segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Abuso do poder econômico

 

O Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba houve por bem cassar a chapa vitoriosa no último pleito eleitoral para prefeito do município de Taperoá, à vista do resultado de Ação de Investigação judicial Eleitoral, tendo por base acusação de compra de votos, que, na forma da legislação eleitoral, caracteriza abuso do poder econômico.

Com base nessa respeitável decisão, o mencionado tribunal vai determinar nova eleição indireta, a ser escrutinada pelos vereadores, no município, para a escolha do novo prefeito, que terá mandato até 31 de dezembro do corrente ano.

O prefeito e seu vice podem recorrer da decisão em causa ao Tribunal Superior Eleitoral, o que, em tese, pode impedir a realização da nova eleição e os integrantes da chapa que infringiu a legislação eleitoral poderá tranquilamente terminar o mandato de quatro anos, em clara demonstração de que, nesse caso, o crime compensa, ante o reconhecimento do abuso do poder econômico no processo eleitoral, mas, até aqui, tudo funcionou como se nada tivesse havido de anormal.

O que se passa nos meandros do presente episódio, por sua especificidade, certamente jamais deveria ocorrer nas piores republiquetas, quando se sabe que o pedido de impugnação da chapa agora cassada teria sido formulado tão logo foi concluído o processo eleitoral, quando a chapa supostamente prejudicada impetrou recurso ao Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, objetivando, pasmem, impedir a posse dos candidatos eleitos, diante da alegação do crime de abuso do poder econômico.

É evidente que o recurso de que se trata mostrava que os candidatos da chapa vitoriosa usaram expediente viciado e irregular, incompatível com os saudáveis padrões civilizatórios e republicanos, tornando inaceitável a investidura deles em cargos públicos eletivos e esse ato espúrio acaba de ser confirmado por meio da decisão em apreço, que reconhece, finalmente, a ilicitude denunciada na origem.

Ou seja, o recurso que tinha por finalidade se evitar que aproveitadores  e criminosos assumissem o governo do município, praticamente, não surtiu o efeito pretendido, poque eles ficaram no cargo 44 dos 48 meses do mandato, salvo ainda se o Tribunal Superior Eleitoral conceder liminar suspendendo os efeitos da decisão do TRE-PB, quando eles poderão completar tranquilamente o resto do mandado.

Nesse caso, o remédio buscado por meio do recurso, destinado à impugnação da posse em causa, se mostrou absolutamente inócuo, cujo efeito foi extremamente prejudicial ao aperfeiçoamento dos trabalhos de incumbência constitucional da Justiça Eleitoral, mostrando que a morosidade nas suas decisões sobre recursos referentes a fatos irregulares ocorridos nas eleições contribuiu para sanar a falha somente quase no final do mandato ilegítimo, ante a demonstração de visível desinteresse em julgar tempestivamente as denúncias sobre casos suspeitos de graves e insanáveis irregularidades.

O caso em comento deixa a precisa impressão de que ter tribunal específico para julgamento de casos que tais seria bem melhor que nem existisse órgão nesse sentido, porque valeria mais a pena ficar sem ele, ante a substancial economia dos recursos jogados pelos ralos da incompetência, os quais poderiam ser destinados para outras finalidades em atendimento de necessidades públicas e certamente a Justiça comum poderia supri-lo com muita mais vantagem, em termos de agilidade.

No presente caso, o TRE-PB reconhece, implicitamente, que os candidatos eleitos da chapa cassada, por irregularidade insanável, praticaram atos administrativos irregulares por quase quatro anos, o que poderia ter sido evitado se houvesse mecanismo que obrigasse a agilidade do julgamento, ficando suspensa a posse deles enquanto não houvesse a solução do ato impugnatório.

Ou seja, diante da denúncia sobre a suspeita do emprego criminoso da compra de votos, que caracteriza abuso do poder econômico condenado pela legislação eleitoral, não poderia haver a posse dos candidatos sob a suspeita da prática de irregularidade, que precisava sim ser apurada imediatamente e com urgência, com a celeridade suficiente para se permitir o julgamento definitivo do caso, não se permitindo a posse deles enquanto não houvesse o deslinde da questão.

Enfim, o presente caso só confirma que as sistemáticas de trabalho e julgamento dos tribunais brasileiros, em especial o que cuida dos processos eleitorais, precisam passam por completa reformulação e reestruturação, de modo que as suas decisões passem a corresponder exatamente às finalidades para as quais eles foram institucionalizados, em harmonia com o atendimento do interesse público,

É preciso se compreender que não faz o menor sentido que processo de denúncia de grave irregularidade eleitoral, a exemplo desse em referência, fique pendente de solução por quase quatro anos, já na proximidade da posse do novo governo municipal, porque isso não condiz precisamente com o espírito da legislação eleitoral, que deve versar precipuamente sobre a necessidade do prévio saneamento das falhas processuais antes da posse dos eleitos.

Brasília, em 31 de agosto de 2020  

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