Federal. Acorda, Brasil!
ANTONIO
ADALMIR FERNANDES
Brasília,
em 21 de julho de 2018
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