terça-feira, 3 de julho de 2018

Inveja de péssimos exemplos?


Um professor de Direito Constitucional da USP e ex-governador de São Paulo disse, se referindo ao caso do principal político brasileiro, que se encontra preso, que “Já vivi muitas situações difíceis, como na ditadura, mas nunca vi nada tão imoral”.
O atual momento político foi interpretado e classificado por ele exatamente nestes termos: “A constituição passou a ser algo absolutamente secundário. É ingenuidade pensar que ela ainda existe”.
O mencionado professor se reuniu com juristas para defender a liberdade do líder-mor petista e o seu direito de se candidatar à Presidência da República, tendo demonstrado sua perplexidade com a atuação do Poder Judiciário, que a classificou como violenta e inconstitucional.
A violação do princípio da presunção da inocência, que culminou com a prisão do político em segunda instância, porque, para ele, trata-se de exemplo claro da despreocupação do judiciário com os direitos humanos e constitucionais.
O professor disse, em tom de desabafo, que “É tão claro o que diz a constituição e tão violento o que o que fez o Supremo Tribunal Federal (STF), que não temos como reagir. Somos muito fracos perante um poder que encerrou em si mesmo os Três Poderes contra a sociedade”.
Ele classificou como heroica a atuação dos advogados do político, porém acredita que a vitória nos tribunais é praticamente impossível, porque “A inveja da minoria branca é imensa. Não há como tirá-lo de Curitiba. Confesso a minha profunda angústia”.
O professor entende que a saída para “esse cenário macabro que estamos vivendo” deveria se dar pela conscientização e a movimentação da sociedade.
O ex-governador se mostrou pessimista, ao afirmar: “Mas como, se os meios de comunicação estão nas mãos dos Três Poderes, e fazem dos Três Poderes um mero instrumento? Sou conservador, mas não sou burro.
Quando o professor ainda ocupava o governo de São Paulo, em 2006, ele afirmou que o petista, então presidente do país, “representava a consolidação da democracia brasileira, na medida em que afastou do país as grandes diferenças sociais.”.
O professor se posicionou contrário ao impeachment da petista, que o comparou aos golpes militares dos anos 60.
          Na ocasião, ele disse que o PSDB queria “derrubar o governo a qualquer custo”, por não se conformar com a derrota nas urnas, porque “A elite branca está furiosa. Não entendeu que o Brasil mudou, por isso está perdida“.
Em manifestação anterior, o professor já havia se posicionado contra a prisão do petista, tendo assinalado que “Eu acho que o Lula errou. Ele deveria ter ido para uma Embaixada. Um líder não se entrega. Ele aceitou uma injustiça que fizeram com ele”.
A mentalidade do professor é tão evoluída que ele qualifica de heroica a atuação dos defensores do político e, nesse ponto, é preciso dar a mão à palmatória, porque ele se mostra tão seguro do que afirma, nesse particular e nas demais colocações, pelo simples fato de que os causídicos do político, até o momento e durante o curso do julgamento desse imbróglio, não conseguiu ganhar, na Justiça, nenhum caso relevante em benefício de seu constituído, o que evidencia que as suas indignações não passam de insatisfação vazias e destituídas de qualquer sentimento jurídico e muito menos constitucional, mesmo ele sendo catedrático em Direito Constitucional, porque a presunção de inocência não foi tolhida ao petista, porquanto esse direito permanece sendo exercido por ele, conforme mostram os fatos.
Causa estrondoso estarrecimento se imaginar que tal princípio da presunção de inocência só se aplica aos criminosos ricaços, aos bandidos de colarinho branco, porque é o que se deflui do sentimento do professor e isso se mostra ultrajante, quando se percebe que esse princípio, existente desde a Constituição de 1988, tem sido pouco ou nunca questionado, em razão da prisão do condenado a partir da segunda instância, mas somente agora ele vem à tona, justamente por envolver um ex-presidente da República, que tem merecido adequado tratamento, nos termos constitucionais, que asseguram o direito à presunção de inocência, que não tem nada a ver, ou seja, nenhuma vinculação com a indispensabilidade de prisão.
A propósito, é importante que o professor de Direito Constitucional faça recapitulação sobre a possibilidade das prisões cautelar e preventiva, com previsão em sede constitucional, mesmo que o denunciado sequer ainda responda a processo formalizado de culpa, i.e., nem mesmo tendo ainda sido julgado, quanto mais o criminoso já tendo sido condenado à prisão, por mais de doze anos, sem mais qualquer direito de recorrer nas instâncias próprias e exclusivas da Justiça, no caso, as primeira e segundo, onde as defesas, em forma de contra-argumentações, provas e documentos, foram inabilitadas em confronto com os elementos denunciados e investigados, que serviram de base para a elaboração das sentenças condenatórias, da lavra de quatro magistrados, que, por unanimidade, se manifestaram nos autos.
Causa espécie a veemência com que o professor defende importante político, com tanta garra até então não demonstrada com relação aos criminosos “pés-rapados”, os   que são lembrados como “ladrões de galinha”, ou seja, aqueles de roubalheira com pequenina dimensão criminal, lacuna esta pouco interessada em ser preenchida por algum professor de Direito Constitucional, que não demonstra tamanha indignação para defendê-los e dizer que a Constituição foi desmoralizada e ultrajada como acontece agora, de forma estrondosa, com relação ao maior político brasileiro.
No caso do político preso, é preciso que o professor fique ciente de que não foi ignorada a presunção de inocência com relação a ele, que continua sendo respeitada até o processo transitar em julgado, em cuja fase é facultada ao político provar a sua inocência, mesmo estando preso, onde ele pode usufruir plenamente o direito de recorrer nas instâncias próprias, na forma prevista na Constituição e nas leis de regência.
Agora, a inteligência e a sabedoria do professor renomado no campo do Direito Constitucional não lhe concedem o direito de reclamar com tanta agressividade e com o maior despropósito contra o Supremo Tribunal Federal, tendo em conta que o político já teve oportunidade de oferecer, nas primeira e segunda instâncias, os elementos e argumentos em contestação sobre os fatos objeto da denúncia à Justiça, o que equivale à correspondência de que ele não teve êxito em provar a sua inocência justamente nos setores competentes da Justiça, onde e somente as contraprovas são aceitas e examinadas, acolhidas ou não, na forma da lei.  
É princípio fundamental que o ser humano tenha o direito de ser presumidamente inocente, segundo exegese do disposto no inciso XI da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Organização das Nações Unidas, em 1948.
A partir daí, esse princípio foi incorporado ao ordenamento jurídico das Nações, tendo acolhimento quase que universal, a exemplo da Carta Magna brasileira, que acomodou tal princípio no seu art. 5º, inciso LVII, onde consta proclamado que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, o que vale dizer que todos serão presumidamente inocentes até que ocorra o trânsito em julgado de uma sentença penal condenatória.
Essa medida jurídico-constitucional é de inteira justiça, mas isso não significa que o condenado penal não possa ser preso, exatamente porque não há previsão legal nem constitucional nesse sentido, embora muitos criminalistas tentem forçar a barra para impedir a prisão antes do trânsito em julgado da sentença, o que poderia nem acontecer, em razão da notória morosidade da Justiça em julgar os recursos intermináveis, quase todos com a finalidade de procrastinação processual, como mostram exemplos do cotidiano.   
A Lei Maior do país consagrou, em seu bojo, princípio essencial para assegurar o instituto da presunção de inocência, cujo respeito é de capital importância para a efetiva garantia dos direitos fundamentais do ser humano, por permitir que o processo penal, embora já tenha sido encerrado na esfera própria da Justiça, possa ser examinado nas esferas seguintes, sempre que o interessado tenha condições de manejá-lo, na forma legal, promovendo os recursos pertinentes às postulações necessárias à comprovação da sua inocência, fato que jamais poderia acontecer caso não houvesse a possibilidade da presunção de inocência, quando o trânsito em julgado se materializasse logo em concomitância com a sentença condenatória.
Agora, parece estranho que o professor perceba, com bastante precisão, que o instituto da presunção de inocência figura com vigor jurídico na Constituição, conforme prescreve o inciso LVII de seu artigo 5º, conquanto o trânsito em julgado se opera somente quando a decisão condenatória não comportar mais recurso ordinário, especial ou extraordinário, mas omitiu importante detalhe, que interessa ao deslinde da questão em comento, que é o fato de que, em lugar nenhum da Carta Magna há qualquer dispositivo proibindo a prisão de condenado, o que vale dizer que uma coisa é o reconhecimento da presunção de inocência e a outra é de que isso não implica que o condenado não possa ser preso.
É importante ser observado que a essência do princípio da presunção de inocência descarta a declaração pela Justiça de que alguém culpado pela prática de uma infração penal sem oferecer oportunidade para que ele possa buscar nos tribunais, na forma da lei, o seu atestado de inocência, de inculpabilidade, sem que o processo transite em julgado, ou seja, facultando ao condenado os meios e os recursos apropriados para os recursos pertinentes.
Impende frisar que em nenhum país, que assegura a presunção de inocência, o condenado é também beneficiado com o impedimento da prisão, porque isso valeria, praticamente, negar-se a obrigatoriedade do cumprimento da pena, que é forma impositiva do criminoso pagar por seus pecados, i.e., seus crimes, o quanto antes possível.
          Esse princípio constitucional tem o condão de expressar que ninguém poderá ser considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, o que vale dizer que, depois de ser julgado por meio do devido processo legal, são asseguradas ao condenado as garantias constitucionais e legais dos direitos humanos, como forma de afastamento do arbítrio e da injustiça tanto por parte do Estado quanto da Justiça, sem que isso impeça a prisão dele, justamente por falta de previsão legal nesse sentido.
Ao que tudo indica, esse professor deve viver em outro mundo, ao afirmar que “A inveja da minoria branca é imensa.”, fazendo alusão ao político preso, porque, em sã consciência, é absolutamente impossível que alguém possa ter o capricho de invejar pessoa com as qualidades ínsitas de quem foi condenado pela prática de crimes contra a administração pública e ainda responde na Justiça a seis processos criminais, com potencial para ser condenado outras vezes, além de grande possibilidade de ficar o resto da vida atrás das grades, em que pese ter sido presidente da República.
Nessa condição de já ter sido autoridade máxima do país, é conferido a ele a obrigação moral de ser exemplo para a sociedade, em especial a classe política, mas ao contrário disso, o seu histórico e a sua imagem políticos não passam da representatividade de homem público em pleno estágio de degeneração e decadência, que não vale a pena senão se ter muita dor de quem se encontra em situação tão periclitante e vexaminosa.
O certo é que ele não teve condições de provar a sua inocência com relação às acusações pertinentes ao caso do tríplex, mas insiste com agressões aos juízes que o julgaram, ao chamá-los de algozes, pelo simples fato de os acusar de julgamento sem prova, o que não é verdade, porque o processo pertinente está em plena validade e intacto, em termos da materialidade sobre a autoria dos crimes, sem qualquer contestação quanto à legitimidade em relação às investigações e as sentenças condenatórias.
É preciso que se enfatize que a pouca-vergonha do sistema que permite recursos infinitos e à vontade do criminoso somente existe nas republiquetas e nos países de pouquíssima ou nenhuma seriedade, conquanto o seu sentido primordial é beneficiar e favorecer os ricos e criminosos de colarinho branco, que têm condições de pagar competentes advogados para que o trânsito em julgado da sentença jamais ocorra e o processo se encerre por prescrição penal, como tem ocorrido com frequência na mais alta corte de Justiça do país.   
O professor precisa entender que a conscientização e a movimentação da sociedade, principalmente dos brasileiros íntegros e honrados, que amam o Brasil e defendem o patrimônio público, têm sido exatamente em harmonia com o entendimento segundo o qual o político preso precisa continuar trancafiado, cumprindo a pena que condiz com os crimes por ele praticados, por guardar plena consonância com os ditames constitucional e legal, na forma da posição  jurídica prevalente no Supremo Tribunal Federal, que é a melhor interpretação para o cumprimento de condenação penal, a partir do julgamento e dos recursos da alçada da segunda instância, eis que a Carta Magna não proíbe medida nesse sentido e muito menos restringe que o condenado não possa provar a sua inocência estando preso. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 3 de julho de 2018

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